28/02/2021 - 19:17
Moradores e frequentadores participaram na tarde deste domingo, 28, de um ato contra o cercamento da Praça Coronel Custódio Fernandes Pinheiro, mais conhecida como Praça Pôr do Sol, no Alto de Pinheiros, zona oeste da cidade de São Paulo. O “abraçaço” foi motivado pela instalação de alambrado, com custo de R$ 652,9 mil para a Prefeitura, em todo o entorno do espaço.
O ato foi organizado por um coletivo de cerca de 150 moradores e frequentadores da praça, organizados pelas redes sociais e que usam a hashtag #PorDoSolSemCerca.
O grupo quer reverter a decisão da gestão Bruno Covas (PSDB), que atendeu a pedidos da Associação Amigos do Alto de Pinheiros (SAAP) e da Associação de Moradores de City Boaçava, e defende que a discussão deveria ter embasamento técnico e ouvir a população por meio de audiências públicas.
Por causa da pandemia da covid-19, o grupo se organizou para que todos os participantes mantivessem dois metros de distância, utilizassem máscaras de proteção, enquanto seguravam um grande barbante que simbolizava a conexão entre as pessoas.
Segundo a gestão Bruno Covas, a iniciativa tem o objetivo de permitir “o controle de pessoas para não causar aglomeração” durante a pandemia da covid-19 e facilitar a “conservação do local, que contém características de parque e recebe grande quantidade de frequentadores”. Além disso, a Prefeitura alega ter atendido “às solicitações de moradores da região”. Questionada, não respondeu sobre as reivindicações de realizar audiências públicas sobre o destino do espaço.
A obra é realizada por uma empresa privada, contratada pela Subprefeitura de Pinheiros. O alambrado substitui um cercamento provisório com tapumes, colocado em abril do ano passado após o registro de aglomerações e que teve o custo de R$ 800 mil.
Os horários de funcionamento e a capacidade máxima de ocupação estão em fase de estudos.”Foram instalados alambrados em vez de grades, por ser mais econômico”, acrescentou a Prefeitura, por meio de nota.
Com 28 mil metros quadrados, a praça atrai também moradores de outras regiões e turistas, especialmente pelo pôr do sol. A área verde teria se formado durante o loteamento da Cia City na região, mas foi nos anos 70 que ganhou o projeto das urbanistas Miranda Martinelli Magnoli e Rosa Kliass.
Rosa é um dos maiores nomes do paisagismo no País, também por trás dos projetos da Praça Benedito Calixto, em Pinheiros, do antigo Vale do Anhangabaú, no centro, e do Parque da Juventude, no Carandiru, zona norte, dentre outros. Um dos principais elementos adicionados pelas urbanistas na praça foi, a partir do aproveitamento da topografia do local, uma espécie de arquibancada voltada para o lado do pôr do sol.
Defensora do gradeamento, a SAAP destaca que o cercamento é uma demanda de parte dos moradores desde 2014. Segundo a associação, o aumento de frequentadores trouxe mais lixo, barulho e o consumo de bebidas e drogas durante a noite.
Já o coletivo contrário ao cercamento defende que o espaço siga aberto, com a instalação de mais lixeiras, intensificação dos serviços de limpeza e coleta de lixo, garantia do cumprimento do Programa Silêncio Urbano (PSIU), melhora na iluminação, obras de acessibilidade e, ainda, a disponibilização de agentes de trânsito para organizar os engarrafamentos e evitar o estacionamento irregular.
Integrante do coletivo, a economista Juliana Leal, de 30 anos, é moradora do entorno desde 1995. “Defendo que os cidadãos devem ter direito à cidade, direito ao lazer, à cultura, saúde, educação. Para mim, o cercamento de um espaço público é muito simbólico no sentido que você está privando o direito das pessoas de ter isso, em vez de tentar outro tipo de solução”, defende. Como sou frequentadora há muito tempo, eu sei que tem problemas, de grande quantidade de pessoas, lixo, barulho”, comenta.
Para ela, o cercamento não “vai resolver nada” e que a melhoria das condições passa por melhorias na zeladoria e na iluminação, instalação de banheiros, vigilância e outras medidas.
Ela critica, ainda, que a gestão municipal tratou a demanda do cercamento como se fosse de uma “ampla maioria de moradores”, o que discorda. “Essas coisas devem ser consultadas, é uma praça muito grande, que atrai muita gente”, destaca. “Aquela praça é um organismo vivo. Meus pais iam lá quando namoravam, eu ia lá quando namorava o meu marido, sempre estando ali, vivenciando com amigos, com música, sempre foi uma coisa muito viva.”
Frequentador da praça desde os anos 80, o cineasta Mauricio Faria, de 56 anos, acredita que os moradores que defendem a obra estão “iludidos” e que o cercamento vai trazer mais problemas, especialmente em relação à sensação de segurança. “É um achismo das associações, e a prefeitura fez uma licitação de quase R$ 700 mil baseada nesses achismos.”
Ele também critica não ter sido apresentado um estudo técnico que comprove que o gradeamento trará benefícios para a região. “É uma licitação cara, ruim, baseada na vontade de moradores iludidos”, alega. “A Prefeitura foge do problema. A solução é muito mais complexa que uma cerca. Quando se cerca se cria um local, vazio, ermo, ainda mais à noite”, comenta. “Tradicionalmente, a praça é um lugar turístico,um ponto de encontro da juventude. É muito difícil mudar o perfil, e não vejo motivo para isso. Sem essa juventude ocupando aquele espaço, pode vir coisa pior.”
Para o cineasta, o destino da praça deveria ser debatido pela população em geral, e não apenas por parte dos moradores, em audiências públicas. Ele cita, inclusive, um espaço semelhante perto de onde mora, na Aclimação, no centro expandido, que teria perdido frequentadores e cuidados após ser fechada.