23/04/2014 - 10:59
Para quem lida com o agronegócio, o provérbio popular segundo o qual o quintal do vizinho sempre tem a grama mais verde não cola. Hoje, é fácil para um agricultor ou pecuarista conferir de perto o que o vizinho faz, que técnica utiliza, que conceitos aplica em seu empreendimento rural e, se for possível, aprender com ele. No caso, o “vizinho” de porteiras abertas pode ser um americano, um uruguaio, ou estar ainda mais longe, na austrália ou na China. Com as viagens técnicas se popularizando, as distâncias entre as fazendas do país e do mundo vêm ficando cada vez menores. nos últimos anos, os preços médios entre R$ 10 mil e R$ 15 mil por pessoa e as operadoras de turismo, cada vez mais especializadas nas necessidades do cliente, têm fomentado um nicho promissor de negócios.
O empresário Frank Partington, 73 anos, acompanhou de perto esse movimento. Com mais de 50 anos de experi ência no mercado de turismo, Partington trabalhava principalmente com cruzeiros marítimos. Em 1996, um agricultor o procurou e encomendou uma viagem aos Estados Unidos para conhecer a Farm Progress Show – até hoje é um dos maiores eventos de tecnologia agrícola do mundo –, que acontece em Iowa, Estado que faz parte do cha mado Corn Belt ou “cinturão de grãos” americano. “Eu achava que estava no fim da carreira e pensava em me aposentar”, diz Partington. “Mas a viagem mudou tudo, eu me identifiquei com esse tipo de produto e não parei mais.”
Partington fundou a Agritours Brasil, empresa paulista de viagens técnicas para o agronegócio, que em 2000 mudou de nome para Agromundi. A operadora, que reali za cerca de 25 viagens por ano com grupos de até 40 pessoas, faturou R$ 6,5 milhões em 2013. “Viagens técnicas era algo bem raro quando começamos, mas nos últimos dez anos a demanda cresceu bastante”, diz. Segundo Partington, foram multinacionais como John Deere, New Holland, AGCO, Monsanto e DuPont que ajudaram a impulsionar o turismo do agronegócio. Essas empresas começaram a levar clientes para conhecer suas fábricas no Exterior, como uma espécie de prêmio, e não pararam mais. “Até hoje, elas ainda respondem por uma grande fatia desse mercado”, diz Partington.
Na Agromundi, além do roteiro americano, outros pacotes de viagens fazem sucesso entre os fazendeiros. Entre eles estão os que incluem a Agritechnica, em Hannover, na Alemanha, e a feira Eima, em Bolonha, na Itália. Os eventos, em geral, ocupam no máximo dois dias do roteiro. A via gem sempre inclui dias de campo e palestras em instituições de ensino. “É uma programação bem técnica, que explora toda uma cadeia produtiva”, diz Partington. “E sempre renovamos os roteiros definindo novos destinos, porque há grupos que viajam por anos seguidos e querem novidades.”
Quem desenvolve atividade semelhante é o administrador de empresas Flavio Salvadego, 36 anos, que comanda a Caep Brasil, em São Paulo. A americana Caep, de Fergus Falls, no Estado de Minnesota, é uma tradicional operadora do segmento. Com apenas 18 anos, Salvadego foi intercambista pela empresa e passou um ano trabalhando como estagiário numa fazenda nos Estados Unidos. A experiência de Salvadego lá fora foi tão proveitosa que ele decidiu criar a filial brasileira da Caep. No País desde 1999, a operadora leva mais de 250 estudantes para intercâmbio no Exterior, a cada ano. Mas a atividade mais importante da filial brasileira são as viagens técnicas, que tiveram início em 2007 e responde ram por mais de 80% do faturamento de R$ 8,8 milhões no ano passado. Salvadego afirma que essas viagens atraem profissionais do agronegócio e produtores com idade entre 30 e 50 anos, que desejam atualizar-se e buscar tecnologia no Exterior. “As viagens são uma imersão total, para um aprendizado intenso e rápido”, afirma. “Os produtores costumam se surpreender bastante, principalmente com a gestão mais eficiente das fazendas lá fora.”
Nessas viagens, os grupos são acompanhados por um guia técnico, especialista no tema de interesse dos contratantes. Esse guia é responsável pela tradução do idioma do país de destino e por sanar quaisquer dúvidas dos participantes. “O guia não é apenas um tradutor”, diz Salvadego. “É um pesquisador da área, o que garante qua lidade à comunicação.” Além dele, outro guia é responsável por questões operacionais, como checkin, transporte e para fazer com que os horários das atividades sejam cumpridos. “O produtor não precisa se preocupar com nada, não precisa nem falar inglês”, diz Partington. “É só arrumar as malas e viajar.” Salvadego também conta que a experiência possibilita conhecer colegas de diferentes regiões do Brasil e fazer amizades. “Os participantes trocam muitas informações e continuam esse contato após a viagem”, diz ele.
Novata nesse filão, a BeefPoint, uma consultoria de Piracicaba (SP), especializada em pecuária, começou a operar em 2012 e já realizou quatro viagens. Duas foram para os Estados Unidos, no Texas e Colorado, outra para a Austrália e a quarta para o Uruguai, todas em parceria com a Caep Brasil. Segundo o CEO da empresa, Miguel Cavalcanti, a novidade fez tanto sucesso que novos roteiros vêm sendo elaborados. “A viagem é uma experiência riquíssima que marca a vida das pessoas.” Neste ano, ele pretende organizar uma viagem para a China e outra para a África do Sul. Já a viagem ao Texas, marcada para abril, teve sua versão melhorada. “São 25 atividades edu cacionais e refeições nos melhores restaurantes americanos, para a degustação de carnes”, diz Cavalcanti.
Há, ainda, as agências que se especializaram em atender entidades de produtores, entre elas a CNA, sindicatos rurais e cooperativas. É o caso da empresa TNT, de Londrina (PR). “Os clientes nos procuram e elaboramos roteiros sob demanda”, diz Roberta Borghesi, gerente comercial e de marketing da TNT. A agência promove para essas entidades até mesmo missões técnicas de pesquisas e rodadas de negócios. “A viagem é sempre uma ferramenta”, diz Roberta. “E ela deve estar alinhada com os objetivos do cliente.”