Levado por um agente até o gramado do Parque da Cidade, na região central de Brasília, o cavalo 847 pasta tranquilamente. Sacode a crina, dobra uma das patas, morde os tufos de grama. A seu lado, o policial militar o acaricia e aponta uma cicatriz seca que contorna seu olho direito.

Um objeto cortante rasgou-lhe o couro a cerca de um centímetro do globo ocular, vertendo sangue sobre o seu focinho. Por pouco, o 847 não ficou cego. Dentro das baias de 12 metros quadrados do Segundo Esquadrão de Choque Montado da PM, o cavalo deixa de ser apenas um número, para ser conhecido como Drácula – não há certeza sobre a origem do apelido, dado há 13 anos.

No último dia 8, quando golpistas munidos de ódio, pedaços de pau e barras de ferro cercaram Drácula, na Praça dos Três Poderes, o animal viu o soldado Teles, seu montador, ser puxado, cair e sofrer agressões dos extremistas.

Diante das cenas de apuro, os demais soldados da cavalaria correram para retirar policial e cavalo do meio dos agressores. Conseguiram isolá-los rapidamente. Próximos de Drácula, outros dois cavalos também viram seus soldados serem arrancados de cima deles pelos agressores golpistas, mas nenhum se feriu.

Curativo

Numa área isolada da praça, embaixo do mastro monumental que sustenta a Bandeira Nacional, o veterinário da Polícia Militar, major Renato Ferreira, prestou os primeiros atendimentos a Drácula. Fez um curativo no local do corte e deu ordem para retirá-lo do lugar.

O soldado Teles, que sofreu alguns hematomas e uma lesão no joelho, foi encaminhado para atendimento médico, mas passa bem e já teve alta.

“Prestamos, ali mesmo, os primeiros cuidados ao 847. A situação poderia ter sido mais complicada, mas acabou por não ser nada grave. O cavalo está bem e totalmente recuperado”, disse ao Estadão o major Renato Ferreira.

Drácula é um cavalo “mestiço”. Chegou ao Esquadrão de Choque Montado da PM quando tinha dois anos de idade. Seus pais não são conhecidos. O que se sabe é que veio do Rio Grande do Sul, Estado que hoje concentra grandes redutos bolsonaristas e de onde partiram caravanas de extremistas que se amotinaram em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, para marchar em direção aos prédios do Congresso, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Aposentadoria

Hoje, o valente 847 está com 15 anos. Como os demais animais que compõem a cavalaria, deverá trabalhar com os soldados montados até completar 20 anos, quando, enfim, poderá se aposentar. Um cavalo vive, em média, 25 anos.

De perfil dócil, Drácula, o 847, não tem a mesma estatura de novos cavalos que têm chegado ao regimento. É um pouco menor que seus novos companheiros, mas conhecido por ser destemido e fiel.

Ele já foi liberado para voltar a circular pela Esplanada dos Ministérios e monumentos de Brasília.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.