15/05/2022 - 10:00
O que começou com a adoção de uma escola estadual paulista por um empresário hoje é uma das provas de que a sociedade civil organizada tem papel fundamental na educação pública. A ONG Parceiros da Educação completa 18 anos com apoio a 260 mil alunos no Estado e uma forte atuação durante a pandemia, com fornecimento de materiais didáticos, formação de professores e tablets. O resultado de uma análise de impacto feita por uma empresa externa mostra que a cada R$ 1 investido pela ONG em escolas públicas, R$ 3,80 são gerados para a sociedade.
A entidade passou em 2020 a atuar não apenas em escolas pontuais, mas apoiando duas diretorias de ensino na região sul da capital paulista. Apesar das dificuldades durante a pandemia, elas melhoraram mais que o restante da rede. A região chamada de sul 1, onde fica Campo Limpo, Pedreira e Jabaquara, passou da 88.ª posição no ranking de aprendizagem do ensino médio em São Paulo para 27.ª, entre 2019 e 2021. Já a sul 2, que inclui Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luís, bairros pobres da capital, subiu 45 posições, da 79.ª para a 34.ª. “Com a sociedade civil é mais fácil transformar a educação”, diz o fundador e presidente da Parceiros da Educação, Jair Ribeiro, que fez carreira na área financeira em bancos como Patrimônio, JP Morgan e Chase Manhattan Brasil.
Ribeiro estava em um período sabático quando, em 2004, a adoção de uma escola em Paraisópolis por um outro empresário o inspirou para criar uma ONG com foco em educação. “Cheguei à conclusão de que o melhor caminho era potencializar o investimento público e não replicá-lo. Era algo mais escalável, como acabou acontecendo mesmo”, conta. A primeira parceria que Ribeiro fechou foi com a Escola Estadual Luís Gonzaga Travassos da Rosa, também em Paraisópolis. Em seguida, ele mobilizou outros empresários como Ana Maria Diniz, hoje ainda conselheira da ONG e fundadora do Instituto Península, e Fernão Bracher, ex-presidente do Banco Itaú e do Banco Central, que morreu em 2019.
Atualmente, a Parceiros da Educação está presente em cerca de 600 escolas. Tem mais de 90 parceiros entre institutos, fundações, empresas e empresários, como Olavo Setúbal Júnior, Pedro Wongtschowski, Roberto Klabin, que a apoiam como pessoa física. Durante a pandemia, diz o atual diretor-geral Rafael Machiaverni, o impacto chegou a 7,5 milhões de estudantes por meio de um material focado em Português e Matemática que foi aproveitado por várias redes de ensino do País. As atividades, criadas pela ONG inicialmente para a rede de São Paulo com o nome de Aprender Sempre, ajudam a recuperar aprendizagens perdidas durante o período de escolas fechadas e ensino remoto.
“Foi o principal material usado durante a pandemia pelos professores e alunos e continua sendo, ele desenvolve as principais habilidades e potencializa o desenvolvimento de outras competências”, diz a secretária estadual de Educação de São Paulo, Renilda Peres de Lima, que assumiu o cargo no mês passado quando Rossieli Soares decidiu se candidatar a deputado federal.
Ela diz ser essencial a parceria com a sociedade civil, não para dizer ao Estado o que fazer, mas no apoio à formação de professores, gestão e materiais didáticos, que vão sendo internalizados pela rede. “Estamos no século 21, não dá pra ficar inventando a roda, tem que aproveitar as ideias que existem e trazer para a realidade da escola pública”, afirma.
ALUNOS PERDIDOS. Nas diretorias de ensino sul 1 e sul 2, onde há 184 mil estudantes e 182 escolas, a ONG organizou planejamentos estratégicos e formações para professores para melhorar a prática na sala de aula e também para ajudar na busca ativa dos alunos que se evadiram durante a pandemia. Esse projeto tem o apoio também de Fundação Lemann, Itaú Social e Movimento Bem Maior. A diretora da Escola Estadual Vicente Rao, Guiomar Costa Franco, conta que aprendeu em cursos da Parceiros como ser mais incisiva para ir atrás dos alunos que sumiram nos últimos dois anos. Usou carro de som, bateu nas portas e conseguiu trazer de volta muitos deles. O colégio fica dentro da comunidade pobre de Americanópolis e trabalha há anos com parcerias. “Temos muito ainda que avançar, está longe do que eu sonho para a escola, mas já melhoramos muito com esse tipo de apoio.”
Segundo um estudo contratado pela Parceiros da Educação, o impacto também acontece em forma de benefícios monetários para sociedade. O cálculo foi feito pela IDIS, uma consultoria que mede as ações de organizações sociais. A CEO Paula Fabiani explica que são feitas entrevistas com os envolvidos no projeto, como gestores, estudantes, professores, para entender a percepção das mudanças que o investimento trouxe. Os resultados do IDEB, índice nacional que mede a qualidade da educação básica, também são incluídos no cálculo de impacto.
Depois disso, são feitas proxis financeiras para aproximar e estimar o valor do benefício. Paula diz que, no caso da educação, a formação de professores feita pela ONG pode ser comparada com cursos oferecidos no mercado, por exemplo. Vem daí a estimativa de que a cada R$ 1 investido pela ONG, R$ 3,8 são gerados para a sociedade. Esse valor foi o estimado para o projeto de adoção de escolas. Quando há parcerias com uma rede municipal inteira, outra frente de trabalho da ONG, o retorno chega a ser de R$ 7,17.
O trabalho em diretorias de ensino não foi medido ainda por ser recente, mas Ribeiro e Machiaverni acreditam que teria impacto semelhante ao da rede. “O projeto tem mais escala e é mais sustentável. Numa escola sozinha, se muda a equipe todo o trabalho pode ser perdido”, diz Machiaverni.
A Parceiros da Educação é uma das muitas organizações da sociedade civil que passaram, nos últimos anos, a apoiar redes estaduais e municipais de educação no País, o que ajudou numa melhora significativa da qualidade em muitos Estados e cidades. Durante a pandemia, essas parcerias foram mais uma vez cruciais, já que não houve apoio do Ministério da Educação. O modelo não inclui transferência de recursos, apenas suporte e criação de novos programas. Apesar de São Paulo ter no governo o mesmo partido há mais de 20 anos, não houve continuidade nas políticas de educação. Por isso, o Estado acabou não tendo resultados tão expressivos como muitos do Nordeste, como Ceará e Pernambuco. Mas, segundo Ribeiro, nos últimos anos isso mudou e a ONG pôde aumentar sua atuação.
“Estou bastante otimista com o futuro da educação paulista. A secretaria, com apoio da sociedade civil, fez reformas importantes”, diz Ribeiro, mencionando ainda o apoio da ONG para programas de escolas em tempo integral, que aumentaram muito no Estado nos últimos anos. “Precisamos agora dar continuidade a esses programas, sempre melhorando a execução.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.