15/04/2013 - 11:37
Há um ano, o holandês Andreas Petrus van Kruijssen nem imaginava que poderia viver no Brasil. Na época, ele atuava como diretor da FloraHoland, a maior cooperativa de flores do mundo. Convidado a substituir Robert van Arnhem no comando da Veiling Holambra, empresa responsável por 45% do comércio nacional de flores, que movimenta próximo de R$ 1 bilhão por ano, ele se mudou da Holanda para a cidade de Holambra, no interior de São Paulo. Apesar das dificuldades, Kruijssen se adaptou rápido. “O Brasil tem muitas similaridades com meu país”, afirma, em bom português, o executivo. “Muitas famílias de produtores daqui são parentes de conhecidos meus na Holanda.” Aumentar essas semelhanças é uma de suas principais metas. Entre os desejos de Kruijssen está convencer os produtores nacionais a pagar royalties para melhorar a qualidade das flores produzidas.
DINHEIRO RURAL – O sr. foi diretor da maior cooperativa de flores do mundo, na Holanda. Como vê o mercado brasileiro?
Andreas Petrus van Kruijssen – Existem similaridades do Brasil com a Holanda. Há muitas famílias de produtores daqui que são parentes de conhecidos meus na Holanda. Acredito nas oportunidades do mercado brasileiro, a economia está crescendo e, consequentemente, a renda das pessoas. Quando isso acontece, sobra mais dinheiro para comprar flores. Muitas pessoas que no passado não tinham condições econômicas, hoje, podem ir ao Pão de Açúcar, por exemplo, e comprar um vaso de orquídeas. O crescimento do mercado e a maior competição também fazem os preços caírem, o que favorece o consumidor.
RURAL – A Veiling Holambra utiliza muita tecnologia de ponta nos leilões. Ainda há o que melhorar nesse tipo de comércio?
Kruijssen – Quando esse tipo de leilão começou no Brasil, em 1989, era utilizado um sistema de lâmpadas. O primeiro relógio, ainda analógico, foi trazido da Holanda e representou um grande avanço, no final da década de 1990. Hoje, operamos com um sistema digital, fornecido por uma empresa da Bélgica, que é o mesmo utilizado pelos holandeses. Neste ano, seremos os primeiros a substituir os telões por equipamentos de LED, uma tecnologia mais moderna. Isso significa que estamos ultrapassando os holandeses em tecnologia nos leilões de flores. O próximo passo é levar esses eventos para a internet. Isso é algo já bastante disseminado na Europa, mas aqui no Brasil ainda não pegou. Em dois ou três anos, acredito que estaremos operando online.
RURAL – Levar o leilão para a internet vai permitir à Veiling Holambra expandir a atuação a outros Estados produtores de flores, como os do Sul e o Ceará?
Kruijssen – São Paulo responde por 81% das nossas vendas, e a região de Holambra representa 49% do total. Mas já existe bastante produção no Sul do País e o Ceará possui flores de muita qualidade. O leilão online vai ajudar, sim. O problema é que no Brasil há muita burocracia. Temos casos de produtores de São Paulo, por exemplo, que não conseguem vender para outros Estados por causa de regras de transporte de espécies nativas. O problema estaria na transferência de insetos para outras regiões, mas isso não acontece. A burocracia dificulta muito o crescimento do mercado.
RURAL – Os gargalos logísticos também atrapalham o mercado de flores no País?
Kruijssen – O Brasil é um país difícil e o transporte é um problema sério. Na Europa, transportamos flores de trem. Aqui, precisa ser de caminhão e o custo é bem mais alto. Em São Paulo ainda há menos problemas, mas não é o caso dos produtores do Ceará, por exemplo. Nas exportações, usar o porto de Santos é praticamente impossível. Produtos como folhagens poderiam ser exportados de navio, em contêineres refrigerados, mas as cargas correm o risco de ficar meses paradas no porto, inviabilizando a operação. O transporte aéreo, que seria mais adequado, também enfrenta dificuldade na liberação. O comércio de flores precisa de agilidade. Sem ela, não há como vender.
RURAL – É por isso que as exportações brasileiras ainda são pouco significativas?
