01/04/2010 - 0:00
As acomodações são simples e funcionais e os cavalos levam o que se pode chamar de uma “vida de rei”. Pastos altos, cocheiras amplas e a pista onde acontecem os treinamentos, apesar das pequenas dimensões, oferece tudo o que um animal de esporte necessita. O piso é adequado e os obstáculos, dentro das especificações internacionais.
Na cerca, um homem de 46 anos observa atento os trabalhos. Os braços cruzados e a mão no queixo são marcas registradas. Em 1992, o mesmo José Roberto Guimarães já mantinha postura semelhante quando a seleção masculina de vôlei conquistou sua primeira medalha de ouro.
“Existe um grande mercado para criadores de cavalos intermediários”
José roberto guimarães, criador e técnico de vôlei
Em 2008, nos Jogos de Pequim, com os cabelos um pouco mais grisalhos, mais uma vez ele colocou uma medalha dourada no peito. Dessa vez, como técnico da seleção feminina de vôlei. Longe das quadras e dos treinamentos, Zé Roberto, como é chamado pelos amigos, passa boa parte de seu tempo num rancho que construiu na cidade de Santana de Parnaíba, município da Grande São Paulo. Lá, ele mantém um pequeno centro de treinamento, um haras com 14 éguas e um sonho: levar para a equitação alguns dos fundamentos que aprendeu em sua bem-sucedida carreira de esportista no vôlei. “O Brasil só cria cavalos pensando em olimpíadas e não há ninguém que tenha se especializado em produzir cavalos para a base, para as crianças que começam a montar”, explica. “Por isso, acho que há um trabalho a ser feito”, diz.
Nas escolas de equitação, espalhadas Brasil afora, a falta de animais especializados é notória. Normalmente são usadas espécies com idade avançada ou com alguma limitação física que impede a evolução em alguma das modalidades esportivas. “No Brasil, não existe a cultura do cavalo de base, o que é um problema para as escolinhas”, explica o presidente do Clube Hípico de Santo Amaro, Luís Duílio Martins, que há 80 anos forma cavaleiros na capital paulista. Além da formação de novos atletas, Zé Roberto está pensando nos ginetes que, como ele, querem uma vida esportiva, mas sem correr riscos. “Para cavaleiros do meu nível, que não têm grandes pretensões, existe uma oferta pequenas de animais adequados”, explica.
Treinamento: Francisco Borges é o treinador responsável e acredita no sucesso do projeto
A solução, segundo ele, pode ser mais fácil do que se imagina e utilizar cavalos da raça lusitana para quem dá os primeiros passos no mundo das competições de salto uma solução adequada. “São animais dóceis, que não têm muita potência para competições mais fortes, mas por outro lado são muito fáceis de ser conduzidos, o que é fundamental para quem está aprendendo a montar”, comenta.
Davi Carrano é um dos parceiros de Zé Roberto na empreitada. Ele também é criador de cavalos lusitanos e dono de um centro de treinamento, o Manège Sant’Adelaide, em Cotia. “Não há esse tipo de seleção e Zé (Roberto) observou muito bem isso, até porque é uma janela de oportunidade.”
Enquanto um cavalo “top” pode custar a partir de US$ 100 mil, passando de US$ 1 milhão, esses exemplares propostos pelo bicampeão olímpico têm seus preços numa faixa de R$ 15 mil a R$ 40 mil”. Francisco Borges é veterinário e cavaleiro. É dele a responsabilidade de preparar os animais que serão vendidos aos iniciantes que procuram o seu primeiro cavalo. “Ninguém começa a dirigir com um carro de corrida e o que oferecemos é justamente o “carro” apropriado para quem deseja praticar equitação com segurança”, comenta.
Mas quem pensa que Zé Roberto é um novato no mundo dos cavalos, se engana. Seus primeiros contatos aconteceram quando menino, em sua cidade natal, Quintana, no oeste paulista. Neto de um “retireiro”, ele conta que guarda fotos do avô montado em uma mula após a lida do campo. “Os cavalos sempre estiveram em minha vida”, diz. “Mas desde 1993, logo depois do ouro em Barcelona, é que me envolvi mais”, comenta. “E há seis anos comecei a minha criação, fazendo três a quatro potros por ano. Pode não ser muito, mas meu foco é qualidade e não quantidade.”
Mesmo em sua vida profissional, quando está focado nos treinamentos da seleção brasileira, os cavalos vêm a calhar. “Já os utilizei para que as meninas tivessem essa experiência, porque a equitação trabalha um lado da sensibilidade humana que não conheço em outro esporte: é preciso estabelecer um elo com o animal, o que é fantástico”, comenta. Um olhar diferente, que pode até significar mais medalhas no futuro e que venham, de preferência, a galope.