Após ter recebido em novembro uma negativa da Justiça britânica para que a tragédia de Mariana de 2015 fosse julgada no Reino Unido – país-sede da BHP, que é sócia da barragem -, a defesa das vítimas tentou obter permissão para recorrer ao próprio Tribunal de Recurso. Teve, porém, o pedido também recusado há pouco. O processo é uma praxe da legislação local, que exige que a solicitação seja feita ao mesmo juiz responsável pela primeira avaliação do caso para que os requerentes possam recorrer ao Tribunal de Apelação. A nova empreitada dos representantes das vítimas será feita este mês.

Para os advogados das vítimas, seria incomum que o juiz minasse sua própria decisão e a expectativa de que o caminho a ser trilhado passaria pelo Tribunal de Apelação era amplamente esperado. Eles acreditam que, com o recurso, poderão estabelecer jurisdição na Inglaterra contra o BHP Group Plc, uma empresa domiciliada no país, e o BHP Group Limited, que tem sede na Austrália. A intenção é a de que os réus enfrentem as consequências por sua parte na responsabilidade no desastre ocorrido em 5 de novembro de 2015.

Depois de uma audiência inicial em julho do ano passado da Suprema Corte em Manchester, o juiz Justice Turner recusou que a Inglaterra se tornasse jurisdição para o caso em novembro. Agora, os advogados das vítimas afirmam a intenção de levar caso adiante avaliado em 5 bilhões de libras contra a mineradora BHP ao Tribunal de Apelação.

O juiz anunciou que não aceitaria o pedido dos reclamantes para apelar da sua decisão anterior, conforme decisão tomada na terça-feira da semana passada e divulgada há pouco. Com isso, os requerentes apresentarão uma Notificação do Apelante no prazo de 21 dias após a decisão de Turner ainda este mês, juntamente com os fundamentos do recurso.

A tragédia ocorrida há pouco mais de cinco anos se deu por causa do rompimento da barragem de resíduos de mineração, liberando uma torrente de lodo tóxico, que matou 19 pessoas, destruiu comunidades e contaminou cursos de água durante centenas de milhas.

“Sabíamos que este é um caso complexo e de suma importância, e que o caminho pode ser longo antes de uma decisão nas cortes inglesas, mas temos confiança em nossos argumentos e em nossa representação, enquanto lutamos para estabelecer que as empresas não podem vir às nossas comunidades, nos arruinar e, então, ser protegidas de consequências significativas”, disse o ex-prefeito de Mariana, Duarte Junior. “Queremos responsabilizar a BHP por não respeitar nossos direitos e interesses. Esta ação legal na Inglaterra deve forçá-los a reconhecer nossos direitos.”

Para o sócio-gerente da empresa à frente do caso no Reino Unido, a PGMBM, Tom Goodhead, as reparações às vítimas do desastre da Barragem de Mariana ainda não foram feitas de forma adequada. “As vítimas vivem essa realidade todos os dias. As Nações Unidas observaram isso em sua investigação”, disse. A PGMBM é uma parceria entre advogados britânicos, brasileiros e americanos que foca a defesa de vítimas de delitos cometidos por grandes corporações.

Goodhead admitiu que este é um “caso desafiador” para os tribunais, mas se disse otimista em relação a conseguir estabelecer jurisdição na Inglaterra. “Somos encorajados por precedentes legais, incluindo a decisão da Suprema Corte no ano passado de que a Vedanta Resources Limited teve de responder na Inglaterra a respeito de suas responsabilidades para com milhares de aldeões da Zâmbia afetados pela poluição da operação de uma de suas empresas no país africano.”

Para os advogados das vítimas, os principais litígios relacionados a desastres ambientais no Brasil são “extremamente ineficientes” e as vítimas não têm perspectiva de receber indenização adequada nos tribunais domésticos pelas perdas que sofreram dentro de qualquer “prazo razoável”.