A   produção comercial de etanol de milho no Brasil é muito recente. A usina Usimat, no município de Campos de Júlio, em Mato Grosso, a pioneira no processamento do cereal para bioenergia, fez a primeira safra de etanol em 2011. Mas não parou mais de produzir. A usina, originalmente para a cana-de-açúcar, trabalhava de forma deficitária. O milho, como alternativa de matéria-prima na entressafra, fez a empresa ganhar escala de produção. A receita, com algumas variações, poderia servir de modelo para as outras nove usinas de cana-de-açúcar em atividade no Mato Grosso? Responder a essa questão faz parte de uma série de debates que vêm ocorrendo no Estado, desde o fim do ano passado. Glauber Silveira, presidente da Câmara Setorial da Soja, órgão ligado ao Ministério da Agricultura, e a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) estão apresentando aos produtores um estudo de viabilidade econômica sobre a produção de etanol de milho. Encontros já foram realizados em vários municípios, entre eles Cuiabá, Rondonópolis e Sorriso. “O etanol de milho pode ser uma nova fronteira para o Estado”, diz Silveira. O governador, Pedro Taques, que também já recebeu o estudo, afirma que está interessado nessa possibilidade. “A produção de etanol de milho deve ser levada em conta na nossa economia”, diz Taques. “O agronegócio é a mola de Mato Grosso e o milho é uma das commodities que mais avançará em produção e produtividade nos próximos anos.” 


Silveira,da câmara setorial: para ele, o biocombustível pode se tornar a nova fronteira de Mato Grosso

De acordo com uma análise de cenário realizada pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), em parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a previsão para a safra 2024/2025 é de que o Estado produza 38 milhões de toneladas de milho, ante 21,2 milhões da safra 2014/2015, um crescimento de 79%. Com mais cereal no mercado, o preço, que regularmente já é mais baixo em Mato Grosso que em outras áreas produtoras do País, tende a permanecer pressionado. Para Silveira, o cereal dificilmente será altamente competitivo como a soja. “O milho produzido no Centro-Oeste, especialmente na porção norte de Mato Grosso, é um dos mais baratos do mundo”, afirma. Na safra passada, o cereal chegou a ser vendido abaixo do mínimo estabelecido pelo governo federal, em R$ 13,56 a saca de 60 quilos, ou R$ 226 por tonelada. A Usimat, por exemplo, chegou a pagar R$ 208 pela tonelada.


Vital, da usimat: o gerente industrial diz que depois de uma curva de aprendizado, a usina tem o processo de produção na mão

Por isso, o etanol entra como uma oportunidade de negócio ao agregar valor ao cereal. Para dar uma dimensão do potencial, Silveira mostra o que o milho, que hoje é exportado, cerca de dez milhões de toneladas, poderia render quatro bilhões de litros de etanol ao Mato Grosso, caso ele fosse processado como biocombustível. “E a receita seria pelo menos três vezes maior”, afirma Silveira. A conta é a seguinte: a R$ 270 por tonelada – considerada um boa cotação na safra 2014/2015 –, a exportação resultaria em uma receita de R$ 2,7 bilhões. Porém, a preços praticados nos últimos meses, quando processado como bioenergia, as dez toneladas renderiam R$ 6 bilhões com a venda do etanol, mais R$ 2,3 bilhões em energia elétrica nas usinas com caldeiras industriais de alta pressão e R$ 1,5 bilhão com a venda de DDG (sigla em inglês para grão de destilaria seco), um subproduto do milho altamente protéico e muito valorizado como ração animal. Para o diretor industrial da Usimat, Vital Nogueira, houve nos últimos anos uma curva de aprendizagem na produção do etanol de milho. “Começamos descarregando o cereal embaixo de uma tenda, tateando técnicas e resultados”, afirma Vital. “Hoje, temos o processo de produção na mão, resolvemos a ociosidade da entressafra da cana e trabalhamos com um custo de manutenção da unidade considerado baixo por nós, da ordem de R$ 700 mil por ano.”

Atualmente há dez usinas que processam cana-de-açúcar em Mato Grosso. A produção é de um bilhão de litros por safra, para um consumo médio de 500 milhões de litros. Porém, são consumidos 1,1 bilhão de litros de gasolina. “O etanol precisa ser atrativo para que a substituição ocorra no Estado, mas o que deve acontecer com o Mato Grosso é se tornar exportador de etanol na entressafra do Centro-Sul, principalmente da produção paulista”, afirma Silveira. “Para isso, precisamos de política pública.”  Ele se refere à definição da carga tributária e incentivos fiscais para a atividade, hoje inexistente. O estudo, com várias possibilidades de tributação, começando em 3% até 7%, mostra que a geração de impostos para dez milhões de toneladas de milho processado geraria ao caixa do governo R$ 420 milhões por ano.


Pioneira: a Usimat, de  Campos de Julho, está   produzindo  500 mil litros de etanol de milho, por safra

Hoje, além da Usimat, outras duas usinas de cana de açúcar estão produzindo etanol de milho: a Libra, no município de São José do Rio Claro, e a Porto Seguro, em Jaciara, todas integrando as produções de cana e milho. Na safra passada, as três usinas produziram 114 milhões de litros de etanol de milho. “O modelo para o Mato Grosso tem essa configuração de produção porque já há um parque industrial para o etanol de cana”, diz Silveira. “Mas também há espaço para as usinas com produção exclusivamente de milho.” Dois projetos estão em andamento. O mais adiantado é o da Fiagril, de Lucas do Rio Verde, originadora de grãos que já produz biodiesel. O projeto que prevê investimentos de R$ 240 milhões é para processar 500 mil toneladas de milho e produzir cerca de 200 milhões de litros de etanol por ano. O início das operações está marcado para 2017. O segundo projeto foi anunciado no final do ano passado pela Cevital, empresa de capital argelino que processa alimentos e atua em mineração. A intenção é construir uma usina no município de Vera, com investimento estimado em R$ 2,5 bilhões.