Os fabricantes de máquinas agrícolas não têm do que reclamar. O setor se surpreendeu com os resultados de janeiro a julho deste ano, quando foram vendidas 48,7 mil máquinas, uma alta de 28% sobre 38 mil unidades do mesmo período de 2012. Diante da demanda turbinada, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) refez suas contas e revisou para cima o desempenho do setor em 2013. “Fomos pegos desprevenidos”, diz Milton Rego, vice-presidente da Anfavea. Antes, a previsão era de um avanço entre 4% e 5% em 2013. Agora, a entidade estima fechar o ano comemorando um crescimento de 18,4% nas vendas. Isso significará até 83 mil novas máquinas no campo brasileiro, contra as 69,4 mil de 2012, um resultado que vai superar o recorde histórico do setor, de 80 mil unidades vendidas em 1976, uma época em que os equipamentos eram menos potentes e tinham menor porte que os atuais. “Tivemos uma safra excepcional, os agricultores ficaram capitalizados e foram às compras”, diz Rego.

Para o vice-presidente da Anfavea, o setor está colhendo os frutos de uma combinação de fatores positivos que marcaram 2012: a quebra da safra americana, que estimulou a produção brasileira, a alta dos preços das commodities nos mercados internacionais, a maior rentabilidade obtida pelos produtores e a disponibilidade de crédito farto, tomada a taxas de juros atraentes. Outra justificativa para o boom deste ano é que o setor está se recuperando de um ciclo de baixa. No início dos anos 2000, a demanda por máquinas agrícolas vinha crescendo sustentavelmente e as vendas estavam na casa das 50 mil unidades por ano. A partir de 2004, por problemas climáticos, quebras de safra e ocorrências de pragas, como a ferrugem asiática nas lavouras de soja, a agricultura passou por maus momentos e isso redundou em um momento difícil para a indústria de máquinas. “Houve uma redução da renda rural e as compras ficaram abaixo da taxa de reposição natural”, diz Rego. “Por isso, a frota envelheceu muito nesse período.” As vendas recuaram para a casa das 30 mil unidades por ano e, só a partir de 2009, o setor reagiu.

Com a crise mundial, o governo adotou medidas para evitar a paradeira e aquecer o agronegócio, como o Programa de Sustentação do Investimento (PSI). No ano passado, o programa oferecia crédito a uma taxa de juros de 3% ao ano e um prazo de dez anos para quitar a dívida. “O PSI foi criado num momento de crise econômica e de baixa liquidez para estimular a economia, por isso é tão atraente”, diz João Claudio da Silva Souza, coordenador do Departamento de Economia Agrícola do Ministério da Agricultura (Mapa). Em julho, a taxa foi reajustada para 3,5%, mesmo assim, só no primeiro mês da safra 2013/2014, já foram aplicados R$ 915,6 milhões. “Num cenário em que a taxa Selic aumentou para 9% e há uma perspectiva ascendente, tenho certeza de que a taxa de 3,5% do PSI é excelente para o produtor”, diz Souza. Nesta safra, o programa prevê a liberação da cifra recorde de R$ 7 bilhões, com recursos do BNDES. O programa de crédito que existia anteriormente, o Moderfrota, permanece ativo, mas foi modificado e agora financia apenas equipamentos usados, com taxa de 5,5% ao ano.

Cauteloso, Luiz Feijó, diretor comercial da New Holland, marca da CNH Global, do grupo Fiat, não acredita que 2014 vá trazer um novo recorde, mas espera que os resultados se mantenham em patamares mais estáveis. “Talvez as vendas caiam 5% no próximo ano, mas esperamos uma certa estabilidade”, diz Feijó. “Se o País vai produzir mais, vai precisar de máquinas.” Com tratores de alta potência, motores já na casa dos 500 cavalos (nos anos 1970, a potência média era de 80 cavalos), e o lançamento de colheitadeiras cada vez mais modernas e de maior porte, o agricultor sente a necessidade de renovar a frota em períodos mais curtos, entre cinco e dez anos, fator que também sustenta as vendas. “Sem dúvida, estamos preparados para atendê-lo e temos capacidade para aumentar a produção”, diz Feijó. “A única limitação seria a capacidade dos nossos fornecedores de pneus e componentes.”

Para Alfredo Jobke, diretor de marketing da AGCO para a América do Sul, dona das marcas Massey Ferguson e Valtra, a expectativa é otimista. “A área plantada está avançando na região Norte e vai demandar maquinário”, afirma Jobke. “Acreditamos que o volume de vendas continuará bom e vamos investir pensando no longo prazo.” A multinacional americana está investindo na modernização e na expansão de suas fábricas na América do Sul. Foram US$ 35 milhões apenas na planta de Santa Rosa (RS), para introduzir um novo sistema de pintura, lançado neste ano. A empresa também prevê investimentos nas fábricas paulistas em Ribeirão Preto e Mogi das Cruzes. “E tentaremos entregar máquinas cada vez mais produtivas e com preços mais acessíveis”, diz Jobke.

A atual fase da indústria de equipamentos agrícolas não se compara com a de quase quatro décadas atrás. De acordo com Marcos Milan, professor do departamento de engenharia de biossistemas da Esalq/USP, em 1976 a agricultura brasileira estava em polvorosa, recebendo estímulos do governo e avançando na região Centro-Oeste. “O aumento das vendas estava relacionado ao crescimento da área plantada”, diz. Agora, os tempos são outros, as máquinas são muito mais produtivas e Milan acredita que o cenário reflete a entrada da cana-de-açúcar – que utiliza máquinas intensivamente –, em áreas de pastagens, além do aumento da produção de soja e de milho. “Antes, a gente não tinha o milho safrinha”, diz Milan. “Produzir duas safras em um ano exige mais maquinário”, afirma. O professor da Esalq também acredita que a demanda do setor seguirá aquecida. “A colheita da laranja ainda não é mecanizada e também existe um interesse de mecanizar as culturas do feijão e do amendoim.”