24/04/2025 - 15:20
O cultivo da laranja no Brasil passa por uma crise preocupante. Os estoques de suco da fruta fecharam 2024 com o menor volume já registrado no país, segundo dados da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR). Ao todo, foram cerca de 351 mil toneladas, 24% a menos que o volume registrado um ano antes.
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O setor enfrenta doenças que reduzem a produtividade dos laranjais, instabilidades climáticas que forçam os produtores a se reinventar e dificuldades para implementar tecnologias na colheita. Esses fatores têm levado diretamente a uma queda na oferta de laranja e do suco de laranja no Brasil, o que acabou diminuindo também a demanda pelo produto.
“Um dos problemas do suco de laranja é que ele é um produto que é amplamente substituível. Ninguém ‘vai morrer’ por deixar de tomar suco de laranja. Então, você pode trocar por suco de maçã, suco de manga, qualquer outra coisa. Não é como uma proteína, que você não consegue substituir”, explica Ibiapaba Neto, diretor-executivo do CitrusBR
O Brasil ainda segue como maior produtor mundial do suco de laranja e segundo Ibiapaba Netto, 80% das laranjas produzidas no Brasil vão para a indústria para dar origem a suco. O que pressiona os preços internos da laranja de mesa.

A safra de 2024/25 foi confirmada como a segunda menor dos últimos 37 anos segundo o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus). Um relatório divulgado pela entidade mostrou que a principal região produtora de laranja (cinturão citrícola) fechou o período com 230,87 milhões de caixas de 40,8 quilos, o que é 24,85% a menos do que a colheita de 2023/2024.
Dados da CitrusBR, mostram que o país concluiu 2024 tendo exportado 228.692 toneladas de suco de laranja, uma redução de 22,21% em relação às 294.033 toneladas embarcadas no primeiro semestre da safra 2023/24. Em receitas, o valor chegou a US$ 1.037.173.807, um aumento de 41,01% em comparação com os US$ 735.387.975 do período anterior.

Produtores em busca de soluções
A família Simonetti tem quatro gerações de citricultores com fazendas em São Paulo e Minas Gerais, destinadas à produção de citrus, sobretudo laranja. Antônio Carlos Simonetti, em conversa com a IstoÉ Dinheiro Rural contou que os fatores climáticos têm sido decisivos para a “crise da laranja”, o que forçou o citricultor a buscar novas áreas produtivas.
“Estamos em Aguaí (São Paulo) desde 1941. Naquela época, o clima era muito diferente, era ideal para a produção de laranja, o que não é mais. Com isso, 11 anos atrás mudamos para o sul de Minas Gerais, em busca do que existia antigamente em Aguaí”, conta Simonetti.
Antônio relata ainda que continua produzindo laranja em Aguaí, porém com 100% de irrigação, uma das maneiras para escapar das imposições do clima instável. Outra estratégia empregada por ele é a utilização de podadeiras que uniformizam os pomares, facilitando a pulverização. Entretanto, modernizar a colheita ainda é um desafio.

“Às vezes em uma rua que tem 300 plantas, tem 20, 30 plantas que estão fora de padrão, você padroniza as plantas para facilitar a pulverização. Mas quando chega na parte da colheita ainda é tudo manual, parte da indústria vem tentando estudar maneiras de melhorar esse processo, mas ainda nada foi colocado em prática”, conclui Simonetti.
Luiz Rafaelli, CEO da Be Fruit Comércio e Exportação, que também é produtor de laranja, concorda que a mão de obra ainda é um grande problema na cadeia de produção.
“A meu ver, é o maior dos problemas, o que virou uma questão importante a se resolver. Ainda somos muito pouco mecanizados, toda a parte de aplicação, de defensivos, tudo é mecanizado, mas a colheita ainda não é. Para mim, são três grandes problemas: mão de obra, clima e greening”, contou Rafaelli.
O último problema citado pelo citricultor, o greening, é uma doença que ataca todas as lavouras de cítricos, não apenas no Brasil, mas em vários outros países.
Rafaelli, que tem produção de citrus com foco em laranja em Santa Adélia (SP), conta que deu “sorte” até o momento por não ter sido tão impactado pelo greening, pois sua plantação é cercada por áreas de cana, uma das alternativas que os produtores estão adotando, inclusive, é não produzirem laranja ao lado de outras fazendas da fruta, evitando a doença.
A irrigação também está entre as estratégias de Rafaelli, que também cita o clima e o ciclo instável das chuvas em São Paulo, como um dos motivos para uma das piores safras da história do país.
“No ano passado, em janeiro, tivemos 45 dias de seca, o que não é nada normal. Sim, eu tenho irrigação, mas meus poços pararam de produzir água ou produziram menos água do que o esperado. Tivemos que fazer um trabalho de salvamento para não perder muda, nem arvore e não um planejamento estratégico”, explica.
Novo cinturão citrícola
O tradicional cinturão citrícola, conhecido assim por ser a região com maior número de pomares de citros no Brasil, abrange São Paulo (exceto o litoral), Triângulo Mineiro e sudoeste de Minas Gerais.
Porém, com todas as instabilidades, esse cinturão tem se expandido para Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná e Distrito Federal, para tentar fugir do greening.
“Grandes empresas estão plantando laranja em Mato Grosso do Sul e no Norte de Minas, que são regiões um pouco mais quentes que São Paulo. Nós temos que ver qual vai ser a adaptação dessa fruta em produtividade lá e como é que vai ser a chegada do greening lá. Eu acho que não é uma questão se ele vai chegar, a questão é quando ele vai chegar“, diz o CEO da Be Fruit.