Após ter recebido os US$ 300 milhões de compensação pagos pelos Estados Unidos, o Brasil comunicou formalmente ontem à Organização Mundial do Comercio (OMC) o acordo com Washington que encerra a disputa do algodão
entre os dois países, que começou em 2002.

O Brasil decidiu não retaliar os EUA, em troca da compensação, pelos quatro próximos anos, até a elaboração de uma nova lei agrícola americana. O acordo foi considerado “histórico” pelo diretor-geral da OMC, Roberto Azevedo. Para
os EUA, foi positivo deixar o contencioso para trás. Mas o representante brasileiro na reunião do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC, conselheiro Celso Pereira, observou que o acordo não implica reconhecimento,
pelo Brasil, da compatibilidade das medidas discutidas no conflito do algodão com as regras da OMC.

Pereira acrescentou que, pelo compromisso firmado há duas semanas, em Washington, os EUA concordaram em fazer ajustes adicionais no programa de garantias de crédito às exportações – o GSM-102, que deverá funcionar conforme os parâmetros negociados bilateralmente. “O acordo também contribuirá para mitigar o dano causado a produtores brasileiros pelos efeitos negativos dos programas de apoio ao algodão americano”, afirmou o
diplomata brasileiro. “O Brasil continuará a seguir com especial atenção, nos próximos anos, os impactos dos programas do US Agricultural Act e seus efeitos sobre os interesses da agricultura brasileira”, disse ele.

Mas o acordo ainda causa certa polêmica, no Brasil e nos EUA. Em editorial, o jornal “Washington Post” afirmou que o acordo “perpetua o insalubre status quo dos subsídios”, destacando que os produtores americanos receberam US$  33 bilhões entre 1995 e 2012.

Pedro de Camargo Neto, que deu partida ao contencioso quando estava no Ministério da Agricultura do Brasil, também reclama que a disputa tinha um objetivo mais amplo do que a obtenção de uma farta compensação para que os
cotonicultores brasileiros realizem atividades de pesquisa, capacitação e assistência técnica. “Não culpo a Abrapa [Associação Brasileira dos Produtores de Algodão], pois governo abdicou da liderança que o Brasil chegou a ter na OMC. Devem ter achado melhor esse valor na mão do que o prejuízo real voando na mão de negociadores sem vontade política de ganhar”.

Fontes do governo brasileiro argumentam que o Brasil recebeu, no total, uma compensação de quase US$ 1 bilhão dos americanos nesse caso, o maior valor na história da OMC. E dizem que os americanos não estão oferecendo os mesmos subsídios do passado, porque os preços estão mais elevados no mercado internacional. Além disso, havia dificuldade no país para que uma lista de retaliação contra produtos dos EUA fosse definida, já que, na prática, isso
pode até dificultar a situação em setores da economia.

Cerca de 10% do que o Brasil recebeu dos EUA antes do acordo final era destinado a países produtores de algodão na África, sob a forma de projetos. A expectativa é que, agora, pelo menos US$ 30 milhões sejam usados nesses mesmos canais.