A chamada PEC da Transição, negociada pela equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que autoriza R$ 198 bilhões de despesas fora do teto de gastos em 2023, traz riscos para o próprio governo eleito, disse nesta quarta-feira, 23, a jornalistas o economista Marcos Mendes, considerado um dos “pais” do teto de gastos. Ele participou do 17º Seminário Internacional da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Siac), realizado em São Paulo (SP).

“O tamanho da PEC apresentado pela equipe de transição claramente coloca a dívida pública em trajetória de perda de estabilidade, isso é muito sério porque faz o juro disparar e expectativas de crescimento econômico desabarem, basicamente o que aconteceu no desastre do governo Dilma. O segundo problema é tirar o Bolsa-Família do teto, porque quando se tira algo do teto, isso cresce sem limite e acaba afetando todas as outras despesas, que ficam comprimidas”, avaliou Mendes.

“Há um terceiro problema que é uma proposta muito mal desenhada de aumentar investimentos com base em excesso de arrecadação. Não há que se falar em excesso de arrecadação quando se tem déficit no orçamento. Quando tem dinheiro faltando, não dá para falar que vai aumentar despesa com excesso de arrecadação porque não existe isso”, continuou.

Mendes ponderou que se for possível limitar o acréscimo do teto, por meio de negociações políticas, a R$ 80 bilhões ou R$ 90 bilhões, o governo ganhará tempo para renegociar uma nova regra fiscal e “criar uma trajetória de quatro anos de maior estabilidade fiscal”.

“O governo eleito está se colocando um risco muito grande de inviabilizar a própria administração colocando na partida uma situação fiscal que será insustentável nos próximos anos de governo. (Sobre) A proposta do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), vejo como uma tentativa de minimizar danos; dentro do que está colocado no debate político, parece razoável e aceitável e se ela for aprovada, vai ser um caminho intermediário que abre espaço para uma conversa sobre reorganizar as regras fiscais e reancorar as expectativas da dívida pública”, afirmou.

Mendes avaliou também que a proposta de Jereissati “melhora muito” as expectativas fiscais sobre as quais o Banco Central trabalhará em 2023, ao contrário da apresentada pela equipe de transição do governo eleito.

“Se a despesa crescer cerca de 2% do PIB com aumento do teto em R$ 175 bilhões pela PEC da Transição, mais investimentos financiados por suposto excesso de arrecadação, a chance de a dívida crescer sem limites é muito forte. Isso obrigará o Banco Central a fazer um choque de juros muito grande”, alertou. “O mais importante é não tirar despesas do teto. Se tiver de aumentar, que seja em proporção que seja sustentável e não abale excessivamente a dívida pública”, reforçou.