O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem atuado de forma contraditória com o que foi prometido durante a campanha eleitoral em relação à transparência. Respostas via Lei de Acesso à Informação (LAI) de pedidos feitos pelo Estadão não respeitam pareceres já divulgados pela Controladoria-Geral da União (CGU) e direcionamentos previstos na legislação. Uma das negativas foi do Ministério da Economia, que se recusou a compartilhar a lista de entradas e saídas do prédio da pasta durante os primeiros meses de 2023. O Ministério da Economia foi extinto por Lula, mas sua estrutura de gestão permanece, mesmo após a divisão entre as pastas da Fazenda, Gestão, Planejamento, Indústria e Povos Indígenas.

Para a Casa Civil da Presidência, a reportagem pediu acesso aos gastos das viagens nacionais e internacionais de Lula. Mas o pedido foi negado também.

Para justificar a negativa ao compartilhamento de dados sobre quem visitou o Ministério da Fazenda, a pasta afirmou que o conteúdo dos registros é “informação que gira em torno do conhecimento sobre informações pessoais” e que, para processar esses dados, teria um trabalho adicional. A decisão destoa do posicionamento de outros órgãos do governo, como Defesa, Turismo, Infraestrutura e Vice-Presidência, que enviaram os dados após receberem o mesmo pedido da Economia, por exemplo.

Nos últimos anos, a CGU emitiu diversos pareceres favoráveis à divulgação dos registros de entradas e saídas dos prédios públicos, afirmando que essas informações são públicas. Em fevereiro deste ano, o órgão reiterou a decisão.

A justificativa de trabalho adicional como negativa é amparada pelo artigo 13 da Lei de Acesso à Informação que define que não serão atendidas solicitações que exijam atividades a mais de análise, interpretação ou consolidação de dados. Entretanto, o mesmo artigo exige que, caso o órgão utilize dessa alegação, devem ser enviadas informações extras como a quantidade de horas necessárias para realizar o tratamento indicado. Na resposta ao pedido não foi enviado esse detalhamento.

No dia 29, o Estadão entrou com recurso para que a resposta do ministério fosse revista. O período de reavaliação foi finalizado na última terça-feira e a resposta foi uma nova negativa.

VIAGENS. Para a Casa Civil da Presidência da República, o Estadão pediu, por meio da LAI, acesso aos gastos das viagens nacionais e internacionais de Lula. Em resposta, o órgão afirmou que não poderia enviar essas informações devido, principalmente, ao artigo 24 da Lei de Acesso à Informação que define que “as informações que puderem colocar em risco a segurança do Presidente e Vice-Presidente da República e respectivos cônjuges e filhos(as) serão classificadas como reservadas e ficarão sob sigilo até o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso de reeleição”.

Entretanto, os gastos com viagens oficiais exigem prestação de contas, conforme a LAI, já que se utiliza de recursos oriundos de cofres públicos. No governo de Jair Bolsonaro, marcado por negar o acesso a centenas de informações públicas, os gastos com viagens eram divulgados, ao longo do mandato, pela Secretaria-Geral da Presidência.

REGRA CONSOLIDADA. Diretora de programas da organização Transparência Brasil, Marina Atoji avalia que a negativa em divulgar informações cujo acesso é garantido pela LAI evidencia dificuldades do governo em cumprir uma regra já consolidada. “Esse descompasso deixa a impressão de que a lei não está funcionando, seja por essa falta de padronização de entendimentos, seja pela negativa a dados básicos.”

Em nota, o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas lembrou a publicação da CGU deste ano. “Exceção é reservada a informações pessoais sensíveis, como dados de visitantes de órgãos de defesa de direitos humanos ou hospitais.”

Cofundador da agência de dados especializada no acesso à informação Fiquem Sabendo, Bruno Morassutti defende um posicionamento mais enfático de Lula. “É importante que o presidente, na posição de chefe do Executivo, reitere a importância da transparência pública e tome as medidas para fazer com que as decisões antigas, contrárias ao acesso à informação, sejam revertidas, e, naqueles casos de órgãos que insistem em negar acesso à informação, punir esses agentes públicos”, disse.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.