19/09/2022 - 17:33
Os advogados da comerciante Elisabete Teixeira da Silva, agredida após tentar impedir uma abordagem truculenta em frente a seu estabelecimento, reforçaram nesta segunda-feira, 19, o pedido do Ministério Público de São Paulo para que seja derrubada a sentença que absolveu o soldado João Paulo Servato das acusações referente ao caso ocorrido em julho de 2020. Denúncia da Promotoria de Justiça Militar de São Paulo indicou que Servato deu três socos no tórax de Elisabete, chutou sua perna e pisou em seu pescoço.
A defesa de Elisabete reforça que as imagens colecionadas no bojo do processo – as quais viralizaram nas redes sociais – demonstram ‘claramente a forma abusiva e brutal’ com que a comerciante foi tratada. “Nada, absolutamente nada justifica o policial Servato quebrar a perna de Elizabete. E muito menos de pisar em seu pescoço em momento em que ela já estava imobilizada, e não apresentava mais qualquer resistência”, diz o documento.
As indicações constam de manifestação apresentada à 4ª Auditoria do Tribunal de Justiça Militar em São Paulo, após o Ministério Público do Estado recorrer da sentença que absolveu, por maioria de votos, Servato e o cabo Ricardo de Moraes Lopes de acusações envolvendo o caso de Elisabete. A Promotoria reforça as imputações feitas a Servato, pelos crimes de lesão corporal grave, abuso de autoridade, falsidade ideológica e inobservância de regulamento. As duas últimas acusações também foram feitas ao cabo Ricardo.
Ao recorrer da sentença, publicada no dia 30, a Promotoria paulista frisou que as alegações dos PMs, de terem sido agredidos pela população com socos, chutes e golpes com barras de ferro, não condiz com a realidade. A narrativa foi citada pelos militares que votaram pela absolvição dos policiais.
Segundo a Promotoria, a versão é ‘inverossímil’, em razão de falta de provas. O laudo pericial de exame de corpo de delito não constatou lesões corporais compatíveis com o alegado pelos PMs, diz o MP. “Esse é o peso que a versão apresentada por um policial militar perante o Distrito Policial tem”, registrou a Promotoria ao lembrar que pessoas foram detidas em razão das alegações dos policiais.
As alegações da Promotoria são reforçadas pela defesa de Elisabete, que qualifica a versão dos policiais como ‘absurda e inverossímil’. Os advogados dizem que as imagens mostram que a comerciante tentava conversar com os policiais ‘quando foi injustificadamente empurrada em direção à grade de seu bar’. Além disso, a banca ressalta que a barra de ferro citada pelos policiais, ‘na realidade cai do corrimão do bar em momento que Elisabete já estava imobilizada’.
‘Desgaste físico e emocional’
“Foi a forma que, em virtude de um desgaste físico e emocional, apresentou-se para o policial cumprir sua missão”. Esse foi o entendimento dos oficiais que absolveram o soldado João Paulo Servato de acusações envolvendo o pisão no pescoço e as demais agressões perpetradas à Elisabete Teixeira da Silva.
Além disso, para os militares, ‘somente’ pelas filmagens das agressões, que repercutiram no País, ‘não é possível determinar o grau de estresse ao qual o policial foi submetido, bem como a real situação enfrentada durante todo o desenrolar da ocorrência’.
As indicações constam nos votos do tenente coronel Alexandre Leão Lucchesi e do capitão Alisson Bordwell da Silva, juizes militares do Conselho Permanente de Justiça da 4ª Auditoria da Justiça Militar em São Paulo. Junto do capitão Marcelo Medina, eles absolveram João Paulo Servato.
Restaram vencidos o juiz José Álvaro Machado Marques, da 4ª Auditoria Militar, e o capitão Brandão, que votaram por condenar o PM pelos crimes de lesão corporal grave, abuso de autoridade e inobservância de regulamento.
Ao analisarem a imputação de abuso de autoridade, por exemplo, estes entenderam que a ação de Servato ‘causou repugnância a todos que viram aquelas imagens por vários meios de comunicação, com a agravante de que, em data próxima passada, o mundo inteiro já tinha visto um policial americano causar a morte de um homem bastante forte, quando se ajoelhou sobre o pescoço dele durante procedimento de imobilização’ – em referência ao assassinato de George Floyd.
“Isto deveria ensejar ainda mais cuidado do réu com o seu proceder, mesmo após ter sido agredido por Elisabete com golpes de um rodo de madeira, pois sua conduta deve ser profissional e técnica, afastando-se do que pode ser considerado, visto e avaliado como “vingança” pessoal ou participação em “briga de rua”. Como profissional de segurança pública não lhe é dado o direito de agir da forma como o fez”, registrou o voto vencido.
Denúncia
Na denúncia de oito páginas apresentada à 4ª auditoria de Justiça Militar do Estado de São Paulo em julho de 2021, a promotora Giovana Ortolano Guerreiro narrou que os PMs foram designados para atender uma ocorrência de suposto funcionamento irregular, com base na legislação vigente por conta da pandemia.
De acordo com a promotoria, ao chegarem ao local, os policiais se depararam com dois homens e, sem qualquer justificativa, passaram a agredi-los. Elisabete pediu para que as agressões cessassem, mas acabou sendo empurrada contra a grade de seu estabelecimento. Após novas agressões a um dos homens, a mulher tentou intervir novamente e foi então que Servato foi em sua direção.
“O miliciano desferiu 03 (três) socos no seu tórax e 01 (um) chute em sua perna, o que provocou uma forte dor. Ao verbalizar para o miliciano “você quebrou minha perna”, respondeu o PM Servato “quebrou porra nenhuma”. Na sequência, o PM Servato pegou a vítima Elisabete pelos cabelos e jogou-a na frente do carro de Alan. Já caída no solo, o PM Servato pisou no pescoço de Elisabete e assim permaneceu existente em seu estabelecimento comercial”, registra a denúncia.
Os vídeos do ocorrido indicam que enquanto Servato mantinha seu pé sobre o pescoço de Elisabete, ela sequer oferecia resistência, pois não se movimentava no chão. No momento em que a mulher esboçou um movimento, o PM a segurou, colocou seus braços para trás e arrastou-a pelo chão na direção da viatura.