01/05/2012 - 0:00
“Mais um ano e mais uma crise para os exportadores de gado vivo.” Com essa frase, o pecuarista paraense Mauro Lúcio Castro Costa, de Paragominas, no Pará, resumiu o cenário para as vendas de gado em pé, como são chamadas as exportações de bovinos vivos a outros países. Costa, que também é presidente do Sindicato dos Produtores Rurais do município, cria dois mil animais – quase todos nelore comercial, animais sem registro – na fazenda Marupiara, a 300 quilômetros de Belém, a capital do Estado. Nos últimos anos, ele tem exportado cerca de 1,2 mil bovinos vivos por ano, mas em 2012 a expectativa é de uma quantidade menor de animais vendidos. “Vamos exportar menos para a Venezuela, país que vinha sendo um bom comprador de gado vivo desde 2007”, diz Costa. Neste ano, a Venezuela está voltando a comprar de seu tradicional fornecedor, a Colômbia, e tende a deixar de buscar gado no País. Além da Venezuela, o Brasil exporta bovinos vivos para o Líbano, Turquia e Jordânia, países do Oriente Médio que abatem os animais de acordo com suas regras religiosas. Mas 2012 não será exceção no calendário de negócios dos pecuaristas brasileiros. Segundo Costa, em 2010 as exportações de gado vivo já haviam sofrido um baque, por causa do real valorizado. O Brasil perdeu competitividade diante de outros exportadores de gado vivo, como a Austrália e o Canadá. “Desde que começamos a entrar nesse mercado é um problema em cima do outro”, diz Costa. “Até os frigoríficos estão no nosso pé, querendo que o governo taxe o boi exportado”, diz ele. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) mostram que em 2011 o setor exportou 401 mil animais, queda de 37% em relação ao ano anterior.
Pará exporta 98% do gado vivo do País
DE OLHO NO FUTURO Mauro Castro Costa, da fazenda Marupiara (à esq.), e Daniel Freitas, presidente da Abeg, defendem as exportações de gado vivo, dada a importância da atividade para o Estado do Pará
Quanto à receita obtida com a venda dos animais, não há dados oficiais no MDIC. Mas, tomando por base o valor médio de US$ 1.094 por animal exportado, segundo a Scot Consultoria, de Bebedouro (SP), o movimento de 2011 chega a US$ 438 milhões. “Deixar de exportar gado vivo interfere nas contas da fazenda”, diz Daniel Freitas, presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Gado em Pé (Abeg), entidade que representa quatro empresas exportadoras. O Pará tem um rebanho de 17 milhões de bovinos, o maior do Norte do País, região com 40 milhões de animais. De acordo com Freitas, por ter um rebanho grande e poucos frigoríficos em atividade, a maior parte dos animais é abatida em outras regiões, como Nordeste e Centro-Oeste. “Os frigoríficos abatem no Pará apenas 1,7 milhão de animais por ano, fiscalizados pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF), mas os pecuaristas terminam a engorda de quatro milhões de animais”, diz Freitas. “Quando exportamos, mexemos com os preços praticados no Estado porque o mercado externo remunera mais que a indústria.” Em 2011, a cotação da arroba de boi gordo exportado ficou 4% acima dos preços de mercado. O Pará embarcou 318 mil bovinos, 93% dos animais vendidos no Exterior. Para dar conta da tarefa, as empresas construíram 13 Estabelecimentos de Pré-Embarque (EPEs), para alojar os animais até que sejam liberadas as guias de exportação. O Brasil começou a exportar gado vivo em 2004, e apenas para o Oriente Médio, aproveitando a brecha aberta pela descoberta de focos de febre aftosa no Uruguai. Até 2003, o Oriente Médio comprava na América Latina animais vivos apenas daquele país. Mas, com o mercado uruguaio fechado, os importadores descobriram o gado do vizinho Rio Grande do Sul. Com um rebanho de 14 milhões de bovinos, porém – considerado pequeno até para a demanda interna gaúcha –, começou a ficar caro para os importadores fazer negócio na região. A partir de 2007, outros Estados, como São Paulo e Minas Gerais, tentaram exportar animais vivos, mas foi no Pará que o negócio deslanchou, por uma conjunção de fatores, como animais mais baratos, grande oferta e logística de escoamento através do Porto do Conde, em Barcarena.
Venda de boi em pé representa 1% dos abates
Para Freitas, a formação de um polo exportador forte no Pará é possível, mas enfrenta dificuldades. “Estávamos muito confiantes em firmar um mercado de peso com a Venezuela porque com esse país nem precisamos de portos”, diz. Para o país vizinho, os animais são levados por rodovias. Com o Oriente Médio, a história é outra. “A tendência é de mantermos o mercado de 2011, mas o momento é de expectativa”, diz Freitas. No ano passado, o Oriente Médio comprou 83 mil animais, mas já chegou a importar do Brasil mais de 200 mil bovinos por ano. Para os pecuaristas, como esse mercado compra no segundo semestre, não é possível prever se haverá alguma retomada e como se comportará a cotação do dólar até lá. Para Alex Lopes da Silva, consultor da Scot Consultoria, os produtores podem ganhar dinheiro nesta safra, independentemente do cenário. “A tendência é de um dólar um pouco mais valorizado diante do real”, diz Lopes da Silva. “Assim, mesmo com a expectativa de preços menores em 2012, vai ser compensador para o pecuarista exportar gado.”
Embora a venda de gado vivo para o Exterior represente apenas 1% do volume total do abate brasileiro, que chegou a 44 milhões de cabeças, no ano passado, e seja concentrada no Pará, em fevereiro, a União Nacional da Indústria e Empresas de Carne (Uniec), formada por grandes grupos frigoríficos como o JBS, Mafrinorte e Frigol, pediu ao governo federal que crie um imposto de 30% para os animais exportados. A iniciativa da Uniec tem o apoio da Associação Brasileira da Indústria da Carne (Abiec) e da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo). “Para nós, não importa se é pouco ou muito o gado vivo exportado”, afirma Francisco Victer, presidente da Uniec.“Queremos isonomia. Se a carne exportada é tributada, que esse mercado também tenha um imposto específico.” No documento enviado à Câmara do Comércio Exterior (Camex), no MDIC, os frigoríficos alegam que a razão do pedido está na perda de matéria-prima que as indústrias vêm sofrendo para essa nova modalidade de negócio, principalmente na entressafra do boi. “É uma questão de mercado”, diz Victer. “A indústria agrega valor e a exportação de gado vivo, não.”