01/05/2012 - 0:00
EXPERIMENTO: Maronezzi resolveu apostar em pesquisas para novas sementes, como a soja convencional, que representa 25% de todas as variedades plantadas no País
No dia 26 do mês passado, o agrônomo Ângelo Carlos Maronezzi recebeu em sua fazenda de Sinop, em Mato Grosso, o ex-ministro da Agricultura Alysson Paulinelli, também agrônomo, que entre os anos de 1974 e 1979 supervisionou a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Paulinelli, hoje um agricultor que aos 76 anos não pensa em se aposentar, foi conhecer o que Maronezzi está fazendo a respeito de um tema comum aos dois: a paixão pelo sistema integração lavoura-pecuária (ILP), criado pela própria Embrapa. A ILP, que nada mais é do que a alternância de culturas, inspirou Maronezzi e seu sócio, Edson Marcos Melozzi, a criar a Agro Norte em 1995, empresa de pesquisa de sementes. “Quando começamos, a ILP era quase uma ideia e não uma prática”, diz Maronezzi. “Hoje, está provado que alternar o plantio de grãos com pastagens modifica a maneira de o produtor lidar com a terra porque ele passa a cuidar de sua fertilidade, um dos itens mais importantes para determinar o seu valor.” Segundo a Embrapa, o Brasil tem atualmente 100 milhões de hectares de terras degradadas, deterioração provocada pela expansão desordenada da agropecuária. Na fazenda de Sinop, o agrônomo que virou empresário testa sementes de arroz, soja, milheto e capins para ser usadas na recuperação das pastagens. A demanda por sementes tem feito a Agro Norte crescer a uma média de 30% ao ano, com faturamento previsto de R$ 50 milhões em 2012. “Mas podemos crescer ainda mais, não só com as sementes de arroz, o carro-chefe da empresa, como na soja convencional”, diz.
A diferença do projeto ILP de Maronezzi é que desde o início ele aposta no cultivo de arroz como uma cultura viável, enquanto a maioria das fazendas que recuperam pastos com agricultura utiliza outras culturas, principalmente a soja. Maronezzi conta que a escolha do arroz para as pesquisas de novas variedades de sementes aconteceu de forma natural. “Na década de 1990, quando começamos as pesquisas no norte do Estado, a região só plantava arroz, e de péssima qualidade”, diz. Era uma herança da época da abertura de terras no Centro-Oeste, em que os produtores tiravam a vegetação nativa e plantavam qualquer tipo de arroz por até três safras. “A finalidade do arroz era pagar o custo do desmatamento”, diz Maronezzi. “Não havia preocupação com a qualidade e a produtividade do cereal.” Na época, um hectare de arroz produzia 2,7 mil quilos do grão. Hoje, com sementes melhoradas, a produtividade chega a 3,9 mil quilos por hectare.
