01/04/2009 - 0:00
Magim Rodriguez é um homem movido a desafios. Como executivo, ajudou a estruturar financeiramente a Lacta e depois transformou a AmBev em uma das maiores cervejarias do mundo. Agora, aos 66 anos, aposentado e bem de vida, poderia passar o resto de seus dias descansando na bela fazenda onde vive e pesca com os amigos, no município de Amparo, no interior de São Paulo. Mas isso nem sequer passa pela sua cabeça. Muito pelo contrário. Com dinheiro em caixa e uma ideia ousada, está em via de colocar em prática um dos projetos mais ambiciosos de sua vida: montar uma cadeia integrada capaz de criar, abater, embalar e vender carne de cordeiro em escala industrial.
SEGREDO DE ESTADO:
Magim e seu filho Fábio (acima) fazem mistério, mas devem iniciar as atividades do rebanho Sim no início de 2010
Precavido, faz questão de reforçar a todo momento que tudo não passa de um projeto, que pode ou não sair do papel em 2010. Mesmo assim, já comprou uma propriedade de 960 hectares e vem investindo pesado em infraestrutura. “É um investimento grande, com uma logística complicada, ainda estamos estudando a viabilidade”, desconversa o empresário, para logo revelar parte dos seus planos. “Não existe nada do tipo no Brasil, mas é uma estrutura muito parecida com a da suinocultura, por isso estou estudando o mercado de porcos. É o que a Sadia faz, mas em uma escala menor.”
A ideia de criar cordeiros surgiu no início dos anos 1990, durante uma visita ao Nordeste, quando um amigo lhe contou sobre um promissor mercado de ovinos. Com um faro apurado para os negócios, Rodriguez estudou pela primeira vez o setor e logo percebeu que esta poderia ser uma ótima oportunidade. O único problema ainda era a falta de espaço em sua agenda. Afinal, para fazer da maneira correta, teria de dedicar um tempo inexistente em seu cotidiano naquela época. Mas os anos passaram e os ovinos não saíram de sua cabeça. Tanto que em 2004, quando se aposentou, retomou o antigo sonho e constatou que o Brasil era um grande importador de cordeiros e havia espaço de sobra para o seu projeto. Era o estímulo que faltava.
“Na época, mais de 70% dos cordeiros à venda no País eram importados do Uruguai. Ao mesmo tempo, o mercado nacional crescia a uma taxa de 25% ao ano. Eu não podia mais deixar passar a oportunidade”, conta Rodriguez, que logo se associou a Isnar Filho, um tradicional criador do Nordeste, e em pouco tempo formou um dos melhores rebanhos da raça Santa Inês do Brasil. Mas ele não estava satisfeito. Sua ideia inicial era fornecer carne às grandes redes varejistas e não apenas participar de leilões de elite. Com uma genética forte em mãos, decidiu romper com o ex-sócio e partir para algo ainda maior.
Ao lado do filho Fábio Cotrim, criou a marca Sim e passou a trabalhar pesado em cima do marketing, mesmo sem ter sequer um carré para vender. Até o momento, os cerca de 300 animais P.O. e as 600 receptoras seguem pastando livremente à espera da concretização do negócio, o que pode fazer com que o número de cordeiros se multiplique significativamente na propriedade. “Ainda estamos na fase de estudo do negócio, mas a intenção é chegar aos 30 mil animais próprios, além de outros milhares dos integrados”, revela Fábio Cotrim.
E mercado para tanto cordeiro não falta. Apenas para suprir a demanda brasileira seriam necessários 35 milhões de matrizes. Hoje, porém, este número não chega a 17 milhões. A maior parte da carne consumida ainda vem do Uruguai, mas, no ritmo atual de crescimento, vai faltar carne de cordeiro em pouco tempo. “Vamos comer todo o Uruguai até junho de 2010. Depois, com a falta de matéria-prima, os preços ao consumidor vão disparar”, profetiza Rodriguez. E, quando isto acontecer, ele já quer estar pronto. Para isso, vem costurando parcerias importantes nos últimos meses.
CARNE DE PESCOÇO
Pioneiro na comercialização de carnes de cordeiro em grande escala, Robson Leite, da Agropecuária Savana, é um parceiro em potencial. No setor há apenas quatro anos, já possui uma rede integrada de fornecedores, tem um frigorífico próprio e domina a distribuição da iguaria entre os restaurantes finos de São Paulo. Em resumo, é exatamente o que Magim Rodriguez quer, só que em menor escala. Dessa sinergia pode surgir bem mais que uma parceria, mas por ora são apenas “conversas de cocheira”, como eles mesmo definem.
PIONEIRO PODE VIRAR PARCEIRO:
no ramo há quatro anos, Robson Leite pode colaborar com know-how
Segundo Leite, que iniciou sua criação de ovinos quase por acaso e hoje vende até 350 toneladas de carne processada por mês, o sucesso se deve principalmente à grande aceitação do produto entre os consumidores, principalmente nas churrascarias. Mas é nas mãos dos chefs renomados que o cordeiro ganha status de carne nobre. Mesmo as partes nem tão nobres assim. “Todo o cordeiro é bom. Não tem carne de segunda. Um bom exemplo disso é o Navarin, um prato à base de pescoço de cordeiro elaborado por Emmanuel Bassoleil, do restaurante Alez, Alez!, que foi premiadíssimo”, conta Leite.
Detalhe: o quilo da carne de pescoço de cordeiro custa R$ 4,50, ante R$ 40 do carré francês, parte mais nobre do animal. “Os chefs ainda não conhecem a carne do pescoço, mas, no dia em que a conhecerem, ela será mais valorizada que o carré”, projeta Emmanuel Bassoleil, fã declarado da iguaria. Seja como for, a parceria entre o profissionalismo de Magim Rodriguez e o pioneirismo de Robson Leite tem tudo para render bons frutos e fortalecer a ovinocultura no Brasil. Os consumidores agradecem.