Prestes a deixar o governo matogrossense, o maior sojicultor do mundo defende uma plataforma verde e diz que espera grandes avanços para 2010

Quando assumiu o governo de Mato Grosso em 2003, virou alvo dos ambientalistas. Sete anos mais tarde, ele deixa o comando do Estado com um discurso alinhado ao meio ambiente e diz que a agricultura é o que há de mais moderno para a ecologia brasileira. Seu próximo passo será a candidatura ao Senado, mas ele não descarta uma possível aliança com Dilma Rousseff, ou até mesmo com Marina Silva. Será que isso é mesmo uma proposta viável?

Dinheiro Rural – O sr. pretende concorrer ao senado. A questão ambiental será a grande bandeira?

– Saio do governo em 31 de março e sou candidato ao Senado. A questão ambiental entrou na nossa vida para ficar. No começo eu até achava que se tratava de um modismo, mas não é o caso. Hoje existem comprovações científicas dos problemas e temos que agir. O novo momento que a área ambiental vive é justamente encontrar formas para conciliar o aumento de produção com a conservação ambiental. Isso não vai fazer parte apenas do meu discurso e das minhas propostas, mas de qualquer um que queira estar na vida pública.

Dinheiro Rural – O seu nome chegou a ser ventilado como o de um possível vice de Dilma, pré-candidata do governo à Presidência. O que o sr. acha disso?

– A questão de vice não pode ser discutida com muita antecedência. Ela depende do momento, de um partido forte, ou de outras situações. Essa é uma composição que deve ser feita em cima da hora. Claro que me sentiria honrado com um convite desses e não teria problema algum em aceitar. Mas sei também que esse tipo de discussão é muito mais ampla.

Dinheiro Rural – Depois dos embates com o Ministério do Meio Ambiente, o sr. participaria de um eventual governo Marina Silva?

– Não teria problema para trabalhar com a Marina. Mesmo quando a exministra ocupava o cargo, nós tínhamos projetos com o Ministério do Meio Ambiente. Na verdade, tivemos uma relação muito boa. Os embates eram muito mais com as ONGs ou a imprensa.

Dinheiro Rural – O sr. também esteve presente na COP15 e apresentou propostas. Quais as suas impressões?

– Acho que foi importante. A mídia retratou a convenção como um misto de decepção e de não avanços, mas penso diferente. Acho que Copenhague não poderia ter tido outro resultado senão esse. Eram mais de 150 países presentes, sem nenhuma negociação prévia e que foram lá para tentar um acordo sobre o clima. Conseguir um grande acordo nessa situação é muito difícil.

 

Dinheiro Rural – O que o agronegócio brasileiro pode tirar de toda essa discussão ambiental?

– Há alguns anos, vi um estudo realizado pela Basf em parceria com o Grupo André Maggi, que verificou o balanço de emissão de gás carbono na cadeia de produção da soja. Levantaram-se as emissões desde a retirada dos fertilizantes nas jazidas e seu transporte de navios, caminhões ou trens até a colheita e sua comercialização com os mercados. E o que se viu é que todo esse ciclo da soja sequestra mais gases do que emite. Agora, quando se separa isso e se coloca a quantidade de área que foi necessário desmatar para chegar a essa produção, aí a atividade se mostra emissora de gases.

Dinheiro Rural – Então há um problema nessa conta….

– O que quero dizer é que, pelo menos no caso desse segmento que foi estudado, nas áreas produtivas não há emissão de gás carbono. Então, se estamos reduzindo o desmatamento, e creio que chegaremos em 2020 com números extremamente baixos nesse sentido, eu diria que o agronegócio brasileiro, por analogia ao que acontece com a soja, não será um grande emissor desses gases. Acho que na atividade agrícola chegaremos a quase carbono zero ou neutro.

Dinheiro Rural – Como a meta voluntária do governo de reduzir as emissões de gases em até 38% até 2020 pode afetar a agropecuária?

– Acho que não tem nenhum problema. A redução que o governo está propondo é com base nos níveis de desmatamento de 1995, ou seja, o governo pega uma base mais antiga e leva até 2020. Se você olhar o que já houve de redução no desmatamento nesse período, o Brasil já cumpriu sua obrigação. Não haverá necessidade de mudanças no sistema produtivo.

Dinheiro Rural – Mas existe uma grande pressão em relação à pecuária, devido a estudos que a colocam como grande emissora de gases-estufa…

– O problema é que esse estudo leva em conta a área desmatada para criar aquela quantidade de gado. Nesse caso, concordo que qualquer atividade se mostra emissora de gases. Agora, esse desmatamento já foi feito. Não se pode considerar esse desmatamento na produção atual, porque ele ocorreu no passado. Se fôssemos começar com novas aberturas de áreas, essa conta seria válida.

Dinheiro Rural – Há quem defenda programas como o da moratória da soja para a pecuária. Qual sua opinião?

