23/02/2021 - 19:08
O pênalti marcado para o São Paulo, na partida contra o Botafogo na última segunda-feira (22), era para ajudar o Flamengo, pois garantiria o Tricolor paulista na fase de grupos da Copa Libertadores e, na próxima quinta-feira (25), o time não precisaria se esforçar, o que facilitaria a caminhada do Rubro-Negro carioca ao título brasileiro. Acreditem, mas isso foi dito após o jogo, por apaixonados torcedores, claro, de adversários do atual líder do Brasileirão.
Essa opinião não é exclusiva dessa reta final do campeonato. Na verdade, nem do Brasileirão, nem dos tempos atuais. Os mais antigos vão lembrar que o Fluminense era chamado de rei do tapetão, pois havia sempre a suspeita de que o Tricolor se beneficiava de julgamentos fora de campo para ter vantagens nos campeonatos. Na atual Série A, em novembro do ano passado, a reclamação era de que a CBF, dirigida pelo ex-conselheiro do São Paulo Rogério Caboclo, permitia que o time paulista tivesse intervalos maiores entre os jogos (e no fim de dezembro o Tricolor já liderava o Brasileirão com sete pontos de vantagem sobre o Atlético-MG).
O que quero dizer com isso? Que é com tristeza que vejo e ouço torcedores, de todos os times, dizerem que determinado resultado é arrumado. Ou que tudo caminha para que A ou B seja campeão, ou rebaixado. Em todos esses anos do Brasileirão, a única vez em que ficou comprovada a interferência externa em resultados foi em 2005, o caso conhecido como máfia do apito. Que outras provas há, ao longo dos demais anos, para que tanto se desconfie dos resultados?
O VAR (árbitro de vídeo), que deveria encerrar com muitas polêmicas, só exacerbou esse sentimento e ampliou a desconfiança. Por outro lado, se antes poderíamos considerar um acordo com o árbitro de campo, fico imaginando como isso seria hoje, em que o árbitro de campo não tem a palavra final nas marcações e que a equipe conta com oito pessoas envolvidas, no campo e na cabine do VAR. “Segredo de três não é segredo”, afirma o ditado popular. Imaginem de oito!
O fato é que as reclamações sempre vão existir, pois elas fazem parte do jogo. O que contesto é a veemência atual de que é “roubo”, como se fosse impossível uma derrota ocorrer em um lance improvável, numa falha de um árbitro ou até mesmo de um jogador do nosso time.
William Shakespeare disse, certa vez, que “a paixão aumenta em função dos obstáculos que se lhe opõem”. Parece-me uma frase bem adequada ao futebol. A paixão do torcedor, obviamente, não o deixa pensar de maneira racional, mas isso o faz, ao mesmo tempo, deteriorar o produto pelo qual nutre tanto sentimento. Se ele acha que está tudo armado contra o próprio time, para que, e por que, continua torcendo? Talvez a resposta venha de Dostoiévski ao escrever que “às vezes o homem prefere o sofrimento à paixão”.
* Sergio du Bocage é apresentador do programa No Mundo da Bola, da TV Brasil