A Operação Acurácia, aberta em conjunto pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e Receita Federal nesta quinta-feira, 30, é mais um desdobramento da Operação Descarte que teve como ponto de partida informações prestadas pelos advogados Luiz Carlos da Fonseca Claro e Gabriel Silveira da Fonseca Claro, pai e filho, em delação premiada. Eles revelaram aos investigadores como teriam usado o escritório de advocacia e outras empresas controladas pela família para ajudar a Global Gestão em Saúde, investigada na CPI da Covid, a lavar dinheiro e gerar R$ 6,4 milhões em notas frias para caixa dois.

Os advogados disseram na colaboração que foram procurados para simular contratos de venda de medicamentos e de produtos eletroeletrônicos sucateados, sem valor comercial, para a farmacêutica entre 2014 e 2016. Parte deles teria sido intermediada pelo empresário Milton Lyra, apontado como operador do MDB, pelo advogado Daniel Peixoto e pelo empresário Marco Carbonari, que se apresentava como representante da Precisa Medicamentos. Descontada uma ‘comissão’, o dinheiro teria voltado em espécie para a Global Saúde pagar propina a políticos, como o ex-senador Romero Jucá e o ex-deputado Eduardo Cunha, e para cobrir despesas com um empresa de táxi aéreo, segundo os delatores. Os Claro disseram que as entregas do dinheiro a intermediários da Global aconteceram em seu escritório de advocacia e no Hotel Emiliano.

A partir da delação, a Receita Federal fez um pente-fino nas contas da Global Saúde e afirmou ver indícios de um ‘sofisticado esquema fraudulento de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro’. De acordo com os auditores fiscais, a farmacêutica não conseguiu comprovar a prestação de serviços e as empresas contratadas não têm estrutura e capacidade operacional para sua execução. “Os pagamentos feitos pelo Grupo GLOBAL/PRECISA são lastreados em contratos fictos, utilizados na geração de recursos para beneficiários ainda não identificados”, afirma a Receita.

Com o avanço da investigação, o Ministério Público Federal concluiu que o mesmo serviço prestado pelos delatores pode ter sido operado também em contratos com a BSF Gestão em Saúde, que também pertence ao grupo da Global Saúde, pelo escritório de advocacia do ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Marco Polo Del Nero, e pela banca Calazans Advogados.

Ao autorizar a quebra de sigilo telemático e as buscas na operação de hoje, a 14.ª fase da Operação Descarte, a juíza Silvia Maria Rocha, da 2.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, concluiu que as provas colhidas em etapas anteriores da investigação justificam o aprofundamento do caso.

“A presente investigação não se encontra fulcrada unicamente nos depoimentos dos colaboradores”, escreveu. “A corroborar as afirmações dos colaboradores, constam dos autos elementos probatórios colhidos ainda no início da operação Descarte. No tocante, compete ressaltar que parcela considerável dos depoimentos de Luiz Carlos Claro e Gabriel Claro serviu para elucidar pontos verificados pela autoridade policial quando da análise do material apreendido, como por exemplo as planilhas eletrônicas de pagamento e e-mails, mais especificamente aqueles que continham em anexos contratos e notas fiscais”, seguiu.

Os delatores também disseram que mantinham uma ‘relação de confiança’ com Francisco Maximiano, dono da Global Saúde. O Ministério Público Federal chegou a pedir a prisão temporária do empresário, mas a juíza concluiu que não há indícios suficientes da participação dele nos crimes. Os contratos sob suspeita foram firmados antes de seu registro como sócio da empresa.

O MPF suspeita que o dinheiro em espécie gerado através das fraudes nos contratos investigados tenha sido usado para pagar propina em contratos públicos com a Petrobras, Correios e Ministério da Saúde. “O aprofundamento das investigações justifica-se inclusive para apurar e individualizar, na medida do possível, os atos de corrupção que ensejaram as operações de lavagem de dinheiro cometidas”, defendeu o MPF ao pedir autorização para fazer a Operação Acurácia.

COM A PALAVRA, OS ADVOGADOS DA GLOBAL GESTÃO EM SAÚDE

“Chega a ser surreal repetir a mesma busca e apreensão pela terceira vez em 13 dias, dessa vez para ir atrás de documentos sobre o que delatores disseram que teria acontecido sete anos atrás. Não há qualquer contemporaneidade ou qualquer elemento mínimo para justificar essa operação. O que há, sim, é um oportunismo, graças ao retorno da pirotecnia em torno das operações policiais que, em tempos racionais, jamais seriam deferidas pelo Poder Judiciário, ante a manifesta ausência de fundamentação.”

Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, advogados de Francisco Maximiano e da Global Saúde