Kruijssen – Também. Mas o mais grave é que as flores produzidas no Brasil não possuem padrão para exportação. Não é que sejam de má qualidade, mas estão abaixo do exigido no mercado externo. Um dos problemas que percebi aqui é que o produtor brasileiro não gosta de pagar royalties para ter uma tecnologia mais avançada. Mas isso é mercado. Ninguém investe no desenvolvimento de novas sementes para dá-las sem nenhuma remuneração. Tudo é investimento, mas parece que falta esse entendimento. Por esse motivo, muitos criadores internacionais não atuam no Brasil. A consequência é que o País não acompanha o desenvolvimento mundial do setor de flores.
RURAL – É por isso que os produtores nacionais estão sofrendo com a importação de flores?
Kruijssen – Houve um crescimento das importações, principalmente da Colômbia, que tem rosas de muito boa qualidade. Mas isso é natural. O Brasil é um grande mercado e sempre será assediado pelos estrangeiros. O aumento da concorrência é sempre positivo porque ele estimula os produtores a melhorar o padrão de seu produto. O consumo per capita brasileiro de flor ainda é muito baixo, bem menor do que nos países europeus. Há espaço para todos.
RURAL – Como agregar valor às flores, que têm se tornado um produto cada vez mais popular?
Kruijssen – Com acessórios. Por exemplo, vasos. A mesma flor, que custaria R$ 20, pode ser vendida por R$ 30 ou R$ 40, dependendo de como ela é apresentada. O problema é que, mais uma vez, esbarramos nas dificuldades de atuar no Brasil. Muitas vezes o produtor acaba sendo tributado pelo vaso e seu lucro desaparece.
RURAL – Nos últimos anos, por conta de fenômenos naturais, a temperatura em Holambra subiu um grau, em média. Essas mudanças climáticas estão prejudicando o setor?
Kruijssen – Algumas espécies que eram produzidas em Holambra já não são mais vistas no município por causa da alta temperatura. Muitos produtores estão indo para o Sul do País, onde a temperatura é mais baixa, ou para regiões mais altas, especialmente as de Minas Gerais.
RURAL – O mercado de flores sofre com a concorrência de algum outro setor do agronegócio?
Kruijssen – Não. A maior parte da produção é feita em estufas, o que não requer muito espaço. Um produtor de flores que tenha 50 hectares é um grande floricultor. Essa área, em outra atividade, não é nada. Por outro lado, há muita tecnologia na produção de flores e os produtores são altamente especializados.
RURAL – No ano passado, a Veiling Holambra faturou cerca de R$ 400 milhões e foi responsável por 45% do comércio de flores no Brasil. Quais são as expectativas para os próximos anos?
Kruijssen – Nós temos crescido a taxas superiores a 12% ao ano. Para 2013, a meta é algo em torno de 8%, mas acredito que dê para ficar acima disso e permanecer na mesma faixa de crescimento dos últimos anos. Atualmente, temos 320 sócios e 502 clientes ativos. A demanda dos varejistas está muito alta, como é o caso da rede Pão de Açúcar, a maior cliente da cooperativa. Dobramos de tamanho a cada cinco anos e a expectativa é alcançar R$ 1 bilhão em receita até 2019.
RURAL – Há algum plano de expansão da estrutura física da cooperativa?
Kruijssen – Temos 105 mil metros quadrados de área construída, mas em dez anos ela deve dobrar. Hoje, ela é suficiente para dar suporte ao crescimento planejado da cooperativa, pelos próximos 45 anos. Temos uma estrutura similar à que existe nas cooperativas da Holanda, com galpões em formato de asa. Vamos inaugurar uma área, ainda este ano, na qual os atacadistas ficarão instalados em boxes, para atender o mercado de intermediação, outro serviço que prestamos, além dos leilões. Nessa área, passaremos a trabalhar também com acessórios, algo que não fazemos atualmente.
RURAL – O sr. chegou ao Brasil há nove meses. Como tem sido a experiência de trabalhar no País?
Kruijssen – Há um ano, se alguém me dissesse que estaria morando no Brasil, eu duvidaria. Hoje, meu plano é ficar pelo menos cinco anos no País, um bom tempo de experiência. Depois, provavelmente, volto para a Europa. Mas, nunca se sabe. A vida pode ser cheia de boas surpresas e perfumada como as flores.