Vetado pelo ministro Kassio Nunes Marques, o desembargador do Tribunal Regional Tribunal Federal da 1ª Região Ney Bello vai permanecer em sua campanha – que se arrasta há anos – às Cortes superiores de Brasília. O resultado das eleições de 2022 pode ser decisivo para o magistrado em sua próxima disputa pela vaga ao Superior Tribunal de Justiça que será aberta no ano que vem.

Até o fim do ano, pouco antes de completar 75 anos, a ministra Assusete Magalhães deve deixar a Corte. Oriunda do TRF-1, abria uma vaga destinada a desembargadores federais. Sob condição de reserva, ministros do STJ afirmam ao Estadão que Ney Bello segue como nome forte para a Corte, em razão do apoio recebido por Gilmar Mendes, do STF.

No entanto, Ney, segundo estes mesmos ministros, terá mais sorte caso o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não venha a ser reeleito. O tal veto de Kassio Nunes Marques, dizem eles, perderia peso caso Bolsonaro deixe o Palácio do Planalto.

A desavença com Nunes Marques é antiga, de quando ambos já travavam uma disputa de bastidores antes mesmo do surgimento de uma vaga ao STJ que seria deixada pelo ex-ministro Napoleão Nunes Maia, no fim de 2020. Ambos se acusavam, nos bastidores, de espalhar informações desabonadoras, um contra o outro.

Em 2021, Nunes Marques foi indicado para o Supremo Tribunal Federal. Nos bastidores, pairou a ideia de que, sem a concorrência de Nunes Marques, e um forte padrinho, o caminho de Ney Bello estaria livre para o STJ. Ele ainda conquistou a simpatia do senador Flávio Bolsonaro.

Na disputa pelo STJ, Ney Bello figurou entre os quatro da lista à Corte. No entanto, não conseguiu superar as diferenças com Nunes Marques, consideradas essenciais por Bolsonaro para a indicação. Mesmo assim, era tido como uma indicação certa até o fim da semana passada, quando o ministro Nunes Marques voltou a reiterar a Bolsonaro que mantinha o veto.

Governismo

Criminalistas e magistrados ouvidos pelo Estadão afirmam que Bello é técnico, tem perfil garantista, e fundamenta bem suas decisões. No entanto, há uma crítica em comum: o estado constante de campanha para o STJ e o STF e um certo governismo nas decisões.

Suas decisões agradaram aliados do presidente Bolsonaro. Em junho, mandou soltar o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, na investigação sobre suposta corrupção na pasta. Em 2020, ele trancou investigações sobre o ministro Paulo Guedes – por supostas fraudes em fundos de pensão. Também arquivou um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que citava transações de R$ 42 milhões do advogado Frederick Wassef. Como relator, Ney Bello mandou investigar o Coaf pela confecção do documento.

Eventos e amizades

Indicado em 2013 pela então presidente Dilma Rousseff após integrar lista tríplice de juízes federais para o TRF-1, Ney Bello se mudou do Maranhão para Brasília, onde comprou uma casa em um terreno de 1,8 mil metros quadrados no Lago Sul, por R$ 1,9 milhão.

Antes, já tinha uma relação com a capital federal. Ainda juiz, foi auxiliar do gabinete de Gilmar Mendes no STF. Bello também é professor do Instituto Brasiliense de Direito Público, fundado pelo ex-ministro. Com frequência, vai ao Congresso anual do IDP em Lisboa. Também já organizou seus próprios eventos com magistrados. Um deles em Palermo, na Itália. São eventos acadêmicos, mas que também fazem parte da política do Judiciário.

Nos últimos anos, estreitou também amizades na advocacia. Um dos amigos próximos é Alexandre Pitta Lima, cuja banca tem causas tanto no TRF-1 quanto no STJ. Pitta Lima foi citado, em 2007, na Operação Hurricane da PF, que levou à condenação do ex-ministro Paulo Medina à aposentadoria compulsória por venda de decisões. O irmão do ex-ministro, Virgílio Medina, é acusado de negociar votos de seu gabinete. Segundo a investigação, ele usava a estrutura física e os telefones do escritório de Pitta Lima.

Pitta Lima nunca foi denunciado. Mas continuou a ter proximidade com parentes de membros do Judiciário e do MP. Na advocacia, hoje, é sócio do filho de uma subprocuradora-geral da República.

No fim de 2021, em meio à campanha ao STJ, Pitta Lima abriu a empresa Ag2 Negócios e Assessoria Financeira em sociedade com a mulher de Ney Bello, a técnica judiciária Gabriella Gaspar Bello.

Defesa

Ao Estadão, Bello não comentou se permanecerá em campanha para Cortes superiores, nem sobre eventuais mudanças no Palácio do Planalto.

O desembargador afirma que após a esposa virar sócia de Alexandre Pitta Lima, “não se permitiu mais a tramitação de qualquer processo do advogado” em seu gabinete em razão do impedimento. Sua esposa e Pitta Lima reforçam que não existe elo entre a sociedade e a atividade jurisdicional.

Pitta Lima nega que Virgílio Medina tenha atuado em seus processos, e reforça que a PF nunca o indiciou.

Tanto Pitta Lima quanto Gabriella Gaspar Bello afirmam que a Ag2 presta serviços para “instituições financeiras” na “prospecção de clientes” para “produtos financeiros”.

Procurada para comentar a condenação, a defesa de Virgílio Medina não se manifestou.