Expansão do setor amplia o interesse pela pesquisa científica sobre as espécies (Crédito:Wenderson Araujo)

Carpas e tilápias produzidas, respectivamente, pela China e Egito. Foi assim que há cerca de 4 mil anos, ainda no período Paleolítico, o mundo começava a criar peixes em cativeiro. Nas Américas a atividade demorou a chegar. Só desembarcou no continente de forma comercial no século XX quando a tecnologia tornou a criação da tilápia, robalo e garoupa mais rentável. No Brasil, a profissionalização do setor ganhou força adicional em 2014 quando a Associação Brasileira da Piscicultura (PeixeBR) foi criada trazendo mais governança para o setor. Desde então, a entidade registra aumento médio de 5% ao ano na produção de peixes em cativeiro. No ano passado, o ritmo se manteve com alta de 4,7% sobre o ano anterior. Foram 841 mil toneladas produzidas. “A piscicultura representa a atividade de produção animal que mais cresceu nos últimos anos”, afirmou Francisco Medeiros, presidente-executivo da PeixeBR.

Divulgação

A comparação com as demais proteínas de origem animal mostra o quanto a piscicultura pode evoluir. No mesmo ano em que o país produziu 841 mil toneladas de peixes, foram 14,3 milhões ton de carne de frango, 4,7 milhões ton de suínos e 54 milhões de ovos. O baixo índice de consumo da carne branca no mercado interno é uma das razões para a discrepância. Os brasileiros consomem, em média, menos de 5 kg por habitante ao ano. A média global é de 20,5 kg per capita/ano. A outra explicação vem dos portos. Ainda que em expansão, a exportação nacional é baixa perante o imenso potencial que o Brasil tem. No ano passado foram embarcadas 9,9 mil toneladas, 49% a mais do que em 2020. Agora, um plano para acelerar a atividade no País está em curso.

Gabriel Muniz
“A piscicultura representa a ativi-dade de produção animal que mais cresceu nos últimos cinco anos” Francisco Medeiros
peixebr (Crédito:Gabriel Muniz)

O PLANO Após sucessivas demandas dos criadores, a Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) está, enfim, formulando uma política pública para estimular o campo aquícola brasileiro. O Plano Nacional de Desenvolvimento da Aquicultura (PNDA) tem como objetivos, atrair investimentos e impulsionar o desenvolvimento da atividade no País pelos próximos 10 anos. O diretor do Departamento de Ordenamento e setores produtivos da Aquicultura (DPOA) Maurício Pessôa afirmou que a proposta “vai servir como ferramenta para os investidores estrangeiros identificarem que o Brasil tem um norte traçado”.

“Uma ajuda importante seria a desoneração do PIS/COFINS da ração” Juliano Kubitza ,Filder Pescados (Crédito:Divulgação)

Uma das estratégias para atrair o capital externo é o fomento à inovação, área que segundo o pesquisador científico do Instituto de Pesca da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (IP-APTA), Gianmarco David, começou a crescer recentemente. “Só nos últimos cinco anos foi possível identificar um aumento na presença de tecnologia no setor”, disse. Para a presidente da Sociedade Brasileira de Aquicultura e Biologia Aquática (Aquabio), Cintia Nakayama, além de um plano institucional, o desenvolvimento do setor depende ainda do alinhamento dos interesses dos setores produtivo, acadêmico e financeiro. “À medida que o setor ganha força, o interesse na área de pesquisa também cresce”, afirmou. Mais pesquisa e mais tecnologia permitiriam ao Brasil aumentar a produção de peixes nativos que hoje equivalem a somente 31,2% da produção nacional, com 262,3 mil toneladas. O volume representa queda de 5,85% em relação a 2020, movimento que a PeixeBR atribui a dois problemas enfrentados pelo setor que o PNDA deve solucionar: a regularização ambiental nos estados produtores e a necessidade de investimentos na infraestrutura de processamento e de insumos.

Some na lista de desafios a tributação que encarece bastante os custos. Para o gerente da Fider Pescados Juliano Kubitza “uma ajuda importante seria a desoneração do PIS/COFINS da ração. Hoje ela leva essa taxa no preço que outras proteínas como frango e o suíno não têm”, afirmou. Segundo Maurício Pessôa, do DPOA, a Secretaria de Agricultura já reforçou a necessidade de aprovar essa isonomia junto ao Ministério da Economia.
Solucionar estes obstáculos traria vantagem competitiva aos produtores nacionais que diversificariam a oferta de produtos com opções que já caíram no gosto dos consumidores de algumas partes do País. Um exemplo é o tambaqui, peixe típico da Amazônia de gosto suave, mas bem particular. Foi justamente esta espécie que um estudo publicado pela Reviews in Aquaculture apontava como um peixe com potencial de crescimento da produção similar à tilápia, o que poderia levá-lo a se ser uma típica commodity brasileira. Mas para isso é preciso que o Brasil veja a piscicultura do mesmo modo que o Chile olhou para o setor quando decidiu fazer do salmão chileno um sucesso mundial. A receita está pronta, só falta o peixe.