31/01/2025 - 17:55
A venda de produtos preparados com “sabor café”, mas que não são café, tem preocupado a indústria brasileira no momento em que o pó do grão torrado e moído verdadeiro é comercializado a preços altos nos supermercados, na esteira de recordes das cotações no mercado global.
O chamado “café fake” ou “cafake” é uma “clara e evidente tentativa de burlar e enganar o consumidor”, disse o diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), Celírio Inácio da Silva, em entrevista à Reuters.
Recentemente, a Abic identificou a venda do pó com sabor café, que pode ser produzido a partir de cascas, palha, folhas, paus ou qualquer parte da planta exceto a semente do café, em Bauru, no interior de São Paulo.
Um produto denominado Oficial do Brasil traz em sua embalagem os dizeres “bebida sabor café tradicional”.
Segundo Silva, embora possa haver indicação de que o produto não é o café torrado e moído, há o risco de o consumidor ser enganado, já que a embalagem é muito semelhante, além de o custo ser menor.
O café arábica negociado na bolsa de Nova York renovou uma máxima histórica nesta sexta-feira, batendo 3,8105 dólares por libra-peso, com o mercado internacional precificando uma frustração de safra no Brasil, maior produtor e exportador global, entre outros fatores.
Desde o ano passado, a indústria está repassando os custos da matéria-prima aos consumidores.
A alta dos preços é terreno fértil para a comercialização de tais produtos “fakes”, disse o diretor-executivo da Abic.
“Estamos passando por um momento de muita tensão, o café cru, base do torrado e moído, até na geada de 1979 não achei preços tão elevados. Quando isso acontece faz com que a matéria-prima fique cada vez mais disputada e os industriais que adquirem a matéria-prima com esses preços vão repassar esses preços”, disse Silva.
Neste contexto, a entidade está preocupada com aqueles que podem “surfar nesta onda (do fake) e dizer: ‘vou inventar um produto'”.
A entidade ressaltou que já denunciou o caso ao Ministério da Agricultura e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), porque há preocupação com a saúde dos consumidores, além da questão mercadológica.
“É preciso ter autorização da Anvisa, tem que comprovar a segurança alimentar”, afirmou ele, acrescentando que a Abic já alertou o setor supermercadista que tal produto não deve existir.
“O supermercadista é corresponsável pelo produto que vende, com essa possibilidade de oferecer produtos mais baratos ao consumidor, ele pode estar cometendo um crime.”
Segundo a coluna Café na Prensa, publicada nesta sexta-feira pelo jornal Folha de S.Paulo, meio quilo do produto “sabor café” tem sido vendido em supermercados por 13,99 reais, valor muito inferior à média atual do café tradicional no varejo, que sai por cerca de 30 reais.
A Reuters procurou a fabricante do Oficial do Brasil, a Master Blends, com sede em Salto de Pirapora (SP), mas não obteve um retorno.
Essa não é a primeira vez que a Abic identifica o chamado “cafake” no mercado. No entanto, os levantamentos da entidade não registravam o pó com sabor café no mercado desde 2022, segundo o executivo da associação.
O dirigente lembrou ainda que a comercialização desse produtos com sabor café vai na direção contrária de iniciativas da entidade, que no passado lançou um selo de pureza para evitar a venda de grãos moídos misturados com milho torrado, por exemplo.
“O Brasil mostrou que café não é tudo igual, tirando esse ranço de que nós não bebemos bons cafés… Se não combatermos isso, as pessoas vão começar a beber este ‘café’ e dizer que não gostam… elas podem diminuir o consumo.”