O bloqueio de mais de R$ 475 milhões de recursos das universidades, institutos, centros de educação tecnológica e colégios federais imposto pelo governo Jair Bolsonaro ao Ministério da Educação (MEC) deve impactar o pagamento de despesas de custeio em um ano de orçamento reduzido. Em comunicados divulgados desde a quarta-feira, 5, instituições afetadas falam em retenção de recursos não empenhados para manter os auxílios estudantis e possíveis suspensões no pagamento de contratos terceirizados e de despesas básicas, como de internet, e até em risco de suspensão de atividades.

Os reitores e pró-reitores dizem que não há mais no que cortar custos, visto que o orçamento já sofreu dois cortes ao longo do ano. A situação motivou uma nova reunião entre representantes das universidades federais na manhã desta quinta-feira, 6, que se manifestarão depois por meio da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). Desde 2015, as instituições vêm enfrentando cortes e bloqueios orçamentários.

Procurado pelo Estadão, o MEC afirmou ter realizado “os estornos necessários nos limites de modo a atender ao decreto, que corresponde a 5,8% das despesas discricionárias de cada unidade”. “Segundo informações do Ministério da Economia, consoante ao que também determina o próprio decreto, informamos que os limites serão restabelecidos em dezembro”, disse.

“Esse cenário anuncia o sucateamento dos serviços prestados pela universidade e a proximidade de paralisação das suas atividades”, afirmou o reitor da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Demetrius David da Silva, em comunicado veiculado pela instituição. Segundo ele, há um “agravamento inimaginável da realidade orçamentária” e “todas as adaptações necessárias e possíveis já foram realizadas”.

Sem acessar R$ 1,7 milhão, a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) decidiu bloquear metade dos recursos que restaram para garantir o pagamento de auxílios a estudantes e a manutenção de contratos de energia, segurança, vigilância e limpeza. “Inviabiliza qualquer forma de planejamento institucional, incluindo ações, atividades e serviços já previstos, além de comprometer seriamente o funcionamento das instituições”, destacou em comunicado a reitora, Aldenize Ruela Xavier.

Serviços essenciais

O Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) destacou que o bloqueio de R$ 147 milhões dos institutos federais (IFs), dos centros federais de educação tecnológica (os Cefets) e do Colégio Pedro II, do Rio, vai afetar serviços essenciais de limpeza e segurança. “Transporte, alimentação, internet, chip de celular, bolsas de estudo, dentre outros tantos elementos essenciais para o aluno não poderão mais ser custeados”, apontou.

“Serviços essenciais de limpeza e segurança serão descontinuados, comprometendo ainda as atividades laboratoriais e de campo, culminando no desemprego e na precarização dos projetos educacionais”, completou, em nota. “É necessária e urgente a recomposição orçamentária, sob pena da rede federal ter seu funcionamento comprometido.”

No site institucional, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) diz ter sofrido um bloqueio de R$ 17,8 milhões, que pode afetar o pagamento de fornecedores e todo o funcionamento da instituição. “Se o bloqueio não for revertido, não teremos como continuar funcionando neste ano”, disse, em comunicado, o pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças, Eduardo Raupp.

Segundo a instituição, o bloqueio corresponde a 5,84% da dotação orçamentária de 2022 e em um “momento crítico”, após abrir o ano com um “orçamento já manco”. “Com esse último contingenciamento, não vai ser possível empenhar as despesas de setembro, nem parte das de outubro, o que antecipa os riscos de interrupção de serviços”, acrescentou o pró-reitor, que classificou a situação como “dramática”.

Situação semelhante foi apontada pelo reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Paulo Vargas, em comunicado publicado no site da instituição. “Novo contingenciamento traz preocupação a todas as universidades, que ficam sob risco de não conseguir fazer face a todas as despesas.”

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSUL) divulgou ter sofrido um bloqueio de R$ 2,2 milhões, totalizando R$ 6,3 milhões se somado aos cortes sofridos ao longo do ano, o que representa 13% do orçamento inicialmente previsto. Segundo a instituição, os cortes afetarão a assistência estudantil, a oferta de bolsas em projetos de ensino, pesquisa e extensão, além de visitas técnicas, estágios e serviços terceirizados.

“Não será possível fecharmos as contas de manutenção do IFSul até o final de 2022, mesmo diante da redução de gastos, que já vem ocorrendo ao longo dos últimos anos de forma significativa em todas as nossas unidades, com enxugamento de despesas”, destacou o reitor, Flávio Luis Barbosa Nunes, em comunicado. Ele afirmou ainda que a instituição tem buscado manter a qualidade do ensino, o que “se torna cada vez mais difícil, quase impossível, diante do quadro que passamos a viver com os cortes efetivados”.

Também nesta quinta, a Universidade Federal de São Carlos (UFScar) emitiu um comunicado da reitoria, no qual descreve a situação como “crítica” e aponta que o bloqueio é de mais de R$ 2 milhões. O pagamento de bolsas de assistência e permanência estudantil e o funcionamento do restaurante universitário estão garantidos até janeiro, porém “demais despesas, como energia e esgoto, terão que ser negociadas com as empresa”, segundo a fala da pró-reitora de Administração, Edna Augusto, reproduzida em comunicado.

A instituição apontou que será necessário remanejar recursos, como os da área de investimentos para a de custeio. O comunicado destaca que a instituição reduziu contratos e serviços, como de manutenção predial e do sistema de ar condicionado, por exemplo, modificou o modelo de limpeza dos espaços e diminuiu o custeio de viagens didáticas e inscrições em congressos.

Congelamento

Na quarta-feira, a Andifes já havia publicado uma nota em q emitiu um comunicado da reitoria, no qual descreve a situação como “crítica” e aponta que o bloqueio é de mais de R$ 2 milhões. O pagamento de bolsas de assistência e permanência estudantil e o funcionamento do restaurante universitário estão garantidos até janeiro, porém “demais despesas, como energia e esgoto, terão que ser negociadas com as empresa”, segundo a pró-reitora de Administração, Edna Augusto, reproduzida em comunicado.

Segundo a entidade, a União “congelou” R$ 328,5 milhões em despesas das universidades. Esse valor, somado ao montante que já havia sido cortado ao longo do ano, totaliza R$ 763 milhões retirados do orçamento aprovado para este ano.

“Este novo contingenciamento coloca em risco todo o sistema das universidades”, diz. A associação lamentou o corte “quase ao final do exercício, que afetará despesas já comprometidas, e que, em muitos casos, deverão ser revertidas, com gravíssimas consequências e desdobramentos jurídicos para as universidades federais”.

Como o Estadão noticiou, a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado estima que o contingenciamento no MEC é de cerca de R$ 3 bilhões, tornando a Educação a área mais penalizada pelos bloqueios de recursos em 2022 para o cumprimento do teto de gastos, regra que atrela o crescimento das despesas à inflação.