Desafio pouco abordado nas campanhas eleitorais, a inclusão escolar de alunos com deficiência, como autistas e pessoas com síndrome de Down, passou a fazer parte dos discursos dos candidatos ao governo de São Paulo Fernando Haddad (PT) e Rodrigo Garcia (PSDB), atendendo a uma histórica demanda de pais por acesso à rede regular de ensino. Representante do bolsonarismo na disputa, o candidato do Republicanos, Tarcísio de Freitas, também defende a inclusão, na contramão do que prega a política do governo federal.

Os cinco candidatos ao governo paulista mais bem colocados se encontram na noite desta terça-feira, 27, para mais um debate, desta vez promovido pela TV Globo. Além de Haddad, Tarcísio e Garcia, participarão também Elvis Cezar (PDT) e Vinicius Point (Novo).

Quando o tema é inclusão escolar, a gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) ficou marcada pela defesa da segregação de alunos com deficiência. Em agosto do ano passado, por exemplo, o então ministro da Educação Milton Ribeiro afirmou que alunos com deficiência atrapalham o aprendizado de crianças típicas. Em entrevista à TV Brasil, ele criticou ainda o que chamou de “inclusivismo” e defendeu o decreto editado por Bolsonaro em 2020, no qual o governo incentiva o retorno de salas e escolas especiais, prática rechaçada por especialistas de todo o mundo e derrubada pelo Supremo Tribunal Federal em dezembro do mesmo ano.

No debate realizado pelo Estadão e a Rádio Eldorado juntamente com outros veículos de comunicação no último dia 17, Garcia prometeu contratar um segundo professor para salas de aula com crianças diagnosticadas no transtorno do espectro autista (TEA). Diferentemente da rede municipal, o Estado não dispõe de auxiliares para ajudar os alunos em atividades pedagógicas, mas apenas de higiene e alimentação. Até 2021, não havia uma política estadual de inclusão para crianças com TEA.

O tucano também afirmou no mesmo debate que, se eleito, vai construir “centros de apoio para pessoas com autismo e suas famílias, com psicólogos, neurologistas e outros profissionais”. São Paulo não dispõe de nada semelhante hoje, como fazem outros Estados, como Bahia e Rio Grande do Sul. Garcia já até definiu que a cidade de São Bernardo do Campo, no ABC, será parte da rede.

Haddad, por sua vez, passou a pautar o tema em suas inserções eleitorais na TV. Em uma delas, o ex-prefeito da capital conta a história de Chico, um menino de 9 anos com síndrome de Down que se integrou à escola regular depois de o petista ter implementado na cidade o programa federal Viver sem Limites.

Durante agenda em Santos na última quarta-feira, 21, Haddad disse que vai cruzar o Censo Escolar com o cadastro dos atendidos no Estado pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC) para localizar as crianças com deficiência e levá-las à escola.

“E não é só matricular, mas preparar as escolas para receber esses alunos. Em caso de deficiência mais grave, é possível ainda que se faça um contraturno em escolas especiais, mas um turno ao menos deve ser na escola regular. O convívio é fundamental.”

Com um capítulo dedicado ao tema em seu plano de governo, Haddad promete criar Núcleos de Educação Inclusiva nas instituições de ensino técnico, tecnológico e superior do Estado. Também afirma que vai “restabelecer a central de Libras (Língua Brasileira de Sinais) de São Paulo, oferecendo atendimento 365 dias por ano, 24 horas por dia em todo funcionalismo público, proporcionando a comunicação entre ouvintes e pessoas surdas em tempo real, por videochamada e intermediada por um intérprete”.

Tarcísio também defende a inclusão, apesar da postura adotada pelo governo Bolsonaro. Mesmo após o STF ter derrubado o decreto, o Ministério da Educação segue defendendo que crianças com deficiência fiquem separadas em salas e escolas especiais. Em seu plano de governo, o candidato do Republicanos diz que vai ampliar a acessibilidade das escolas e a capacitação profissional das equipes.

Cenário

Nos últimos cinco anos, houve um aumento substancial de matrículas de crianças e adolescentes diagnosticados no TEA em escolas regulares no Brasil, mas a luta pela inclusão escolar ainda engatinha. Apesar da maior presença, os principais desafios persistem, como a melhora na formação de professores, a flexibilização de materiais e a oferta de recursos humanos para o auxílio na sala de aula. Apesar de ilegais, ainda há registros na rede privada de negativa e limitação de matrículas.

Segundo o último censo escolar, 294.394 alunos com autismo cursaram os ensinos infantil, fundamental ou médio das redes pública e privada em 2021. A alta é de 280% se comparada a 2017, quando havia 77.102. Números que chamam a atenção, mas, segundo educadores e terapeutas, representam apenas uma parcela do universo que deveria frequentar a sala de aula. No Brasil, seriam mais de 2 milhões de pessoas, segundo estimativas.