19/04/2013 - 11:48
Se cada brasileiro consumir um bife de 100 gramas a mais por semana, seria necessário aumentar a atual produção de carne bovina do País em cerca de um milhão de toneladas por ano. Trata-se de um volume equivalente ao que o setor exportou no ano passado e que gerou uma receita de US$ 4,5 bilhões. E com uma diferença: sem ter de suportar a burocracia dos mais de 160 países-clientes da produção brasileira. Os consumidores para essa carne estão todos aqui no Brasil, no mercado interno. Com essa conta em cima da mesa, o grupo JBS vai apresentar ao mercado, neste mês, o projeto chamado No Ponto. “O País tem um público consumidor de carne bovina cada vez mais exigente, que busca qualidade e cobra isso das empresas”, diz Renato Costa, presidente da divisão de carnes do JBS, controlado pela holding J&F e dono de um faturamento de R$ 76 bilhões no ano passado. O programa No Ponto deve funcionar como um guarda-chuva para várias exigências que os frigoríficos do grupo começam a fazer aos pecuaristas fornecedores, para que eles sejam premiados pela carne que produzem. Os prêmios podem chegar a R$ 8 por arroba. Ou seja, em um boi de 18 arrobas, peso considerado padrão na indústria frigorífica, o adicional por animal passa de R$ 140. Segundo Costa, não há um levantamento formal que mostre se essa remuneração compensa o trabalho do pecuarista para que ele entregue o boi que o JBS quer. Mas a percepção da equipe de campo é de que, atualmente, R$ 5 a mais por arroba cobriria os gastos adicionais que o pecuarista teria com esses animais. “Vamos ver no que vai dar”, diz João Normanha, da fazenda Serralu, em Varjão, a 80 quilômetros de Goiânia.
Normanha é um grande confinador de gado e alvo do programa do JBS. No ano passado, o pecuarista engordou 20 mil animais em sistema confinado, a maior parte entregue ao frigorífico Minerva, com unidade de abate em Palmeira de Goiás. Nesta safra, porém, ele deve vender parte de seu gado ao JBS. “É preciso trabalhar muito bem para ter lucro na pecuária.” Normanha abate os animais com 33 meses de idade e peso de 21,4 arrobas. Desse total, 61% do gado é abatido com três milímetros de gordura, uma das exigências da indústria para que a carne chegue suculenta e macia na mesa do consumidor. Mas não é somente isso que o JBS quer.
Segundo Costa, a principal exigência do programa No Ponto é a castração dos bois. “A carne do animal castrado é mais vermelha e mais atrativa ao consumidor”, diz. “O animal perfeito é precoce, castrado e gordo.” No Brasil, segundo um estudo conduzido pelo zootecnista Eduardo Pedroso, especialista em gestão da qualidade de alimentos pela Universidade de Campinas (Unicamp), e diretor de relacionamento com o pecuarista do JBS, 68% do gado abatido nas principais regiões produtoras do Norte, Centro-Oeste, Sudeste e Nordeste do País não é castrado. “O Brasil vai na contramão do que fazem seus principais concorrentes quando se discute carne de qualidade”, afirma Pedroso. Nos EUA, Austrália e Argentina, 100% do gado é castrado. “É preciso pensar nessa questão, se além do mercado interno nós também queremos competir nos mercados mais remuneradores do mundo, como o europeu”, diz. No início de março, segundo dados da Associação Brasileira de Exportadores de Carne (Abiec), países como Alemanha, Inglaterra e Itália pagaram pela tonelada de contrafilé e de miolo de alcatra entre US$ 6 mil e US$ 7 mil. No entanto, se esses mesmos cortes tivessem sido vendidos na cota Hilton, um adicional que os europeus pagam pela qualidade do que compram, o prêmio seria de US$ 2,5 mil por tonelada.
Outra constatação da pesquisa conduzida por Pedroso se refere à qualidade da carne do boi castrado. “A castração é o primeiro passo, depois vêm a alimentação e o manejo”, diz. “Esse conjunto define o boi que vai para o abate.” A pesquisa mostrou, ainda, que dos 32% de bois castrados, apenas 16% deles foram considerados cabeceira, 56% eram medianos e 27% foram desconsiderados como animais de qualidade. “O programa No Ponto está muito bem fundamentado para que o pecuarista tenha informações para ajudá-lo na engorda do boi.”
De acordo com Costa, o programa promete ser um canal de ligação entre o que o mercado quer e o que é produzido no campo. “É nossa obrigação informar ao pecuarista qual a tendência do mercado de carne.” Para o JBS, é possível detectar onde estão as demandas por carne de qualidade e fechar parcerias com os produtores para que eles invistam na engorda dos animais. “Acabou o tempo em que o frigorífico só exigia, sem contrapartidas ao pecuarista”, diz Costa. Segundo Pedroso, quando o projeto começou a ser concebido, uma das preocupações da equipe de técnicos do JBS era alinhar a demanda da empresa puxada pelo lado comercial, ou seja, sob encomenda. “A produção e a comercialização dos bois castrados serão feitas sob contrato”, diz Pedroso. “Isso traz tranquilidade para quem produz e planejamento para a área comercial do JBS, sem ruptura de abastecimento nas 52 semanas do ano.”