10/03/2023 - 7:02
Em 2016, o Ministério Público de São Paulo instaurou inquérito civil para investigar constantes enchentes na Rua Gaivotaa, esquina com a Ibijaú, em Moema – onde há prédios que usam até comportas para frear a água da chuva. Nesta quarta-feira, Nayde Pereira Cappellano, de 88 anos, morreu dentro de um carro submerso.
No inquérito civil nº 14.0279.0000143/2016-5, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo cita uma ocupação irregular de área pública por parte de condomínios particulares e pede à Prefeitura providências administrativas e/ou judiciais. A construção de edifícios ao longo do Córrego Uberabinha, que corta a região, causa a impermeabilização do solo. “Não foram concluídas as informações acerca das medidas estruturantes para eliminação de enchentes na região”, informou o MP.
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) abordou a questão. “Temos algumas ações judiciais em obras feitas em áreas que não poderiam ter sido construídas porque prejudicam a drenagem.” E citou a presença de construções antigas que não possuem as chamadas vielas sanitárias, espaços de 3 metros no fundo dos imóveis, utilizados para esgoto e escoamento de águas pluviais.
O inquérito foi encaminhado ao Centro de Apoio à Execução, em janeiro de 2022, para elaboração de um parecer técnico para dar subsídios a outras medidas judiciais ou extrajudiciais que devem ser tomadas. No mesmo inquérito, o órgão pede à Defesa Civil um “plano de contingência e proteção para o local, com foco na atuação preventiva”, além de “propostas técnicas para solucionar o problema de enchentes”. A Defesa Civil chegou a apresentar um Plano de Contingência de alagamentos bruscos ou processos hidrológicos que, segundo o MP, não foi efetivado. Ontem, o órgão voltou a pedir esclarecimentos.
Procurada pelo Estadão, a Prefeitura destacou que a chuva foi forte e concentrada, atingindo 67,2 mm em Moema, mas que mobilizou as equipes de zeladoria e mantém limpeza periódica na região. A Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras trabalha na elaboração da licitação para o Reservatório do Córrego Paraguai-Éguas, na Praça Juca Mulato, que deve mitigar problemas.
RECORRÊNCIA
Moradores da Rua Gaivota e da Avenida Ibijaú, porém, relatam que as enxurradas são recorrentes. Segundo eles, o problema piorou há pouco mais de 15 anos, quando a construção de prédios dificultou o escoamento de águas do Uberabinha.
Quando há chuvas fortes, moradores chegam a ficar nas janelas para alertar quem não é da região. “Não vai, não passa de carro”, gritam para os motoristas. A vítima da chuva teve uma parada cardiorrespiratória após o automóvel ficar submerso. Segundo testemunhas, ela pedia socorro desesperada.
“Hoje todo mundo tem comportas ou as portarias (dos prédios) são pelo menos em um patamar mais alto”, diz o corretor de imóveis Leandro Cinino, de 55 anos. Morador da Rua Ibijaú, ele tinha saído a trabalho quando a enchente começou. O nível da água chegou a quase 2 metros de altura na rua, relata. “Minha mulher estava em casa. Fiquei apavorado de não estar aqui para ajudar”, diz ele.
Por ser uma residência de dois andares, Leandro conta que ela conseguiu se abrigar no patamar mais alto. Os prejuízos, ainda assim, foram enormes. “A geladeira mesmo, não teve o que fazer. Foi o apocalipse, igual ontem (quarta) nunca tinha visto.”
Com consultório na região, o dentista Mauro Justino, de 61 anos, teve de sair às pressas do local onde atende. “Fechei tudo e achei que as comportas iam suportar, já que elas têm quase 2 metros, mas entrou muita água ainda assim”, diz. “O vidro da porta chegou a trincar, tamanha pressão.”
LIMPEZA
A reportagem percorreu o local ontem e acompanhou dezenas de pessoas limpando casas e estabelecimentos. O barulho das bombas de água podia ser ouvido de todos os cantos. “A gente limpa mais uma vez, mas até quando? Tem rio passando aqui embaixo, é preciso fazer alguma coisa”, afirmou a arquiteta Marilene Gonzales, de 59 anos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.