Na noite do dia 3 de setembro, enquanto a chef de cozinha Patrícia Maranhão, do restaurante Gardênia, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, se esfalfava na preparação de pratos à base de carne de cordeiro, 20 empresários aguardavam no salão ansiosos pela iguaria que iriam degustar. O grupo reuniu-se no restaurante a convite de outro empresário, Antonio de Azevedo Castilho Neto, presidente da Elavon, subsidiária do americano US Bankcorp que opera máquinas de cartões de crédito, no Brasil, em parceria com o Citigroup. Castilho Neto, além de empresário, é presidente da Associação de Criadores de Ovinos da Raça Dorper (ABCDorper), uma entidade que congrega 320 criadores de ovinos. Foi nessa condição que ele convidou o grupo de empresários para mais uma das atividades da Confraria do Cordeiro, criada há cinco anos para difundir as qualidades da carne desses animais, por meio de jantares em restaurantes badalados de grandes cidades. “De todos os que compareceram ao Gardênia, apenas quatro são criadores de dorper”, diz Castilho Neto. “Nossa intenção é exatamente mostrar para um público formador de opinião que a carne de cordeiro é de alta qualidade, o que nos ajudará a aumentar o nosso negócio no campo.”

Entre os convidados para o jantar da confraria estavam Onofre Laselva, diretor da rede de livrarias La Selva, Luis Felipe Salek Dick, diretor de negócios da Pamcary, corretora de seguros de transporte de carga, e Celso Sato, presidente da Accesstage, empresa de tecnologia do setor de intercâmbio eletrônico de dados. Descendente de japoneses, Sato diz que não tinha o hábito de comer cordeiro. “Comecei a experimentar a carne aos poucos, quando ia a churrascarias”, diz Sato. “Hoje, aprecio demais um cordeiro.” Como prato principal para a noite, Patrícia preparou paleta assada com molho roti e polenta. “O cordeiro tem uma carne de textura maravilhosa e ao mesmo tempo versátil”, diz Patrícia. “Mas não havia, ainda, trabalhado com a carne de animais da raça dorper.” No menu do dia a dia do Gardênia, que se especializou nesse tipo de carne, há nove pratos à base de cordeiro, entre elas a paleta mar nada no vinho branco e ervas, o carré com pesto de hortelã, a carne de sol, o lombo e a kafta. “Uso carne de cordeiro ainda sem identificação de raça”, diz Patrícia, uma pesquisadora de pratos regionais brasileiros, com pós-graduação em cozinha internacional e cursos na Le Cordon Bleu, em Chicago, uma das mais famosas escolas de culinária do mundo. “Muitos restaurantes não utilizam carne de raças específicas ou de carne com grife”, diz Castilho Neto.

Por isso, a confraria serve, também, para divulgar a raça dorper a empresários, muitos deles com propriedades rurais, que poderiam se tornar criadores. “É um público que tem tudo para entrar no negócio de modo profissional”, diz Castilho Neto. Para mostrar como a raça é criada no País, foi apresentado, durante o jantar, o primeiro livro de fotografias da ABCDorper, com o título de Dorper: a raça na ovinocultura brasileira. Durante quatro meses, os fotógrafos Fábio Castilho, Eduardo Rocha e Graziela Gilioli visitaram fazendas de criadores, em todo o País. Em 209 páginas, o livro mostra imagens de machos e fêmeas dorper, criados nas fazendas dos associados. Logo depois do lançamento, o livro foi enviado à África do Sul, berço da raça no mundo, a pedido da associação daquele país. “Essa é a primeira obra no mundo com esse foco, de apenas mostrar os ovinos e deixar que cada criador tire as suas conclusões.” No Brasil, o rebanho de dorper é de pouco mais de 300 mil animais puros e estima-se em cinco milhões os animais cruzados com outras raças, destinados ao abate.

A ABCDorper tem 14 núcleos de criadores espalhados pelo País. Desde que começaram as reuniões da confraria a associação nacional realiza pelo menos duas reuniões por ano. “Os núcleos regionais também se reúnem, mas gostaríamos que a confraria fosse ainda mais ativa”, diz Castilho Neto. “Precisamos mostrar a raça como uma oportunidade de negócio.” Para o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci Júnior, o setor teria como absorver a produção nacional. “Hoje, o cordeiro não é uma carne que se come apenas no Rio Grande do Sul e no Nordeste”, diz Solmucci Júnior. Mas a maior parte do que vendem as churrascarias das grandes cidades ainda é de cordeiro importado do Uruguai. O Brasil já chegou a importar oito mil toneladas por ano. Em 2012, segundo Castilho Neto, o País já importou entre dois mil e três mil toneladas do país vizinho. “Não foi a demanda brasileira que caiu. O Uruguai só está vendendo menos carne para nós porque está preferindo mercados mais atraentes, como o americano”, diz. “Essa é a hora de organizarmos a cadeia produtiva e crescer também”.

A Associação Brasileira dos Criadores de Ovinos (Arco), de Bagé (RS), entidade que faz o registro de animais de todas as raças ovinas criadas no País, estima que mais de 80% do abate de cordeiros seja informal. Isso representa 72 mil toneladas de carne consumida no Brasil sem inspeção sanitária adequada. “Atualmente, o País consome 86 mil toneladas de carne de cordeiro, mas tem potencial para consumir três vezes mais”, diz Paulo Schaub, presidente da Arco. No Brasil, o rebanho nacional de ovinos de cerca de 12 raças criadas no País é de 17,3 milhões de animais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “O País precisaria de 50 milhões de animais para dar conta da demanda, que tem crescido na média de 3% ao ano”, afirma Schaub.