N o fim de julho, a Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos (Cetip), companhia integradora de papeis no mercado financeiro, anunciou a conclusão de mais duas operações que movimentaram R$ 1,3 bilhão, através da emissão de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs). Notícias dessa envergadura têm agitado o mercado de capitais. Embora ainda pouco difundido no Brasil, a opção pelo título de renda fixa começou a entrar no radar dos investidores mais antenados, além de ter se tornado a saída para as empresas do agronegócio para driblar os juros altos e a escassez de linhas de crédito. As negociações, feitas pela Raízen, joint venture entre a Shell e o grupo Cosan, e pela Suzano Papel e Celulose, avaliadas em R$ 675 milhões cada uma, são apenas a ponta do iceberg de um mercado que movimentou R$ 3,8 bilhões em 2015, um crescimento de 171% diante do estoque registrado no mesmo período de 2014. “Os títulos de renda fixa estão em franca expansão”, diz Ricardo Magalhães, especialista em relações e projetos estratégicos da Cetip.

O aumento nas negociações que envolvem os CRAs é atribuído a vários fatores. Além de ser uma operação com prazo relativamente mais curto, que varia entre dois ou três anos, o papel possui isenção de Imposto de Renda para pessoas físicas, o que garante maior rentabilidade aos investidores. Segundo Magalhães, nas operações da Raízen e da Suzano, os compradores tiveram ganhos de 100% da taxa interbancária (CDI), com isenção fiscal. “A procura maior por pessoas físicas comprova que essa isenção no IR é um grande diferencial”, afirma ele. Para o executivo da Cetip, a demanda pelos recebíveis do agronegócio deverá aumentar ainda mais, após as mudanças nas regras das Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e da Letra do Crédito do Agronegócio (LCA). As emissões, que também contavam com benefício fiscal, tiveram queda, após a decisão do governo federal de ampliar os prazos mínimos de emissão e resgate. “Essa soma de fatores e o bom momento do agronegócio favorecem os CRAs.”, afirma Magalhães.


“Apesar da crise econômica, temos uma visão positiva do mercado, pois há muito apetite pelo CRA” Moacir Teixeira, sócio-fundador
da Ecoagro

Se para o investidor são inúmeras as vantagens de investimento nos recebíveis, para as empresas, os benefícios trazidos pela emissão desses papéis também são interessantes. Segundo Sérgio Penteado, diretor-executivo da securitizadora paulista Brasil Agrosec, com a escassez de recursos no exterior, as companhias nacionais tiveram de recorrer ao mercado doméstico. “Por uma questão estratégica, as empresas que estavam acostumadas a captar fora do Brasil, passaram a optar pelo mercado interno através dos CRAs”, diz. “Abriu a oportunidade de securitizar uma dívida à taxa de juros baixa.”

De acordo com Moacir Teixeira, sócio-fundador da securitizadora paulista Ecoagro, responsável pela emissão dos CRAs para o grupo Suzano, a demanda das grandes empresas pelos papeis tende a crescer ainda mais. Na primeira metade de 2015, a Ecoagro emitiu mais de R$ 800 milhões em recebíveis. “Estamos prevendo outras emissões, no segundo semestre deste ano, com novos e importantes clientes”, diz Teixeira. “Apesar da crise econômica, temos uma visão positiva do mercado, pois há muito apetite pelo CRA como instrumento de financiamento agrícola”.


“O segmento sucroenergético dominou as operações de CRAs, nos últimos dois anos” João Pacífico, presidente do Grupo Gaia

No agronegócio, o setor sucroenergético foi pioneiro na emissão de recebíveis. A primeira grande movimentação foi feita, em 2013, pela Nardini Agroindustrial, de São Paulo, que captou R$ 120 milhões. João Pacífico, presidente do Grupo Gaia, diz que esse segmento dominou as operações da empresa nos últimos dois anos, embora no momento haja uma reversão desse quadro. Neste ano, a securitizadora está ampliando seu leque de atuação e tem realizado mais operações no setor de grãos e defensivos. “Temos olhado outros mercados, pela própria situação complicada do setor sucroenergético”, diz Pacífico.

Para investir nos CRAs, os especialistas aconselham aos interessados procurar uma securitizadora que siga os critérios da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Qualquer investidor com recursos acima de R$ 300 mil pode comprar os papeis. Segundo Gustavo Luchese Unfer, analista da superintendência da CVM, embora os CRAs sejam um dos títulos mais rentáveis do mercado, essa operação requer conhecimento por parte do investidor. “Sempre é bom destacar que quem investe nos CRAs está comprando a securitização de uma dívida”, afirma Unfer. “O ideal é avaliar o histórico da securitizadora e ler atentamente as cláusulas do contrato principalmente aos termos de risco.”