01/03/2011 - 0:00
Estoque regulador: maior capacidade de armazenamento e de previsão melhora a gestão de preços
Como havia prometido o governo Dilma, as mudanças no segundo escalão começaram a ser definidas assim que a base aliada deu o primeiro sinal de fidelidade, aprovando o salário mínimo. E as primeiras negociações já incluíram na dança das cadeiras cargos importantes na definição da política agrícola brasileira. Pelo menos uma mudança já estava decidida. Há menos de um ano no posto, Alexandre Magno de Aguiar cederá a presidência da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para Evangevaldo Moreira dos Santos, indicado pelo PTB de Goiás. Além da estatal, estratégica para o equilíbrio nos preços de uma extensa lista de produtos agrícolas, secretarias ministeriais e cargos em bancos públicos com influência direta sobre a formulação e execução das políticas para o setor também podem ter seus ocupantes substituídos. Uma movimentação que é acompanhada de perto por empresários e representantes do agronegócio, atentos à possível entrega de cargos técnicos para apadrinhados políticos sem afinidade com a função ou preparo para exercê-la.
A nomeação de Moreira dos Santos, 46 anos, para a Conab teve a bênção da bancada do PTB na Câmara dos Deputados. Seu padrinho político é o líder do partido na Casa, o goiano Jovair Arantes, de quem o novo presidente é conterrâneo. Desconhecido entre grandes produtores e representantes do setor, Moreira é criador de gado de corte em Barro Alto (GO), presidiu a Agência Ambiental e a Ceasa de Goiás, além de ter ocupado outros cargos no governo estadual. Sua indicação foi acolhida pelo ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, por quem foi “sabatinado”. Do ministro da Agricultura, Wagner Rossi, que presidiu a Conab até março do ano passado, ouviu que deve administrar a estatal com austeridade, alinhado com a política agrícola. “Vou assegurar o cumprimento das metas, atuando na regulação do mercado e consolidando a credibilidade do órgão”, disse Moreira dos Santos à DINHEIRO RURAL. O novo presidente também prometeu focar sua gestão no planejamento das ações da Conab, aprimorando as ferramentas de regulação de mercado e de estimativas de safras. “Trabalharei próximo ao ministro, que é responsável pelo bom desempenho da Conab e conhece o órgão de perto.”
“Vou trabalhar para cumprir metas, atuar na regulação do mercado e consolidar a Conab”
Evangevaldo Moreira dos Santos recém-nomeado presidente da Conab
A Conab é vista como a menina dos olhos da área agrícola do governo. Sua presença em todo território nacional lhe dá visibilidade, devido aos programas de distribuição de cestas básicas e no auxílio à comercialização da safra da agricultura familiar. Para o PTB, partido que não comanda nenhum ministério ou cargo de primeiro escalão, a estatal representa também um belo dote. O orçamento estabelecido para 2011 é de R$ 5,3 bilhões, antes dos cortes. Desse montante, R$ 2,3 bilhões devem ser destinados à política de preço mínimo, para garantir renda a agricultores cuja colheita não cobre os custos de produção. A regulação dos estoques é feita em 179 armazéns públicos administrados pela Conab, com capacidade acima de dois milhões de toneladas. “A Conab tem a grande responsabilidade de atuar quando há sinais de manipulação do mercado, seja com estoques, seja com estimativas distorcidas de safra”, afirma Cesário Ramalho da Silva, presidente da Sociedade Rural Brasileira.
A mudança na cúpula da Conab ocorre num momento em que a percepção de produtores e consultores é de melhora no desempenho geral da estatal. Na avaliação de especialistas, a empresa tem sido mais eficiente nos leilões para regular preço de mercados e na transferência de estoques para regiões onde há desequilíbrios de preços. “Este ano será de muita oferta, de produção grande, e o governo precisará ter instrumentos eficientes de regulação dos preços”, diz Elton Doeler, presidente do Sindicato das Indústrias do Arroz do Rio Grande do Sul. Houve também uma evolução nos métodos e técnicas de estimativa de safras, que se tornaram mais precisas e confiáveis. “Há dez anos, as estimativas eram sofríveis, com números fora da realidade”, afirma Fernando Murato Jr., analista de mercado da AG Rural. “Hoje a acuidade é muito maior.” Ele faz, contudo, um alerta: “Perder isso, por causa da dança de cadeiras, seria trágico para o setor.”
Política agrícola na berlinda
Especialistas defendem que mudanças de diretores não podem interferir no que já foi feito
De modo geral, o setor agrícola se mostra tranquilo em relação a possíveis mudanças. Há certa crença de que não haverá ruptura na política agrícola atual, especialmente por conta da confirmação da permanência de Wagner Rossi, que tem boa convivência com o setor, no ministério. “Confiamos na nossa relação com o ministro, que é boa e ajuda com os escalões inferiores”, diz Glauber Silveira da Silva, presidente da Associação Nacional dos Produtores de Soja (Aprosoja). No entanto, persistem dúvidas sobre quanto da atual estrutura do governo ligada à política agrícola será atingido pelo apetite dos partidos. Alguns nomes têm surgido em listas de possíveis substituíveis. Um deles é Gerardo Fontelles, secretário-executivo do Ministério da Agricultura e um dos principais especialistas do governo na área. Remanescente da gestão de Reinhold Stephanes, que deixou o cargo em março do ano passado, Fontelles se desgastou com a bancada ruralista nas discussões do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDDH) e sofre resistências. É esperado que o ministro o substitua por alguém mais próximo e mais palatável. Outro cargo na mira do PMDB é a Secretaria de Política Agrícola, ocupada desde 2006 por Edílson Guimarães. O cargo está na mira da bancada ruralista do PMDB na Câmara. Os deputados buscam um cargo no ministério para o ex-colega mineiro Silas Brasileiro, que não conseguiu se reeleger. A possível movimentação ainda não preocupa representantes do setor.