23/09/2022 - 8:30
A contratação de quatro navios-usina pelo governo, em outubro passado, como resposta ao fantasma da crise energética, tornou-se um imbróglio jurídico capaz de produzir nada menos do que R$ 3,7 bilhões em punições contra a empresa turca Karpowership (KPS), dona dos navios.
A origem das multas e das indenizações está no atraso do projeto que já deveria estar em operação no litoral do Rio de Janeiro. O leilão “simplificado” do governo previa que os quatro navios, que carregam usinas térmicas sobre seus cascos, tinham de começar a entregar energia no dia 1º de maio, mas nada ocorreu. Foi dado, então, um prazo adicional de mais três meses, para que tudo fosse acionado até 1º de agosto. Caso contrário, os contratos poderiam ser até cancelados pelo governo. E foi o que aconteceu.
No dia 9 de agosto, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) rejeitou cinco justificativas apresentadas pela Karpowership para explicar os atrasos. A empresa argumentou que não teve culpa pelo descumprimento do prazo e que os adiamentos ocorreram por fatores alheios à sua vontade, como demora na emissão de licenças, ações civis públicas movidas pelo Ministério Público e lentidão em declarações de utilidade pública necessárias para instalação de uma linha de transmissão de 15 quilômetros que seria conectada aos navios.
Nada convenceu a diretoria da agência, que decidiu extinguir as concessões, seguindo o que recomendava uma notificação enviada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Restou à companhia recorrer, sob alegação de que pode pedir o reexame de suas alegações e que a anulação dos contratos só poderia ocorrer após vencida essa primeira etapa.
Empresa critica a Aneel e se diz pronta a gerar energia
A Karpowership (KPS), dona dos navios-usina contratados em meio ao risco de apagão, criticou a decisão da Aneel de anular os contratos. “É medida extremamente precipitada e violadora do ordenamento jurídico brasileiro, que atenta contra o interesse público e pode ocasionar prejuízos graves e irreparáveis não só à KPS, mas potencialmente também à segurança de suprimento de potência do setor elétrico”, declarou a empresa, em carta à agência.
A empresa alega ter investido mais de R$ 620 milhões para instalar suas embarcações na área da Baía de Sepetiba, “custeadas inteiramente com recursos do grupo Karpowership”. Afirma que, caso seus pedidos sejam “precipitadamente resolvidos” pela agência, “a KPS, além de ver as centenas de milhões de reais que investiu no projeto se esvaírem por completo”, estará sujeita ao pagamento de multa rescisória que supera R$ 3 bilhões. “E isso sem contar com as demais penalidades contratuais e editalícias, que, somadas, podem ultrapassar a marca de R$ 700 milhões.”
A companhia disse que o projeto envolveu “a contratação de mais de 100 empresas de engenharia, serviços e fornecimento de equipamentos, a criação de dois escritórios no Estado do Rio de Janeiro, o recolhimento de tributos aos municípios, Estado e União, e a geração de mais de 1.500 empregos diretos e indiretos, impactando positivamente o desenvolvimento do município de Itaguaí e região”.
A empresa diz que agora a estrutura está pronta para gerar energia. Juridicamente, porém, o contrato está suspenso, devido ao recurso que a empresa apresentou à Aneel na tentativa de reverter a decisão. A previsão é de que a definição seja em breve, embora a Aneel não comente o assunto, ainda em análise.
Por meio de nota, a KPS declarou à reportagem que “acredita no julgamento das autoridades brasileiras” e respeita a legislação nacional. “A Karpowership segue os trâmites administrativos e atua para garantir o cumprimento de todas as normas de compliance desde o início. O mundo enfrenta desafios energéticos relevantes, e o Brasil tem uma oportunidade estratégica para gerar energia de forma rápida, segura e sustentável. O projeto está pronto para operar com tecnologia de ponta e segue elevados padrões internacionais de sustentabilidade”, afirmou.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.