30/12/2020 - 13:07
Enquanto as infecções pela covid-19 aumentam, especialistas reforçam recomendações de distanciamento social. Na contramão, cidades turísticas pelo País recebem festas, muitas delas clandestinas, com centenas e até milhares de frequentadores no feriado do réveillon. A realização de eventos do tipo tem se tornado uma guerra na Justiça, com disputas entre organizadores de festas, promotores do Ministério Público e governos. Na maior parte dos casos, atrações públicas de ano-novo foram canceladas.
Basta uma busca simples em sites de venda de ingresso para encontrar dezenas de exemplos em locais como o Rio e a região de Porto Seguro, no sul da Bahia.
Em cidades turísticas, parte das celebrações já começou em meio a uma programação iniciada no domingo e que segue até o próximo fim de semana. Famosos também estão entre os anfitriões de grandes festas fechadas. Um evento em que é esperado o jogador Neymar já virou alvo de investigação.
Grande parte dessas festas é para um público de maior poder aquisitivo, com apresentação de artistas e DJs conhecidos e bebida e comida liberadas. Os organizadores divulgam seguir “protocolos” sanitários ou que estão “monitorando” a pandemia, embora publicações de frequentadores nas redes sociais mostrem aglomerações e pessoas sem máscaras.
Alguns dizem exigir resultados recentes de testes de covid-19 – medida criticada por especialistas por permitir uma janela de alguns dias de uma eventual contaminação e pela possibilidade haver falso negativo, dentre outros motivos.
No primeiro dos cinco dias de festas de réveillon nas praias de Pipa e de São Miguel do Gostoso, destinos badalados do Rio Grande do Norte, protocolos sanitários e avisos não foram suficientes para evitar aglomerações e incentivar o uso de máscara. Na contramão de outros locais do Nordeste, decretos das cidades de Tibau do Sul (onde fica Pipa) e São Miguel do Gostoso proíbem eventos públicos ou patrocinados com dinheiro público no fim do ano, mas liberam os particulares se houver apresentação de exame negativo para covid por parte do público, distribuição de máscaras e aferição de temperatura na entrada.
O Ministério Público pediu a suspensão de festas, mas a Justiça alegou que não poderia intervir em determinações do Executivo, que liberou esse tipo de evento. Em dois meses, o número de internados nas UTIs privadas e públicas potiguares triplicaram, com 256 pacientes na terça-feira, 29. Tibau e São Miguel não têm leitos de terapia intensiva.
O jornal O Estado de S. Paulo não conseguiu contato com as duas prefeituras. O governo potiguar informou ter orientado as cidades a cancelarem todos os eventos do tipo. “Um cancelamento em cima da hora faria essas pessoas circularem livremente pelas ruas das praias, aumentando as aglomerações públicas”, justificou a assessoria do evento Let’s Pipa, que já ocorre na festa de Tibau do Sul.
Na Bahia, o Tribunal de Justiça proibiu no dia 26, a pedido do governo estadual, “shows e festas, públicas ou privadas” em Porto Seguro. Mas um juiz da comarca local, Rogério Barbosa, liberou na segunda-feira festas para até 200 pessoas em quatro estabelecimentos. Para ele, os casos específicos envolviam ambientes controlados.
Em nova reviravolta, a liminar de liberação das festas caiu na terça à noite, após nova decisão do TJ baiano. No Twitter, o governador Rui Costa (PT) havia criticado “o risco à vida das pessoas” por quatro festas.
Na noite de segunda-feira, policiais identificaram nove eventos clandestinos em condomínios e pousadas de luxo nos distritos de Trancoso e Caraíva. Em uma das casas, no Condomínio Alto de Trancoso, onde a diária no período próximo ao réveillon é de R$ 35 mil, policiais acharam ao menos 300 pessoas. O organizador, de Brasília, se recusou a acabar a festa e foi lavrado um auto criminal.
“Parece que a pessoa arrisca porque faz a conta monetária e vê que vale a pena. O público, se via, era A, A, A, classe alta”, falou o tenente-coronel Anacleto França, comandante do 8.º Batalhão da PM de Porto Seguro.
Em um dos vilarejos, com mil moradores, é prevista a chegada de 7 mil turistas. Fábio Costa, Secretário de Serviços Públicos de Porto Seguro, disse que a cidade “sempre se posicionou contra esses eventos” e está atenta a qualquer princípio de aglomeração.
No Sul
Já em Santa Catarina, a disputa foi entre o MP e o próprio governo, que havia decidido autorizar a ocupação máxima de hotéis, a abertura de casas noturnas e a realização de eventos sociais. A promotoria chegou a obter liminar favorável para suspender essa medida, mas a Justiça deu vitória ao governo na terça à noite.
O Executivo estadual e representantes do setor têm apontado sobre o risco de eventos informais, menos sujeitos a controle e fiscalização.
O mapa de risco para a covid aponta que todas as 16 regiões de Santa Catarina estão no nível de alerta gravíssimo. Segundo o MP, o decreto que afrouxou o isolamento não seguiu critérios técnicos e científicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.