Vice-presidente da americana Coskata revela como a empresa pretende ganhar bilhões com sua tecnologia que produz etanol a partir de biomassa

Wes Bolsen é um dos homens que estão à frente da Coskata, empresa americana criada há pouco mais de dois anos e que pretende revolucionar a produção de etanol. Ele garante que sua companhia desenvolveu a tecnologia capaz de produzir o combustível a partir dos mais variados materiais, como bagaço de cana, madeira, pneus, lixo, entre outros. Tudo a um custo de US$ 1 por galão (3,8 litros). Durante rápida passagem pelo Brasil, ele concedeu entrevista exclusiva à DINHEIRO RURAL e falou dos planos da empresa para produzir 100 milhões de galões de etanol por ano, a partir de 2011.

DINHEIRO RURAL – Como funciona a tecnologia desenvolvida pela Coskata?

WES BOLSEN – Basicamente nós pegamos a biomassa, que pode vir de pneus, lixo, milho, bagaço de cana, madeira, etc. Enfim, qualquer material que tenha como componente o carbono. Esse material é introduzido em um equipamento chamado de gaseificador e nele é gerado um gás que é levado para um biorreator, onde ficam os microorganismos que desenvolvemos. Esses microorganismos respiram esse gás e produzem o etanol de uma forma eficiente e barata.

RURAL – E qual o custo de produção?

BOLSEN -Estimamos que o custo para se produzir esse etanol é US$ 1 por galão. Além disso, do ponto de vista ambiental também há vantagens, já que esse etanol feito a partir da biomassa emite menos gases prejudiciais. Em relação à gasolina a emissão é 96% menor e chega a 20% menos do que o etanol de milho.

RURAL – Essa tecnologia já está totalmente dominada ou ainda precisa ser aperfeiçoada?

BOLSEN – A pesquisa já foi melhorada em 600 vezes desde que começamos a desenvolvê- la, há dois anos. Hoje, a bactéria que gera o etanol está totalmente desenvolvida e o processo de produção também está totalmente dominado. Só falta juntar tudo e iniciar a produção em larga escala.

RURAL – Então ainda não há produção comercial desse tipo de etanol? BOLSEN – Ainda não é algo comercial. Já temos uma produção piloto na cidade de Chicago (EUA) com ótimos resultados. Estamos construindo junto com a GM uma usina na Pensilvânia, que deve entrar em operação no primeiro trimestre de 2009, em princípio como demonstração da tecnologia. Mas nossa expectativa é que, a partir de 2011, poderemos ser capazes de produzir 100 milhões de galões por ano.

RURAL – O negócio da Coskata é comercializar a tecnologia ou produzir etanol?

BOLSEN – Na verdade pretendemos atuar nas duas pontas. Nós iremos licenciar a tecnologia para empresas que se mostrem interessadas e pretendemos também produzir etanol. Ainda estamos estudando a melhor forma de fazer isso.

RURAL – O Brasil está na rota desses novos investimentos?

BOLSEN – Certamente. Viemos visitar o País a convite do presidente da União das Indústrias Canavieiras (Unica), Marcos Jank, que já esteve nos visitando na nossa sede, no Estado de Illinois (EUA). A idéia é conhecer de perto o modelo de produção do etanol brasileiro e apresentar nossa tecnologia para empresas brasileiras. Conversamos com grandes usineiros como o Rubens Ometto, da Cosan, com representantes da Refinaria Costa Pinto, e estive no Rio de Janeiro para encontrar com diretores da Petrobras. Trata-se de uma grande empresa que poderia ter seu excedente de gás usado para produção de etanol, através da nossa tecnologia. Na verdade não pretendemos investir 100% no País, mas sim criar joint ventures com empresas como essas que visitamos e outras companhias que sejam interessantes.

RURAL – E já há algum negócio fechado?

BOLSEN – Não, ainda não há nada de concreto. Na verdade estamos em fase de analisar possibilidades e de mostrar a tecnologia para essas empresas. Mas vejo o Brasil como o número 1, fora dos EUA, para utilizar essa tecnologia. Muitas empresas químicas do País estão interessadas em dar o segundo passo e produzir o etanol de segunda geração. Como o açúcar complementa o etanol, o bagaço será outro complemento.

RURAL – Qual a sua impressão sobre o modelo de produção do etanol brasileiro?

BOLSEN – Fiquei impressionado, pois o País tem uma produção extremamente consolidada. É muito fácil dobrar a produção de etanol no Brasil. Porque aqui existem excedentes produzidos nas próprias usinas, como o bagaço de cana, que pode ser usado para a geração de etanol. Além disso, o País possui uma grande infra- estrutura de transporte, de logística, com o consumo do álcool bem disseminado e praticamente todos os postos com bombas para o álcool.

RURAL – Comparando com os Estados Unidos…

BOLSEN -Esse tipo de infra-estrutura ainda é um problema nos EUA. Sem dúvida o Brasil é o país com o maior potencial de expansão da produção e com as maiores oportunidades no mundo como exportador de etanol. Porque já tem uma produção estruturada, tecnologia bem dominada, e o mais importante: capacidade de produzir a um custo muito baixo.