– Acho que é um programa válido. Mato Grosso foi um dos primeiros Estados a se mostrar entusiasta da moratória da soja e agora da pecuária. A primeira questão relacionada à moratória da pecuária aconteceu numa reunião entre o grupo Marfrig, do Marco Molina, e o Greenpeace, no meu gabinete. E o Estado apoia esse tipo de decisão, pois podemos continuar a aumentar nossa pecuária sem a necessidade de abrir novas áreas.

Dinheiro Rural – A pecuária brasileira terá que se adequar em relação às exigências ambientais?

– Realmente, o que precisamos é remodelar essa atividade. Fazer com que seja mais produtiva, intensificar o uso de tecnologias que permitam criar um maior número de animais em áreas menores, inclusive abrindo espaço para a agricultura e para a produção de grãos. Num primeiro momento ela parece uma medida muito arbitrária, mas é muito pedagógica. As pessoas acabam entendendo e buscando soluções para se adequar ao novo momento pelo qual o mundo está passando.

 

Dinheiro Rural – O sr. defende a criação de um programa de Redução das Emissões do Desmatamento e Degradação da Floresta (RED). Do que se trata essa proposta?

– Trata-se de um programa que, primeiramente, não é defendido apenas pelo Estado de Mato Grosso, mas sim por vários governos. É uma alternativa de redução de desmatamento e emissão de gases. A visão do programa é a seguinte: se você tem terras disponíveis para atividades tradicionais na agricultura e na pecuária, por que você não pode transformar essas áreas em uma atividade econômica e moderna, que seria a retirada de gás carbônico da atmosfera? O conceito do programa é dar valor à floresta. Esse valor vem do estoque de carbono que cada floresta possui, em menor ou maior quantidade, dependendo da sua tipologia florestal.

Dinheiro Rural – Então é um modelo de negociação de crédito de carbono….

– É um mecanismo que tende a converter a atividade agrícola e pecuária tradicional em uma atividade de proteção ao meio ambiente. Pois, ao mesmo tempo que você preserva a floresta, gera recursos para as comunidades que vivem nessa floresta e as estimula a não desmatar mais. Por exemplo: aqui na região amazônica, onde o MT está situado, você só pode dispor de 20% da sua propriedade. Existe uma legislação que já determina que 80% você não pode utilizar. O incentivo de REDD seria sobre esses 20% restantes, pagos ao dono da terra, seja índio ou quem quer que seja.

Dinheiro Rural – E quem pagaria essa conta?

– Há vários setores, como, por exemplo, a indústria de energia dos EUA, que tem um peso muito grande na poluição. Assim como a do carvão e a do gás natural, são setores grandes emissores de gases que causam o efeito estufa. Para que essas indústrias fiquem adequadas aos novos protocolos, principalmente o da Califórnia, será necessário que elas substituam seu parque industrial, adotando maquinário mais moderno e dentro dos novos padrões. Isso será possível no longo prazo, até pela deterioração natural das máquinas atuais, mas de imediato é algo inviável. Esses setores poderiam bancar a manutenção das florestas por meio do REDD e com isso compensar suas emissões e postergar a troca dessas máquinas.

Dinheiro Rural – Como esses setores observam essa proposta?

– Em Copenhague tive a oportunidade de conversar com alguns representantes de associações de produtores de energia dos EUA e de empresas, e há sim o interesse. Hoje é mais barato para essas indústrias bancar a floresta do que trocar seu parque industrial. Essa é a conta. A indústria elétrica americana tem algo em torno de US$ 2 bilhões a US$ 3 bilhões por ano somente para desonerar sua emissão de gás. Dinheiro tem. A questão é criar o mecanismo.

Dinheiro Rural – No início do seu mandato, o sr. era um dos alvos favoritos de ONGs ambientalistas. O que mudou?

– Quando assumi o governo, em 2002, o Estado vinha num ritmo acelerado de ocupações de novas áreas. Mas se você olhar a curva do desmatamento de Mato Grosso vai verificar que de 2004 para cá os números se inverteram. Nos últimos cinco anos, tivemos uma redução de quase 90% no desmatamento do Estado. Desde que assumi o governo havia uma pressão grande, pois sou do setor produtivo, lido com produção de soja, com pecuária. Diziam que era “a raposa tomando conta do galinheiro”. Mas basta ver os números para notar que houve evoluções.

 

Dinheiro Rural – Então houve uma aproximação com as ONGs…

– Sim. Porque as pessoas criticavam, mas não olhavam os resultados. Até que chamei as ONGs para conversar e mostrar que o Estado estava fazendo um esforço tremendo em conciliação com os setores produtivos, buscando alternativas para reduzir o desmatamento e as emissões, e eles não viam isso.

Dinheiro Rural – E na prática…

– Foi o momento em que houve essa aproximação. De Estado que só desmatava, que não cumpria a legislação ambiental, passamos a ser vistos de outra forma. Nenhuma federação brasileira possui as regras ambientais que Mato Grosso possui e ninguém produz tão sustentavelmente como em Mato Grosso.