22/06/2020 - 10:30
A taxa de juro real próxima de zero no Brasil poderá trazer uma mudança inédita para as empresas brasileiras. Pela primeira vez na história se vislumbra a possibilidade de o mercado de capitais brasileiro emergir como melhor opção para a composição de caixa e investimento pelas companhias, deixando de lado o tradicional crédito bancário, que sempre foi a primeira ou única alternativa.
Com o apetite crescente de investidores por ativos de maior risco para manter rentabilidade em suas carteiras – a despeito da pandemia e da crise política no Brasil – a porta de captação se abriu para as empresas em um momento em que um grande número delas precisa de dinheiro para atravessar a crise que eclodiu junto à covid-19 e viram a torneira se fechar no crédito bancário, com restrições previstas por pelo menos 12 meses, na projeção de especialistas.
Com isso, a expectativa é que o mercado brasileiro se aproxime de condições notadas há décadas em outras economias, nunca possíveis por aqui pelo histórico de juros altos permitindo que títulos sem risco – tal qual os papéis do tesouro – ganhassem quase todo o espaço das carteiras de investimentos. Agora o jogo mudou: papéis de mais risco como ações, debêntures incentivadas e até entre ativos alternativos, como private equity, começam a fazer parte dos portfólios, com investidores ávidos por diversificação e o esperado aumento de retorno.
Até aqui, o volume de novas operações ainda é tímido, já que são grandes ainda as dúvidas sobre qual será o novo normal da economia e o tamanho do estrago trazido pela covid-19. No entanto, elas começam a acelerar. Empresas já captaram quase R$ 8 bilhões na Bolsa em meio à pandemia. Apenas a Via Varejo fez uma oferta de R$ 4,4 bilhões. Isso deixa claro que, desde o ano passado, os investidores estão se habituando a novas opções de investimento e o atual nível de taxa de juro promete empurrar um contingente ainda maior de interessados na diversificação. Outras empresas, com dificuldade de acessar o crédito bancário, são aguardadas para realizarem operações no mercado.
O presidente da B3, Gilson Finkelsztain, disse em um podcast do Itaú BBA, que as taxas de juros cada vez mais baixas estão induzindo a diversificação de ativos nas carteiras. O executivo comentou que essa ida para o mercado de renda variável não significa que houve uma migração da renda fixa – classe que também vem batendo recorde de entrada de novos investidores – mas por conta exatamente da diversificação dos portfólios. “Investidores estão com uma cabeça diferente, buscando novas oportunidades, olhando longo prazo”, diz. O número de investidores pessoas físicas na base da B3 não para de crescer e atingiu em maio 2,5 milhões, novo recorde.