RURAL – E como as empresas brasileiras receberam essa nova tecnologia? BOLSEN – Os produtores se mostraram interessados e percebo uma grande oportunidade de utilizar essa tecnologia no Brasil. A produção é feita através de um processo conjugado, ou seja, não há necessidade de nenhuma transformação na estrutura que já existe, pois as operações são feitas simultaneamente. Nossa estimativa de investimento para a implantação de um projeto de produção com a tecnologia que desenvolvemos é de aproximadamente US$ 200 milhões. Mas isso é um valor que varia muito, pois algumas usinas já possuem alguma estrutura, como gaseificador, o que reduz esse investimento.

RURAL – Esse investimento não pode ser considerado alto e inviabilizar essa tecnologia economicamente?

BOLSEN – Acredito que não. Como falei, esse valor é uma estimativa, que permitiria acrescentar 30 milhões de galões por ano à produção da empresa. Além disso, o custo de produção reduziria drasticamente, uma vez que estipulamos que o custo para produzir o etanol seria de US$ 0,25 por litro.

RURAL – Mas e a parte técnica…

BOLSEN – Tecnicamente também a tecnologia é totalmente viável para ser produzida em larga escala. Há 20 anos eu não poderia dizer isso, mas hoje, com toda a pesquisa que desenvolvemos, é totalmente possível. A Coskata foi criada para desenvolver essa tecnologia e conseguimos isso mais rapidamente do que esperávamos e por isso conseguimos ampliar a capacidade de melhoramento da tecnologia. Por isso, faz todo sentido dizer que podemos produzir em larga escala de maneira econômica e tecnologicamente viável.

RURAL – Para chegar nesse estágio, quanto foi investido?

BOLSEN – Tivemos aportes de capital de várias empresas importantes como Khosla Ventures, que é uma das que mais investem na produção de etanol no mundo. Também contamos com a GM que hoje é uma das sócias da Coskata. Então o capital investido veio de um grupo de empresas que acreditam na nossa pesquisa. Por contrato não podemos revelar o total nem a participação de cada empresa. Mas, para se ter uma idéia, acabamos de receber US$ 50 milhões em novos investimentos. Esse é o ultimo aporte antes de iniciarmos nossa abertura de capital nos Estados Unidos. O que deve acontecer em breve.

RURAL – Hoje, a empresa vive de que tipo de receita?

BOLSEN – Na verdade não temos faturamento. A empresa funciona como um centro de pesquisa privado. A partir do ano que vem, quando começarmos a licenciar a tecnologia e iniciar os projetos de produção do etanol, começaremos a contabilizar ganhos.

RURAL – Então, foi nesse ponto que a General Motors entrou como parceira… BOLSEN – Nós anunciamos essa parceria em janeiro de 2008. A GM procura fornecedores para combustíveis alternativos, principalmente em relação ao etanol de segunda geração. Como o etanol nos Estados Unidos é produzido a partir do milho, a empresa acredita que é preciso ter um etanol que permita outras possibilidades. Ela seleciona fornecedores e encontrou a Coskata e hoje a GM é uma das sócias da empresa. Fazemos um trabalho conjunto para não colocar no mercado etanol feito a partir de alimentos e sim de outras formas. Não só nos Estados Unidos, mas também em outros mercados importantes como China e Europa.

RURAL- Além disso, a GM domina a tecnologia flex…

BOLSEN – Sem dúvida a tecnologia flex implantada nos automóveis abriu grandes oportunidades para alavancar o mercado de álcool. Nós acreditamos que até 2012 metade da frota de veículos zero-quilômetro dos Estados Unidos será flex. Esse é um grande mercado e essa é a nossa expectativa. Trabalhamos com a previsão de que os EUA sigam o modelo adotado pelo Brasil e que isso será uma grande oportunidade.

RURAL – Se o etanol brasileiro é tão superior, por que insistir no álcool de milho?

BOLSEN – Acho que isso é mais uma questão de oportunidade. Nos Estados Unidos a produção de milho ocupa uma área pequena e existe espaço para expandir essa produção, tanto para o milho usado como alimento como para o milho destinado exclusivamente ao etanol. Assim como no Brasil, os Estados Unidos dispõem de bastante terra para a produção de alimentos e de energia. Nós estimamos que os Estados Unidos produzam cerca de 1 bilhão de toneladas de biomassa por ano, ou 100 bilhões de galões de etanol por ano, através do processo da Coskata.

RURAL – Existe hoje uma grande discussão para definir padrões e tornar o etanol uma commodity. Como avalia essa questão?

BOLSEN – Acho que o etanol de fato precisa ser mundialmente padronizado e acredito que se tornará uma commodity. Na minha opinião, é algo inevitável e acredito que a nossa tecnologia até contribua para isso. A coisa mais importante da Coskata é que essa tecnologia possibilita produzir etanol onde a biomassa está. Esse na verdade é o pulo do gato. Com o etanol feito a partir da biomassa será possível desconcentrar a produção mundial de etanol, o que é um dos pontos importantes para tornar o produto uma commodity. Além disso, ela pode fazer com que os países fiquem menos dependentes de regiões como a Arábia Saudita, no caso do petróleo.