Em meio a uma das mais sérias crises do setor sucroenergético brasileiro já registradas desde julho de 1979, ano em que a Fiat colocou no mercado o primeiro veículo movido a etanol do País, o Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES) está incentivando o mercado a tomar linhas de financiamentos específicas para a produção do combustível.  Para o banco de fomento, a despeito das dificuldades atuais, há saídas para as usinas de cana-de-açúcar que estão refazendo suas metas futuras e apostando em tecnologias que lhes tragam competividade. Uma delas é a do etanol celulósico, ou etanol de segunda geração (2G), obtido através do processamento do bagaço e da palha da cana.


SUPORTE FINANCEIRO: de acordo com Artur Yabe Milanez, do BNDES, há  linhas específicas do banco que atendem a indústria do etanol 2G

De acordo com Artur Yabe Milanez, gerente do Departamento de Biocombustíveis do BNDES, a instituição quer incrementar sua carteira através de suas linhas tradicionais de crédito, como foi o Programa de Apoio de Inovação ao Setor Sucroenergético e Sucroquímico (Paiss). “Dependendo da maturidade do projeto, o processo de tomada de crédito pode levar até sete meses”, afima Milanez. Sem um teto máximo de crédito, cada projeto tem um prazo de pagamento de até 12 anos e Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) anual de 6%, índice recentemente ajustado em um ponto percentual para cima pelo Conselho Monetário Nacional, em relação a 2014. Desde que o Paiss foi criado, em 2011, o banco já liberou um total de R$ 3,5 bilhões em recursos para o etanol celulósico e demais projetos industriais e químicos baseados em biomassa da cana.

A crença do BNDES, de que o etanol 2G tem futuro está baseada em estudos próprios, como um minucioso levantamento de custos finalizado em março. Até 2030, produzir um litro do biocombustível custará R$ 0,53, ou 64,5% a menos do que os atuais R$ 1,47 ou, ainda, 30,7% a menos  do que custará o etanol de primeira geração na mesma época. “No longo prazo, o etanol brasileiro pode muito bem competir com a gasolina, internacionalmente, mesmo que o preço do petróleo fique em valores abaixo de US$ 40 por barril”, diz Milanez.


Pioneira:a fábrica da GranBio foi a primeira do País a produzir o etanol 2G no interior de Alagoas. Os planos são abrir mais dez iguais a essa

O papel do BNDES em ofertar crédito, antes de tudo, reflete a atual mudança de postura do governo federal ante a indiferença com a qual vinha tratando o setor nos últimos anos. A razão é uma só: o temor de que venha a faltar combustível no mercado. No mês passado, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, apresentou em audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, em Brasília, um quadro da situação dos setores de energia e mineração, dedicando parte de sua exposição ao chamado desafio do ciclo Otto, uma referência às fontes de combustível baseadas na gasolina e no etanol. Até 2023, está previsto um déficit de 26 bilhões de litros na oferta interna de gasolina e de etanol, frente à necessidade prevista de 85 bilhões de litros. “Por isso, estamos abertos a discutir todas as possibilidades de políticas para o setor bioenergético”, disse Braga, em sua intervenção.  Segundo o estudo, com o atual parque de usinas, a oferta de etanol deve ser de 30 bilhões de litros, em 2023, ante a previsão de 48 bilhões de litros apresentada pelo Plano Decenal de Expansão de Energia 2023 (PDE 2023). Para o ministro, os principais desafios do setor serão investir em novas usinas e desenvolver comercialmente o etanol 2G. O pacote de créditos de R$ 1,5 bilhão para investimentos em inovação, criado no ano passado, vigora até 2018.


Incentivo:segundo Braga, ministro de Minas e Energia, o governo passa a apoiar políticas para o setor bioenergético

Nos últimos anos, algumas empresas têm se beneficiado dos pacotes de fomento para o etanol 2G. Entre elas estão a espanhola Abengoa Bioenergia, o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), a GranBio e a Raízen, que no ano passado foi um dos destaques no ranking AS 500 MAIORES DA DINHEIRO RURAL. Elas foram as pioneiras ao tomar empréstimos que somaram de R$ 1 bilhão da carteira do BNDES para a construção de unidades de etanol 2G e devem continuar a demandar por crédito. No caso da GranBio, controlada  pela família do empresário  baiano Bernardo Gradin, R$ 300 milhões foram aprovados pelo banco nos últimos anos, dos cerca de R$ 345 milhões investidos na fábrica construída no município de São Miguel dos Campos, em Alagoas,  com capacidade de 82 milhões de litros de etanol 2G por ano. Para o economista Alan Hiltner, vice-presidente de novos negócios da GranBio, o crédito do BNDES foi fundamental até agora. “Nosso programa de investimento tem como base o fomento à inovação, por isso conseguimos condições de créditos atrativas”, diz Hiltner. “E esperamos continuar com o apoio do BNDES.”


Aposta ambiciosa:até 2025, a GranBio quer produzir 1 bilhão de litros de etanol 2G, diz o vice-presidente Hiltner

O plano da GranBio é audacioso. Até 2025, a companhia quer produzir um bilhão de litros de etanol 2G, com a construção de mais dez fábricas. Esse volume representa cinco vezes a atual capacidade brasileira, de 200 milhões de litros do biocombus­tível. De acordo com Milanez, a política do BNDES para as empresas que estão investindo no etanol 2G é similar à do governo americano. “Nos Estados Unidos, os projetos em andamento servem como referência para o governo”, diz Milanez. “A ideia é de que os projetos do BNDES também sejam referência para que o governo federal dissemine cada vez mais a tecnologia de segunda geração do etanol.”