O afastamento do governador de Alagoas Paulo Dantas (MDB) foi visto pela ministra Laurita Vaz – responsável por assinar a medida – como uma maneira de “estancar atuação de organização criminosa, proteger o patrimônio público e evitar interferências indevidas” nas apurações sobre suposto esquema de “rachadinha”. A magistrada entendeu que havia “justa causa” para que fossem ordenadas as diligências executadas na segunda etapa da Operação Edema, nesta terça-feira, 11, se dizendo “absolutamente cônscia do gravame que atinge as instituições públicas envolvidas, além dos próprios investigados, dentre eles, o atual Governador, que disputa a eleição para novo mandato”.

Em despacho assinado no dia 5 de outubro, a ministra considerou que as apurações mostraram de “forma bastante contundente” o possível envolvimento de Paulo Dantas “em crimes gravíssimos”, com “impactos incalculáveis” na sociedade. Laurita Vaz destacou dados sobre a posição de Alagoas no ranking de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e em listagens sobre a parcela da população em situação de pobreza.

O inquérito se debruça sobre supostos ilícitos praticados desde 2019, mas, segundo Laurita Vaz, há “fartos e robustos indícios de que a atividade da organização criminosa” prosseguiu mesmo após Paulo Dantas assumir o Governo do Estado, em maio. Segundo ela, os crimes foram e continuam sendo cometidos “com indizível escárnio, acumulando enormes prejuízos aos cidadãos e às instituições”. Para a relatora, o cenário demandava “pronta resposta” do Judiciário, “com quem repousa a derradeira esperança de corrigir desvios de conduta dessa natureza”.

“Causa espécie o tamanho da ousadia dos criminosos, liderados pelo atual Governador do Estado, de continuarem um esquema de corrupção dessa magnitude, baseado em saques regulares de vencimentos de servidores ‘fantasmas’ da Assembleia Legislativa, com posterior desvio do dinheiro para outras contas bancárias, pagamentos e dissimulações de movimentações, mesmo depois de deflagrada a operação policial, que apreendeu vários documentos, anotações, planilhas, cartões, registros de mensagens etc., reveladora do esquema fraudulento”, registra trecho da decisão.

Além de Paulo Dantas, foram alvo de ordens de afastamento da função pública a mulher do governador, Marina Thereza Dantas, prefeita do município de Batalha; e do cunhado do emedebista, Theobaldo Cavalcanti Lins Neto, prefeito de Major Izidoro. A Polícia Federal chegou a pedir a prisão preventiva do trio e de outros investigados, mas, seguindo parecer do Ministério Público Federal, a solicitação foi negada por Laurita Vaz.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça vai analisar a decisão em sessão extraordinária na tarde desta quinta-feira, 13.

O governador afastado reagiu à operação, a qualificado como “encenação” e “fake news travestida de oficialidade”, além de afirmar que uma ala da Polícia Federal foi “aparelhada para atender interesses político-eleitorais”.

Ao concordar comas diligências requeridas pela Polícia Federal, a Procuradoria-Geral da República argumentou que a “liderança criminosa” de Paulo Dantas “migrou do ápice de uma pirâmide hierárquica de poder (Legislativo) para outra (Executivo) denotando que, apesar de a organização criminosa ter se constituído, estruturado e iniciado a execução dos crimes à época em que Paulo Dantas desempenhava o mandato parlamentar, a atividade delitiva prosseguiu após o então deputado estadual assumir a cadeira de Governador do Estado”.

A Procuradoria disse que o governador está “no vértice da pirâmide delitiva” e defendeu a realização das diligências com fundamento na “absoluta contemporaneidade” dos crimes e na “necessidade de se estancar a orquestrada atuação do grupo criminoso”. O órgão sustentou que a manutenção de Paulo Dantas no governo do Estado “coloca em evidente risco a aplicação da lei penal, a investigação e a instrução criminal”, alegando que, eventual permanência do emedebista no Executivo significaria a continuação “de forma contumaz” da prática. Para a PGR, a “sangria dos cofres públicos somente seria estancada” com o afastamento do governador.

A PGR não ignorou o fato de Dantas disputar as eleições 2022, sustentando que a candidatura demonstra sua relevância na “estrutura política” de Alagoas. “O fato de Paulo Dantas disputar a permanência no Executivo no pleito eleitoral que se aproxima, contando com o apoio maciço da Assembleia Legislativa e estando no controle da máquina estatal, demonstra a relevância do atual Governador na estrutura política de Alagoas”, sustentou a PGR.

Enquanto isso, a Polícia Federal chegou a descrever o governador afastado como “principal beneficiário e autor intelectual dos desvios” sob suspeita. A corporação destacou que o político assumiu o cargo de deputado em janeiro de 2019, passando por cargos da mesa diretora do parlamento, sustentando que tal “condição permitia autorizar e coordenar as nomeações dos servidores fantasmas”.

“A análise dos materiais apreendidos na operação Edema concluiu, com base nas planilhas e anotações de contabilidade localizadas nos aparelhos celulares dos operadores, que parcela considerável do desvio foi utilizada para pagamentos de despesas pessoais, honorários advocatícios, transferências a familiares, aquisição de bens em seu nome, além de repasses financeiros aos demais membros da Orcrim”, registrou trecho da representação da PF.

COM A PALAVRA, PAULO DANTAS

Após a deflagração da Operação Edema, o governador afastado divulgou a seguinte nota:

“Revela-se grotesca a ‘ação’ – na verdade, ‘encenação’ – de uma ala da Polícia Federal, que permitiu ser aparelhada para atender interesses político-eleitorais, tentando dar um golpe na minha candidatura à reeleição de governador de Alagoas para favorecer o candidato de Arthur Lira, Rodrigo Cunha.

Sob pretexto de investigar acusações de 2017, essa parte da PF pediu à Justiça o meu afastamento do cargo, a três semanas do 2º turno, e estando com 20 pontos de vantagem.

A tentativa de criar alarde perto da confirmação da vitória é fácil de ser desconstruída: foi anunciada por adversários, evidenciando a manipulação da operação policial. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, por exemplo, já havia ameaçado, na véspera do 1º turno, revelar no 2º turno detalhes da operação, que seria sigilosa.

Aos que acham que os alagoanos são manipuláveis por uma fake news travestida de oficialidade, a nossa campanha avisa: nosso povo não se rende a enganações e sabe muito bem a origem das mentiras. O recurso judicial será firme, e vamos seguir rumo à vitória.”