O dólar encerrou a sessão desta quinta-feira, 9, em alta de 1,58%, cotado a R$ 5,2788 – maior valor de fechamento desde 5 de janeiro (R$ 5,3523). Lá fora, a moeda caiu em relação a pares fortes e teve comportamento misto na comparação com as principais divisas emergentes e de países exportadores de commodities, tendo o real apresentado de longe o pior desempenho entre seus pares.

Apesar dos sinais de desaceleração da inflação, reforçados hoje pela divulgação do IPCA de janeiro, cresce a apreensão com a desancoragem das expectativas inflacionárias, em meio ao debate cada vez mais candente sobre as metas de inflação. Com o avanço de hoje, o dólar já acumula alta de 3,98% em fevereiro e praticamente zerou as perdas no ano, que agora são apenas 0,02%.

Afora uma troca de sinais nas primeiras horas de negócios, quando desceu até a mínima a R$ 5,1734 (-0,44%), a divisa operou em alta ao longo de toda a sessão, com picos de estresse no fim da manhã e na meia hora final do pregão, quando voltou a superar a linha de R$ 5,27 e registrou máxima a R$ 5,2793 (+1,59%).

Causou desconforto pela manhã a notícia de que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sob ataque cerrado do presidente Lula e da ala política do governo, cogitaria defender uma alteração na meta de inflação deste ano, de 3,25% para 3%. A próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) está marcada para 16 de fevereiro, mas há rumores de antecipação. No fim da tarde, investidores digeriram nova investida da presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, contra a meta de inflação e o nível da taxa Selic.

Para o economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima, a depreciação do real reflete o aumento dos prêmios de risco em razão da crescentes incerteza sobre a política econômica causada pelo ataque do governo ao Banco Central. Lima vê com estranheza a notícia de que Campos Neto estaria disposto a mudar a meta para 2023, o que só faria sentido em um debate mais amplo de alteração de objetivo para todo o horizonte relevante da política monetária.

“Quando se eleva a meta, tem que se tentar ancorar as expectativas nos novos patamares. Se for mudar a meta de acordo com o desenho político expressado pelo presidente, o custo para reancorar a expectativa será muito maior”, afirma Lima, ressaltando que, no passado, mudanças de meta foram acompanhadas de postura mais dura do BC e até alta de juros, justamente para evitar deterioração das expectativas. “Mas agora o governo parece acreditar que vai mudar a meta e isso pode abrir espaço para queda dos juros, o que não faz sentido”.

Fontes ouvidas pelo Broadcast afirmam que, antes mesmo de Lula subir o tom contra a política monetária, Campos Neto e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, haviam tratado reservadamente da necessidade de alterar as metas para 2024 e 2205. Campos Neto teria até sinalizado que eventual mudança da meta para 2024, de 3% para 3,5%, que seria menos danosa para a economia e contribuiria para ancoragem das expectativas.

Após encontro com o ministro da Secretaria das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, Gleisi disse hoje à tarde que meta de inflação de 3% é “inexequível” e questionou: “Nós vamos aceitar uma taxa de juros de 13,75%? Ela defendeu que Campos Neto vá ao Congresso explicar o nível da taxa Selic e disse que a política monetária não pode “jogar contra” o crescimento econômico e a geração de empregos.

Já visto como bombeiro de ocasião, Padilha disse desconhecer qualquer discussão no governo sobre mudar as metas de inflação e que, nos encontros que teve com Campos Neto, em nenhum momento o assunto veio à tona. Padilha observou, no entanto, que no mundo inteiro “autoridades monetárias vão ao Congresso Nacional” e que “não há tabu” sobre o tema. No meio do morde-e-assopra dentro do governo, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), marcou posição a favor da autonomia do BC ao dizer que “com relação à independência do Banco Central, esse assunto não retroagirá”.