O advogado Edison Araújo Peixoto é pós-graduado em direito tributário pela Fundação Getulio Vargas e em gestão de negócios pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), além de ter um canudo de MBA Executivo Internacional. Todos os dias, o terno e a gravata são trajes obrigatórios para que ele circule pelas salas do Brasil Salomão e Matthes, escritório de advocacia do qual ele é sócio em Ribeirão Preto (SP). Mas, por debaixo do vetusto hábito desse profissional do direito, existe um capiau de bota e chapéu, pronto para colocar o pé no barro. Peixoto é um dos advogados que representam uma modalidade da profissão, no que está sendo chamado de Direito do Agronegócio. “Ir a campo é importante para entender a relação da agroindústria com o produtor rural”, diz Peixoto. Para ele, hoje é fundamental conhecer o funcionamento das cadeias produtivas, desde o uso de genética até o produto final. “Quem não puser o pé na estrada fica desatualizado”, afirma.

No dia 10 de agosto, Peixoto coordenou em São Paulo uma das sessões do Fórum Nacional da Agroindústria (Fonagro), evento itinerante que reúne advogados e empresários a cada três meses. Na plateia do evento paulista estava 91 pessoas, mas em todo o País participam regularmente desses fóruns cerca de 600 advogados.

O espaço ocupado por uma nova safra de advogados especialistas é reflexo da liderança do Brasil como produtor e exportador de produtos agrícolas. Ao longo da última década – e mais intensamente após a crise de 2008 –, essa expansão agrícola tem passado por uma forte transformação no modelo de gestão do lado de dentro da porteira, e também do lado de fora. Segundo Alexandre David, presidente da Associação Brasileira de Direito do Agronegócio (ABD Agro), criada em 2010, foi a partir de 2004 que as relações no campo começaram a se sofisticar. Ele cita como marco a regulamentação do financiamento privado pelo governo federal. “Naquele ano, os bancos passaram a enxergar, definitivamente, o agronegócio como uma carteira de peso e as tradings entraram para valer no setor”, diz David. Com isso, cada vez mais, produtores rurais e empresários da agroindústria começaram a passar suas diretorias e departamentos administrativos às mãos de profissionais liberais especializados, para entender melhor o que a maioria desconhece: os bastidores do agronegócio.

Para Valdemar Luís Fischer, presidente para a América Latina da Nufarm, empresa australiana de agroquímicos, presente em mais de 100 países e com fábrica em Maracanaú, no Ceará, ferramentas financeiras e expertise são fundamentais para agilizar o departamento jurídico e dar mais transparência aos negócios. “Hoje, ao financiar os agricultores é preciso rapidez nos processos administrativos, mas com segurança”, diz Fischer. Desde que os advogados entraram em ação na empresa, o volume de processos judiciais tem caído. “A Nufarm acumulou nos últimos dez anos 500 ações na Justiça”, diz Fischer. “Isso não é nada para uma empresa que fatura R$ 500 milhões por ano”, diz o presidente da companhia. “Foram apenas três as reclamações na Justiça por parte de clientes, nesse período.”

Para elaborar com precisão os contratos de cessão de crédito, a Nufarm tem treinado sua equipe jurídica, composta por quatro advogados e quatro estagiários. Segundo Alexandre Aguiar Maia, gerente-jurídico da empresa, essa é a área mais sensível de uma transação. “Raramente um advogado termina o curso de direito com formação específica para o setor”, diz Maia. As faculdades raramente colocam o agronegócio na grade das disciplinas regulares, como é o caso de direito tributário e civil. “Em causas que envolvam o meio ambiente, por exemplo, está fora do jogo o advogado que não souber o que ocorre com o Código Florestal”, diz Maia.

 

Para os empresários que não dispõem de um departamento jurídico interno, como a Nufarm, há os escritórios especializados. Eles nunca estiveram tão em alta. Nomes de grandes escritórios, como Reis e Souza, Gruppi e Fonseca, Cerqueira Leite e Luchesi, todos com sede em São Paulo, além do Brasil Salomão e Matthes, têm se tornado cada vez mais familiares aos produtores rurais. O Luchesi, por exemplo, com 80 profissionais espalhados por Bahia, Mato Grosso, Goiás, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo, montou o seu departamento de agro há oito anos. Um das vantagens apontadas na especialização dos profissionais tem dado agilidade ao andamento dos processos. “A intimidade com o setor leva a isso”, diz Ellen Carolina Silva, advogada e uma das sócias do escritório. A recuperação de crédito encabeça a lista de processos, mas indenizações ligadas ao meio ambiente, pirataria de sementes, questões trabalhistas e interpretação de contratos e títulos também têm peso na pilha das ações paradas nos tribunais. A amplidão de temas levou o agronegócio a responder por 80% do atual faturamento dos escritórios da Luchesi. Para Antônio Carlos Oliveira Freitas, também advogado do escritório, falta, agora, os tribunais de Justiça do País olharem mais para o setor. “Nos tribunais, raramente há gente especializada em agronegócio”, diz.