02/09/2022 - 11:04
Uma das principais referências em saúde da mulher na América Latina, o Hospital Pérola Byington vai inaugurar um prédio nos Campos Elíseos, no centro de São Paulo, ainda na 1ª quinzena de setembro. Além do aumento de leitos, a unidade terá inovações, entre elas, um robô para separar e destinar remédios para os andares do edifício na hora certa.
A tecnologia contrasta com as turbulências do entorno. Além da dispersão dos usuários de drogas na Cracolândia do centro da capital nos últimos meses, seguida de sucessivas operações policiais contra o tráfico, moradores protestam contra as desapropriações que levaram à construção do centro médico e relatam dificuldades para atender às exigências da Prefeitura para continuar morando lá.
Até o dia 15, o governo espera iniciar a mudança do ambulatório do hospital. Com 50 mil m² a mais que o endereço da Bela Vista, o novo Pérola pretende ampliar o atendimento para as mulheres, segundo Eduardo Ribeiro, secretário executivo da Saúde do Estado de São Paulo. Os leitos vão passar de 128 para 300, com dez de UTI. Só na oncologia, a capacidade de atendimento vai aumentar 66%. O hospital vai manter o foco nas três especialidades em que se destaca: oncologia, reprodução e vítimas de violência sexual, com setores específicos para cada público.
O hospital também terá novidades tecnológicas. Uma delas é a farmácia robótica. Um braço mecanizado separa os medicamentos que são levados por uma cápsula pneumática até o andar da internação. “Num hospital normal, desde a prescrição médica até a entrega, o tempo é de 20 minutos. No nosso, esse processo levará três minutos”, explica Susana Cabarcos Pawletta, diretora-presidente da Inova Saúde, parceira privada do governo de São Paulo no modelo de gestão PPP (Parceria Público Privada) e especializada na administração e gestão hospitalar.
O atendimento médico será gerido por uma organização social, o Serviço Social da Construção Civil do Estado de São Paulo (Seconci-SP).
A construção do hospital, que ocupa um quarteirão inteiro entre a Avenida Rio Branco, a Alameda Barão de Piracicaba, a Rua Helvétia e a Alameda Glete e orçada em R$ 245 milhões, foi alvo de críticas. Em 2013, o então governador Geraldo Alckmin (na época no PSDB e hoje no PSB) editou decreto que declarou a área como “utilidade pública” e, com isso, permitiu desapropriações de imóveis. Foram removidas cerca de 160 famílias.
Cinco anos depois, o quarteirão conhecido como quadra 36 foi demolido para erguer o hospital. O Ministério Público de São Paulo e a Defensoria Pública alegam que as desapropriações eram irregulares, pois o poder estadual não teria oferecido alternativas. O juiz de 1ª instância negou o pedido. O processo está no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em agosto deste ano, famílias removidas das quadras 37 e 38 foram chamadas a se apresentar à PPP Habitacional, parceria criada para gerenciar a produção das moradias no local. Representantes dos moradores afirmam ter dez dias para entregar Imposto de Renda, carteira de trabalho, comprovante de pagamento do INSS, licença para exercício da profissão, entre outros documentos. Eles argumentam que o prazo é curto para quem vive, em sua maioria, na informalidade. Na quadra 48, exatamente ao lado do hospital, moradores reclamam que fizeram as modificações exigidas pela Prefeitura, mas, mesmo assim, tiveram seus imóveis interditados.
A soma dessas insatisfações resultou em um protesto em frente à Prefeitura nesta semana, que reuniu 300 famílias, conforme os organizadores. “O hospital é um grande avanço para a cidade, mas tem sido usado como justificativa para legitimar um processo de substituição do perfil populacional na região”, diz o advogado Giordano Magri, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Universidade de Groningen.
O novo hospital fica em frente à Praça Princesa Isabel. O local passou a concentrar no mês de março usuários e traficantes de drogas da Cracolândia, depois que o fluxo deixou a Praça Júlio Prestes. Uma série de operações da Polícia Civil e da Guarda Civil Metropolitana (GCM) expulsou os usuários e as pessoas em situação de rua da praça.
Em junho, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) sancionou um projeto de lei, aprovado pela Câmara Municipal, que prevê transformar a Praça Princesa Isabel em parque. Hoje, a praça está cercada por gradis. A partir daí, a Cracolândia se dispersou por vários pontos da região central da cidade. No entorno do hospital, ainda são vistos dependentes químicos.
Alexis Vargas, secretário executivo de Projetos Estratégicos do município, afirma que o hospital está dentro do contexto de revitalização da região. “O hospital está inserido na estratégia de revitalização. Para enfrentar um problema sério e antigo como o da Cracolândia, atuamos em várias frentes, como atendimento aos usuários de substâncias químicas, combate ao tráfico e revitalização urbana. Essa requalificação tem relação com novos usos e frequências, como a construção de vagas de habitação de interesse social e a transformação da praça em parque. Vamos ocupar o espaço com um novo uso”, afirma.
A entrega do hospital foi marcada por atrasos. O anúncio de que o hospital funcionaria na região da Cracolândia foi feito pelo governo em 2013. No ano seguinte, a PPP para construção da unidade foi contratada. Na época, a meta era entregar o hospital em até três anos. Por causa da disputa judicial pelas desapropriações, as obras só foram iniciadas em 2019. A nova previsão era concluir a obra no ano passado, mas a entrega ficou para setembro deste ano.
O que diz a Prefeitura
A Prefeitura de São Paulo, por meio da Guarda Civil Metropolitana, afirma realizar o policiamento comunitário e preventivo na região da Nova Luz 24 horas por dia, por meio de rondas periódicas em todo o território, incluindo pontos turísticos da região, com efetivo de 80 agentes e 20 viaturas.
No 1º semestre, a Guarda Civil Metropolitana (GCM) atendeu 180 ocorrências no território da Nova Luz, sendo 80 delas relacionadas a drogas. Nesse mesmo período, 220 pessoas foram conduzidas ao Distrito Policial e 175 ficaram detidas. A GCM apreendeu aproximadamente 9,5 quilos de entorpecentes (cocaína, maconha e crack) e mais de R$ 44 mil reais em dinheiro.
A Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos do Programa Redenção destaca ainda o resultado das ações integradas, que têm ampliado o atendimento dos dependentes químicos e redução do fluxo de pessoas consumindo drogas nas ruas. O encaminhamento de usuários para atendimento no Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (SIAT II) aumentou aproximadamente cinco vezes entre janeiro e julho, segundo a Secretaria Municipal da Saúde.
Já o encaminhamento para equipamentos da rede socioassistencial cresceu em 8,2%, passando de 789 pessoas em janeiro para 854 em julho. O total de atendidos no CAPS IV, na Praça Princesa Isabel, aumentou 29,4% de janeiro a julho. Foram 453 pacientes no primeiro mês do ano, e 586 pacientes em julho.