TRABALHADORES Primeiro passo do compliance é obedecer às leis vigentes (Crédito:Divulgação)

Com o recrudescimento da agenda ESG (Ambiental, Social e de Governança) nos últimos anos, uma série de novos conceitos se tornou frequente nas conversas dos produtores rurais dentro e fora da porteira. Compliance é um deles. Se até pouco tempo atrás seu raro uso era justificável, pois parecia não ter muita relação com a lavoura ou rebanhos, agora a situação é outra. Uma vez que o agro se aproxima da Faria Lima e do mercado de capitais, a tendência é que o termo rapidamente se popularize. E o motivo para isso é que compliance é risco. “Vai desde um olhar sobre as operações para as melhores práticas, até um contexto maior de gestão de riscos”, afirmou a advogada sócia especialista em agronegócio da KPMG, Giovana Araújo.

85% dos produtores afirmam que governança é relevante

MEIO AMBIENTE: Práticas não sustentáveis aumentam risco ao produtor (Crédito:istockphoto)

Ainda que a jornada rumo à governança seja certa à medida que o negócio cresce, para boa parte dos produtores as dificuldades continuam sendo muitas. De acordo com a pesquisa Governança no Agronegócio: Percepções, Estruturas e Aspectos ESG nos Empreendimentos Rurais Brasileiros, realizada pela KPMG em parceria com o grupo de trabalho Agro do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), 52% dos entrevistados indicam que mapear os riscos corporativos e operacionais é um dos maiores desafios que enfrentam. Em seguida, aparecem a necessidade em promover a melhoria no ambiente de controles internos e compliance (51%), formalizar papéis e responsabilidades (50%) e políticas e procedimentos internos (42%). Mas, independentemente dos desafios que vão enfrentar, 85% dos entrevistados classificam a governança como importante ou muito importante para seus empreendimentos.

“O compliance vai desde um olhar para as melhores práticas até gestão de riscos” Giovana Araújo, KPMG (Crédito:Divulgação)

A JORNADA Para quem não sabe por onde começar o trabalho, os sócios do escritório Trench Rossi Watanabe, Heloísa Uelze e Felipe Ferenzini, são categóricos no conselho de “comece pelo básico”. Ou seja, cumpra a lei brasileira com rigor e use ferramentas como os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas como framework para planejar a estratégia. “Não ter trabalho escravo, não ter menor trabalhando, não ter poluição ao meio ambiente na sua cadeia produtiva”, afirmou Heloísa. Mas não basta não fazer, é preciso comprovar ações e resultados. No curto prazo, o processo pode sair caro para o bolso devido aos altos custos com advogados, ferramentas de gestão, especialistas para montar a estrutura de governança e a contratação de profissionais especializados para cuidar da agenda na propriedade. Mas, sem esse esforço inicial, o resultado pode ser bem mais desastroso no longo prazo. Afinal, afirmou Heloísa, uma série de regras de compliance “já começa a ser exigida pelos países da Europa”. Quem não fizer perderá mercado.

“A adoção de melhores práticas pelos concorrentes gera um ciclo positivo no mercado” Felipe Ferenzini, Trench Rossi Watanabe (Crédito:Divulgação)

Para Ferenzini, é certo que a movimentação rumo aos mais altos níveis de adequação está intensa no Brasil. As empresas veem os concorrentes evoluindo e colocando a conformidade como diferencial e passam a ter mais interesse no processo. “Isso gera um ciclo positivo no mercado”, afirmou. O mesmo vem acontecendo com entidades e cooperativas, o que, segundo o advogado, promove um incentivo maior pela busca da integridade de maneira coletiva. Outro ponto é que a governança gera novas oportunidades de negócio, especialmente aquelas relacionadas a estruturas financeiras mais complexas e com mais riscos, como o mercado de crédito de carbono. “As empresas que querem investir, antes de comprarem créditos, procuram o escritório para avaliar os possíveis parceiros, para verificar se não estão envolvidos com grilagem”, diz.

PRÁTICAS instrumentos como ODS servem de parâmetro para conformidade (Crédito:istockphoto)

EXEMPLO Competir com grandes multinacionais é impossível, mas produtores rurais que estejam procurando benchmarking inspiradores podem olhar para a indústria. Na Basf, por exemplo, o programa de compliance tem mais de duas décadas. Segundo o head jurídico da Divisão de Soluções para Agricultura da Basf na América do Sul, Lucas de Oliveira e Silva, ainda que haja ajustes para cada mercado, as molas mestras do compliance são comuns: limites, barreiras e capacitação. “Quem entra na empresa já recebe os treinamentos de compliance e anticorrupção.” E, mais recentemente, questões ligadas à diversidade. “Tentamos ser um exemplo e inspirar nossos parceiros em todas as áreas”, afirmou.

A porta está aberta com exemplos, literatura e especialistas para ajudar o produtor nesta jornada. No entanto, mais do que uma cartilha de regras e normas, o compliance tem que ser introjetado nos valores e cultura da propriedade. Do contrário, serão dinheiro e oportunidade jogados fora.

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