” Nossa gestão visa fazer uma das mais modernas usinas do País, lucrativa e em paz com a natureza ” Sylvio Coutinho, presidente

Havia 32 dias que o ano de 2009 se encerrara, enquanto os tratores colhiam os últimos talhões de cana da Fazenda Itamarati, localizada a 200 quilômetros de Cuiabá, capital do Mato Grosso. Era o primeiro dia de fevereiro, e o executivo Sylvio Nóbrega Coutinho fazia as contas do ano. Naquela safra, que atrasara por causa das chuvas, os rendimentos não seriam nada modestos: 5,7 milhões de toneladas de cana, 282 mil metros cúbicos de etanol produzidos, 4,6 milhões de sacas de açúcar e a certeza de que as contas seriam pagas com folga. Nem bem os tratores encostaram para a manutenção, e a nova safra já tornou a ser colhida em 1º de abril, o dia internacional da mentira. Mas o que realmente parece ficção é o fato de que essa mesma usina, que colhe resultados exuberantes, esteve, seis anos atrás, com 2.756 títulos protestados e à beira da falência. A Usina Itamarati é um dos últimos legados rurais do empresário Olacyr de Moraes, ex-rei da soja, que se tornou notório após construir ferrovias para escoar a sua própria produção de grãos. Construída em 1980, em meio à febre do Proálcool, fez sua primeira colheita em 1983. Dez anos depois inaugurou seu projeto de açúcar, mas seguidas crises no setor impuseram tempos difíceis até que, em 2004, Coutinho chegou para organizar a casa. Com a carreira forjada no aço da metalurgia, ele chegou ao topo da vida executiva quando se tornou presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, do empresário Benjamin Steinbruch. “Lá aprendi que os controles são importantes e que a gestão faz toda a diferença, principalmente em tempos difíceis”, revela à DINHEIRO RURAL. Se pudesse empilhar todos os títulos que tinha para pagar, poderia fazer uma pilha com mais de dois metros de altura. “Era uma situação realmente muito grave”, diz.

 

Irrigação: à esquerda, a vinhaça é jogada no campo como fertilizante, enquanto as mudas de cana são regadas em viveiros

Seleção: laboratório da usina analisa sementes em busca de produtividade

A cartilha seguida por Coutinho é a que consta nos bons manuais de administração. Negociou com credores, favoreceu a produção de caixa e estabeleceu novas rotinas empresariais. E ainda por cima teve de lidar com um complicado desastre ambiental, quando dutos da usina se romperam deixando vazar vinhaça em rios da região.

“Investimos R$ 17 milhões num projeto de reaproveitamento desse produto, que agora virou fertilizante”, comenta. Segundo o ex-presidente da União da Indústria da Cana de Açúcar (Unica), Eduardo Pereira de Carvalho, a Itamarati foi uma das primeiras empresas do setor a partir para a profissionalização. “Depois muitas outras começaram a seguir esse caminho”, revela.

Característica marcante no setor sucroenergético, a centralização das decisões esteve entre os desafios enfrentados por Coutinho no início de seu trabalho. “Hoje, no início de cada safra, a administração e as gerências estabelecem as metas e tudo o que buscaremos”, diz. Tudo é divulgado e discutido, envolvendo os profissionais de todas as áreas e níveis. “Há detalhes que são dominados por quem está na produção, e isso não pode ser ignorado”, revela. Segundo ele, o maior desafio estratégico é tornar o processo mais competitivo, reduzindo custos sem deixar de investir em pessoas e tecnologia.

A agregação de valor e o lançamento de outros produtos com marca própria também estão entre as estratégias. A empresa comercializa açúcar cristal, refinado e triturado para o atacado, varejo e indústria. Sua participação de mercado é de 30% nas regiões Centro-Oeste e Norte do País. A Usina Itamarati também produz e vende etanol combustível hidratado e anidro. Ela pode escoar até 2 milhões de litros por dia e tem capacidade de armazenar 165 milhões de litros. “Isso é fundamental para que você não se sinta obrigado a vender todo o produto quando os preços estão baixos”, completa Coutinho. “Em épocas de preços baixos, damos prioridade à estocagem para vender em tempos mais favoráveis.”

 

Operações: cerca de 5% do colheita da cana é feita de forma manual num trabalho de inclusão social. Acima, usina com capacidade para moer seis milhões de toneladas

Assim como outras usinas, a Itamarati tem a geração de energia como parte de seu negócio. Com a queima do bagaço da cana, ela pode gerar 36 megawatts/hora de energia elétrica. Deste total, 20 MW são utilizados para o consumo interno e o excedente é comercializado para a Concessionária de Energia Elétrica do Estado do Mato Grosso (Cemat) ou para o mercado livre. “Esse modelo de diversificação é muito importante para empresas que necessitam ter um fluxo de caixa mais constante, além de explorar todas as possibilidades no negócio”, avalia a consultora Maria Tereza Hosco, da Fundação Dom Cabral.

Especialista na área de sucessão e gestão empresarial, ela explica que as empresas rurais tendem a construir os mesmos níveis de controle conforme a profissionalização avança. “Esse é o nosso desafio, e vamos seguir em frente porque há muito o que conquistar”, comemora Coutinho.

A usina também saiu na frente na questão mão de obra. Apenas 5% da colheita é feita de forma manual. “É uma maneira de não abandonar esses trabalhadores que dependem da safra”, explica. Com capacidade de moer seis milhões de toneladas, a Itamarati é a maior das usinas do Mato Grosso. Pela frente, o desafio de continuar produzindo e preservando o meio ambiente. “Nossa usina já é o futuro”, diz Coutinho.

 

Petrobras aposta no etanol

Após firmar parceria com a São Martinho, empresa avança no setor sucroenergético

Aos poucos, o ambicioso plano da Petrobras Bioenergia, de se tornar uma das maiores empresas de bioenergia do País, começa a tomar forma. Em fato relevante publicado na segundafeira 21, a empresa divulgou uma parceria com a São Martinho, empresa de capital aberto na Bolsa de Valores de São Paulo. O acerto visa o crescimento da produção de etanol na região Centro- Oeste e envolve as subsidiárias Usina Boa Vista e SMBJ Agroindustrial, do grupo sucroalcooleiro.

Para tanto, será constituída uma empresa, chamada Nova Fronteira Bioenergia, que controlará as subsidiárias da São Martinho e também indicará os gestores. À Petrobras Bioenergia, presidida por Miguel Rossetto, caberá uma fatia de 49% desse empreendimento por meio de subscrição de R$ 420,8 milhões em ações. A estatal ainda vai deter o direito de preferência para adquirir até 49% da produção de etanol e energia elétrica da empresa constituída pela parceria.

O investimento a ser efetuado pela PBio através da integralização das ações ocorrerá em duas parcelas, sendo a primeira equivalente a R$ 257,6 milhões, a ser desembolsada em até 90 dias após a conclusão da análise jurídica da documentação das empresas (“due dilligence”), e a segunda equivalente a R$ 163,2 milhões, a ser desembolsada em até 12 meses da data de subscrição, segundo fato relevante publicado pela Petrobras. No ano passado, Rossetto tentou negociar os ativos da Brenco, sem sucesso. Esse até agora é o grande passo do ex-sem terra que se tornou barão do etanol.