A aposta de Maronezzi na ILP tem dado resultados positivos. Para o pecuarista Cássio Gaudêncio Martins, da fazenda Recreio, no município de Cláudia, a 594 quilômetros de Cuiabá, plantar arroz para recuperar pastagens virou regra há seis anos, quando ele firmou uma parceria com a Agro Norte. “Antes da parceira eu já havia tentado recuperar e reformar o pasto, mas sem a agricultura para amortizar os custos o processo era muito caro”, diz Martins. Hoje, 400 dos 1,7 mil hectares são cultivados e 1,2 mil hectares são ocupados pela pecuária por um plantel de três mil bovinos. Antes de cultivar o arroz para recuperar a pastagem, o pecuarista gastava R$ 800 por hectare; no fim das contas, R$ 960 mil. Hoje ele investe R$ 1,8 mil por hectare, para cultivar arroz, e recebe com a venda do cereal R$ 2 mil por hectare, o que dá uma receita extra de R$ 80 mil no ano. “A conta fica positiva”, diz Martins. “Além de ganhar com a venda do arroz, o pasto que vem na sequência é de ótima qualidade e engorda o gado mais rapidamente.” Segundo dados do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), o Estado possui 28,7 milhões de bovinos em 26 milhões de hectares de pastos, dos quais 2,2 milhões estão degradados. Outro seguidor de Maronezzi é o pecuarista Volmir Scheffler, da fazenda Chaparral 10, no município de Porto dos Gaúchos, também em Mato Grosso. Desde que começou a recuperar pasto com o plantio do arroz, os resultados não deixaram dúvidas de que estava no caminho certo. “Tudo melhorou quando optei pela integração da lavoura com a pastagem”, diz. De acordo com ele, quando começou a fazer a recuperação de pastagens, em meados de 2007, o rebanho era de dois mil animais. Naquela época, um hectare de pasto abrigava apenas um boi, que permanecia ali três anos e meio para atingir 540 quilos, o peso ideal de abate. Hoje, ele tem cinco mil animais criados a campo e diz que pode colocar até cinco bois na mesma área, no período das águas, quando há grande oferta de pasto recuperado. “Com mais comida, o gado vai para o abate com 30 meses, no máximo.” Scheffler possui 1,2 mil hectares de pastagens renovadas, 1,2 mil hectares de lavouras e mais mil hectares de pastos que passam por reforma. Em 2011, ele gastou R$ 1,5 mil por hectare para plantar arroz e recebeu na venda do cereal R$ 2,4 mil por hectare. Na ponta do lápis, o arroz deixou um lucro para a fazenda de R$ 1,08 milhão. “Usei uma boa variedade de arroz e consegui um preço acima do mercado”, afirma. “Mas no começo não foi assim, pois no início da ILP os investimentos são altos e o retorno é pequeno.”
O paulista Valter Rozolin, que há 20 anos cria gado na fazenda Fim da Picada, em Juara, no norte do Estado, é um dos novos pecuaristas que estão fazendo ILP, mas ainda não viram a cor do dinheiro. Rozolin começou a plantar arroz há quatro anos e conta com a Agro Norte para ter assistência técnica no campo. “O que consegui até agora foi reduzir os custos com a pecuária”, diz. No ano passado, Rozolin também gastou R$ 1,5 mil por hectare para retirar o pasto velho e plantar arroz, mas após a colheita a receita foi de R$ 1,2 mil por hectare. A fazenda de Rozolin tem dois mil hectares de pastagens, dos quais 50% estão degradados. “Não desisto da integração porque sei que ela dará certo”, diz. Mesmo não ganhando com o arroz, ele consegue engordar no período das águas até sete animais por hectare. “Tenho quatro mil animais, e após a reforma dos pastos esse número vai dobrar.”
Além do arroz, que representa mais de 50% dos negócios da Agro Norte, Maronezzi aposta em novas variedades de soja convencional para ampliar seu negócio na ILP. “Há demanda para essa soja na reforma de pasto, que hoje não é atendida pelas multinacionais do setor”, diz. “É nesse nicho que apostamos.” Segundo ele, da área total de 24,9 milhões de hectares de soja cultivada no Brasil, 6,2 milhões são de soja convencional. As pesquisas da Agro Norte chegaram a uma soja mais resistente à seca, e que por isso poderia ser cultivada em janeiro e fevereiro, meses tradicionalmente evitados pelos produtores por causa dos veranicos no período.
Normalmente, o plantio da soja ocorre em outubro e novembro. Maronezzi diz que o trunfo dessa variedade de soja é a tranquilidade que ela dá ao produtor. “Uma coisa é plantar toda a safra em 15 dias e correr para colher em 30 dias”, diz. “Outra é plantar com um prazo maior, e ter tempo suficiente para colher.” O próximo passo do empresário é o mercado internacional. Desde o ano passado, ele vem dando consultorias a produtores de países da África, Costa Rica, Peru e Equador. “Estamos levando a esses países nossas variedades de sementes para adaptá-las ao clima e ao solo e, quem sabe, abrir outros mercados”, afirma Maronezzi.