Depois do café e do cacau, agora é a vez da avelã. O preço deste ingrediente importante na fabricação de produtos como o famoso creme de chocolate Nutella subiu mais de 35% desde abril. O motivo é uma geada rara – oriunda das mudanças climáticas – que devastou as plantações de avelã na Turquia, o maior fornecedor mundial desta noz.

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Registros já mostram que o preço de um quilo de avelã turca ultrapassou os 4,91 dólares americanos, o equivalente a quase 27 reais por quilo. A previsão é que chegue a US$ 10 por quilo (54 reais).

Essa escassez de avelã deve afetar principalmente a fabricação de doces.

O ingrediente

Embora não se fale muito das avelãs, elas são um ingrediente fundamental em muitos produtos considerados gourmet e consumidos em grande escala no mundo todo.

Para marcas como Ferrero, que fabrica a Nutella, o prejuízo pode ser enorme porque elas utilizam cerca de um quarto do abastecimento global de avelãs. Este fruto representa cerca de 13% da receita do creme de chocolate com avelã Nutella. Milhões de potes são vendidos todos os anos, o que significa que mesmo um pequeno aumento de preço eleva os custos de produção e reduz a margem.

Se a escassez de avelã se mantiver constante, a Ferrero e outros fabricantes de doces podem ser forçados a reformular suas receitas. Os fabricantes podem ter que reduzir o tamanho dos produtos ou repassar os custos ao consumidor final, e isso faltando apenas pouco mais de quatro meses para o Natal.

Escassez

A Ferrero é uma empresa com raízes na região do Piemonte, na Itália, onde são cultivadas as avelãs de alta qualidade da variedade “Tonda Gentile”. Esta noz recebe este nome porque é “redonda e gentil”, descrevendo em italiano o formato arredondado do fruto. Além da Itália, a Ferrero importa avelãs da Turquia, do Chile e dos Estados Unidos.

A gigante italiana do setor alimentício também fabrica os chocolates Ferrero Rocher, Kinder Bueno e o fino Mon Cheri. Todos são feitos com avelã.

Em um comunicado à DW, a empresa minimizou as preocupações com a escassez do fruto em questão: “o grupo Ferrero tem diferentes fornecedores em todo o mundo e graças à sua estratégia de longo prazo, o grupo não está contando com qualquer interrupção no fornecimento de seus produtos”.

A safra

Estimativas do Instituto Turco de Estatística (TurkStat) apontaram em junho para uma safra de 520 mil toneladas métricas para este ano, contra as cerca de 750 mil toneladas inicialmente previstas. Depois, esse número foi revisto.

O Conselho Internacional de Nozes e Frutas Secas (INC) informou à DW que a geada na Turquia reduziu a previsão da safra de avelã para 2025 em quase 22%. Estamos falando de cerca de 601 mil toneladas com casca, citando uma projeção mais otimista da Associação de Exportadores do Mar Negro (KiB).

A estimativa mais recente sugere que a Turquia perdeu cerca de 167 mil toneladas devido à geada, segundo dados do INC – o que chega mais perto da previsão inicial de 250 mil toneladas (número revisto).

De acordo com o INC, a Turquia chegou a reter parte de sua safra de 2022 (cerca de 150 mil toneladas métricas), o que deve ajudar a reduzir a falta da avelã neste ano. Mas esta quantidade agora também já se esgotou.

As avelãs são colhidas todos os anos, normalmente no final do verão no hemisfério norte. E sempre que há mais colheita do que se espera, a Turquia armazena o excesso da safra para uma venda futura, pois os agricultores antecipam preços mais altos.

Mudança de plano

Na intenção de reduzir a dependência da Turquia, pequenas e grandes empresas agora estão de olho nas avelãs de países como Chile, Geórgia e EUA. Mas elas também esperam que os preços se estabilizem caso a safra turca de 2025 for melhor do que se espera.

“A colheita de avelãs na Turquia acabou de iniciar e deve ser concluída em meados de setembro”, informou a associação alemã de fabricantes de doces BDSI à DW, em um comunicado.

A BDSI afirmou que só poderá avaliar o impacto após o término da colheita.

Estratégias

Outras regiões produtoras de avelã também enfrentam desafios. O Chile e a Geórgia produzem muito menos que a Turquia; e as avelãs dos EUA, principalmente de Oregon, têm sabor diferente e custam menos. Aumentar a produção em outros lugares do globo leva bastante tempo, pois as árvores de avelã precisam de 5 a 7 anos para amadurecer, o que na verdade limita um alívio a curto prazo.

Alguns acreditam que o fato de a Turquia ter anunciado um preço base para as avelãs, no ano passado, com um certo atraso, acabou deixando uma brecha para especuladores e exportadores.

A associação KiB normalmente define um preço mínimo no início da colheita para estabilizar o mercado e orientar as expectativas dos agricultores. Mas a falta de um preço base – em 2024 – aumentou o medo da escassez, elevou os preços e provocou compras em pânico. Percebendo uma oportunidade para lucrar, os agricultores seguraram seus estoques, o que acabou restringindo ainda mais a oferta de avelã.

A escassez é o “novo normal”?

A escassez também expõe uma vulnerabilidade mais profunda: a fragilidade dos setores que dependem da agricultura em relação aos efeitos das mudanças climáticas.

As avelãs são particularmente sensíveis às geadas da primavera do hemisfério norte, e a onda de frio deste ano na Turquia é um aviso de que a crise climática não significa apenas calor, mas também imprevisibilidade.

O café e o cacau recentemente enfrentaram problemas relacionados ao clima. Agora, com a escassez de avelãs, principalmente empresas menores serão obrigadas a repensar os ingredientes de seus doces e de onde virão seus abastecimentos.

Os especialistas alertam: o clima instável pode se tornar cada vez mais comum, ameaçando não só as avelãs, mas também as amêndoas e as nozes.