Quem é:

Laércio Giampani,

Vida urbana:

Presidente da Syngenta

Vida rural:

Produtor de café arábica

 

 

 

 

Andando pelos cafezais de sua fazenda, no extremo sul de Minas Gerais, o produtor Laércio Giampani observa a saúde de suas plantas. A última aplicação de defensivos químicos, segundo ele, foi um sucesso. Com suas plantas livres de pragas e doenças, ele diz estar absolutamente satisfeito com os resultados obtidos. “Essa é realmente a melhor tecnologia que eu conheço”, diz, orgulhoso, analisando com cuidado as folhas dos arbustos. São pouco mais de 200 hectares plantados com variedades de café arábica, o mais rentável. A produtividade de 250 sacas por hectare está de acordo com o que fazem alguns dos mais importantes produtores. Tais insumos, que dele arrancam suspiros, fazem parte de um pacote tecnológico oferecido pela multinacional americana Syngenta, empresa que tem como presidente o próprio Laércio Giampani.

Quem é:

Ingo Erhardt

Vida urbana:

presidente da GSI

Vida rural:

produtor de leite no RS

 

A história pode até soar estranha, uma vez que poucos produtores imaginam ser possível ter como vizinhos de cerca chefões das poderosas empresas fornecedoras de insumos. Segundo levantamento realizado por DINHEIRO RURAL com corretoras que operam na bolsa de valores, tal situação é inusitada e, para analistas, é encontrada apenas no agronegócio. “Nunca havia me deparado com uma situação dessa”, pondera Luiz Marchetti, da Mesa Corporate, especializada em governança corporativa. Afora alguns cuidados éticos – bastante claros entre todos os executivos entrevistados –, essa situação traz algumas vantagens. Principalmente para o cliente. “Um presidente de uma empresa fornecedora de insumo que conhece na pele a situação de um produtor rural pode sensibilizá-lo a encontrar soluções que fogem dos manuais de gestão”, opina José Vicente Ferraz, diretor da AgraFNP – consultoria especializada no mercado agropecuário. O que Giampani pensa disso? “A aproximação com o setor é muito produtiva, porque sei da necessidade deles, o que vai além dos relatórios”, completa.

Quem é:

Antonio Carlos Zem

Vida urbana:

chefão da FMC

Vida rural:

produtor de uva e soja

 

O caso do presidente da Syngenta não é o único modelo de sucesso entre os mandachuvas das multinacionais que atuam no agronegócio. Antonio Carlos Zem, presidente da FMC Agricultural Products, também tem os pés na terra. No Maranhão, é sojicultor. Planta 2.500 hectares. Em Teresópolis (RJ), produz uvas finas para exportação. Durante a semana, vende produtos químicos para ambas as culturas. Uma de suas diversões, quando está vestido na pele de produtor rural, é receber seus fornecedores, que na verdade também são concorrentes. Enquanto faz as compras para a fazenda, recebe de graça uma aula de como as rivais estão trabalhando no mercado – o que está sendo oferecido e em quais condições. “Eles não sabem que eu sou presidente da FMC, o que é realmente muito bom”, se alegra.

A fazenda tem de dar dinheiro porque, segundo ele, “não há hobby que justifique tamanho investimento”. Com chapéu e botas, Zem comenta que o fato o ajudou a tomar uma de suas decisões mais importantes como executivo-chefe: fazer sua companhia desembarcar no bilionário mercado de soja. Até o ano passado, a múlti americana possuía uma forte presença nos mercados de cana e algodão, contudo, negligenciava a sua participação no mundo da soja. “Percebi que realmente não poderíamos continuar fora desse setor e agora entramos com força”, comemora. Dentro de sua estratégia, ele prefere comprar apenas produtos dos concorrentes, porque dessa forma, não há nenhum impedimento ético. “Se eu comprasse da FMC, seria complicado porque teria de seguir uma série de requisitos para não ter nenhum tipo de vantagem em relação aos meus clientes”, analisa. Giampani, da Syngenta, sabe bem como isso funciona. “Nós temos a melhor tecnologia do mercado. Então, não faria sentido eu, como presidente, não prestigiar a companhia que dirijo”, diz. A exemplo de outros setores, como o automobilístico, ele pode comprar com um pequeno desconto, justamente por ser funcionário. Contudo, só pode pagar à vista ou no máximo faturado para 30 dias. Numa atividade em que uma aplicação de defensivo pode custar dezenas de milhares de reais, nem sempre o desconto à vista resolve. “Às vezes preferiria ter a condição normal, sem desconto, mas o importante é ter acesso à tecnologia”, pondera.

Quem é:

Mário Barbosa

Vida urbana:

presidente da Bunge Fertilizantes

Vida rural:

cria cavalos e produz café

 

Apaixonado pela produção leiteira, o executivo Ingo Erhardt sempre sonhou em ter uma fazenda. Durante sete anos ele morou nos Estados Unidos – época em que fez sua primeira tentativa. Mas a distância das terras praticamente inviabilizava a atividade. De volta ao Brasil, ele fez a reestruturação da empresa de equipamento Fokink – fabricante de silos e equipamentos para ordenha. A realização do projeto aconteceu quando ele assumiu a presidência da GSI – multinacional americana que também atua na construção de silos e tecnologias para ordenha. “Nessa época, eu tomei a decisão de comprar minha fazenda”, relembra. E a área não poderia ser outra: a pecuária de leite. Com 550 hectares no Rio Grande do Sul, a 90 quilômetros da capital gaúcha, ele mantém um rebanho de 80 vacas em lactação, com média de 17 litros/dia cada uma. “Não posso e não vou reclamar da atividade”, diz. Mesmo sendo o setor leiteiro conhecido pelas baixas margens, ele avalia que a atividade vai bem. A propriedade possui tudo o que a tecnologia permite e quase se transformou num mostruário da GSI. Ordenhas computadorizadas, pisos antiderrapantes, cochos com alimentação automática são alguns itens que existem em seu estabelecimento. “Eu não subsidio a atividade leiteira, ela tem de ser rentável para se justificar e se, por acaso, ela não se mostrar viável, simplesmente abandono”, comenta de forma bastante direta.

Mas não são apenas os presidentes das empresas que se dão ao luxo de entrar no agronegócio e desfrutar das benesses do campo – ou das agruras que acabam se transformando em soluções. Um caso um tanto diferente acontece na própria Syngenta, comandada por Laércio Giampani.

Outros funcionários também são cafeicultores, como o gerente de segurança de produtos, Egídio Moniz, que trabalha há 34 anos na corporação. Indiano de nascimento e brasileiro por adoção, ele se gaba de conseguir uma produtividade superior à do chefe. “Ele pode ser meu chefe, mas meu café é mais bonito”, brinca. Ele mantém uma área de 35 hectares irrigados e diz que a sinergia das funções só ajuda. Amauri Peloi, gerente de marketing para inseticida para toda a América Latina também aposta nos conhecimentos adquiridos no campo para ajudar no trabalho. E vice-versa. “Uma de nossas campanhas nasceu de uma conversa de cerca com um vizinho”, brinca, citando o defensivo “Verdadeiro” cujo mote – “nunca vi nada igual” – nasceu de um empolgado comentário, proferido por um vizinho de cerca.

Mário Barbosa, presidente da Bunge Fertilizantes também está nesse time. Ele é produtor de café arábica no norte de São Paulo. Em suas fazendas, o executivo utiliza os fertilizantes fabricados pela empresa em que trabalha.

Barbosa também é criador de cavalos da raça mangalarga e até foi presidente da associação dos criadores. Segundo ele, conhecer o trabalho na fazenda o ajuda no cotidiano empresarial. “Um trabalho prazeroso e lucrativo”, afirma.

Por que plantar?

Origens: a decisão de comprar uma fazenda aparece depois de o executivo dominar o setor em que pretende trabalhar como produtor

Enquanto apurava esta reportagem DINHEIRO RURAL se deparou com um fenômeno interessante: muitos executivos de grandes empresas não quiseram expor seu lado produtor, argumentando que tal situação não contribuía para os negócios que dirigem. Contudo, em conversas informais pôde-se observar uma unanimidade: todos declaram estar absolutamente satisfeitos com os resultados obtidos em seus negócios. Mesmo em alguns setores pressionados pelos preços e, principalmente pelo câmbio, ninguém se declarou no vermelho ou com extrema dificuldade para pagar as contas. O motivo, segundo eles, está na gestão profissional de seus negócios conduzidos conforme mandam os manuais de administração de empresas. O controle de custos e a estratégia de comercialização apareceram como os itens mais importantes, na opinão desses empresários. A escolha da cultura, em todos os casos, leva em conta os conhecimentos adquiridos na vida como executivo. “É mais fácil cuidar de um negócio quando se tem pleno conhecimento do mercado”, disse Antonio Carlos Zem, da FMC. Segundo ele, esse tipo de atividade sugere uma mudança no padrão de comportamento. “Conseguimos associar uma atividade rentável a um negócio lucrativo”, define o executivo-produtor.