LUCRO RESPONSÁVEL: lanznaster, que preside duas cooperativas, tem um olho nos cooperados e outro no lucro das empresas

O velho método cooperativista, em que muitos pequenos formam um grande resultado, foi levado a sério na região oeste de Santa Catarina, no município de Chapecó. A cidade de apenas 20 mil habitantes virou uma espécie de coração do agronegócio naquele Estado. Com uma taxa de desemprego negativa, segundo dados da prefeitura municipal, três grandes empresas fincaram bases por lá: Aurora, Cooperalfa e Sadia, sendo as duas primeiras modelos do moderno cooperativismo.

A agricultura familiar praticada naqueles prados nada tem a ver com o romantismo pregado por algumas correntes políticas. Em Santa Catarina o que eles querem mesmo é fazer divisas. Para isso, vêm reinventando o cooperativismo, com um trabalho integrado entre produtores e mercado. O responsável por essa sinergia é o engenheiro agrônomo Mario Lanznaster, que preside as duas cooperativas.

R$ 800 milhões é o faturamento da Cooperalfa, uma das maiores cooperativas de Santa Catarina

Com um faturamento estimado de R$ 2,2 bilhões para 2007, ante R$ 1,9 bilhão em 2006 e um volume de investimentos de mais de R$ 150 milhões, a Aurora é fruto da combinação de 17 cooperativas. A direção da empresa é totalmente profissionalizada e a briga por mercado obedece a todas as regras do capitalismo. Da parte social, que visa distribuir o resultado das operações, a empresa tenta tirar vantagem. “Estamos muito próximos dos produtores, por isso conseguimos ajudá-los a alcançar um alto nível de qualidade”, comenta o presidente da Aurora, que, à frente da Cooperalfa, com R$ 800 milhões de faturamento, atende 80 municípios em todo o Estado com 15 mil associados. No total, entre as duas entidades, são mais de 30 mil pessoas envolvidas.

PROBLEMA: embargo à carne suína por parte da Rússia traz prejuízo aos produtores

Para manter toda essa estrutura funcionando, porém, é preciso muito investimento. A Aurora, que possui mais de 15 unidades, está investindo R$ 100 milhões na construção de uma indústria para produtos lácteos, com capacidade para secar em torno de 600 mil litros/dia de soro. Do total, 60% está concluído e o início das operações acontecerá ainda em 2008. A empresa investiu R$ 22 milhões em capacitação, segurança do trabalho, educação e desenvolvimento profissional. Neste ano, segundo o presidente, os valores devem ser ainda maiores. Ao todo, são 9.305 colaboradores, com um mix de 690 itens que vão de pizzas, frangos empanados e lácteos a cortes diversos de frango e suínos. Do total produzido, 70% fica no mercado interno, enquanto os outros 30% são exportados para diversos países do mundo. Do lucro total, 15% é dividido entre as 17 cooperativas que formam a Aurora. De acordo com Lanznaster, é aí que está o segredo da história. “A Aurora diz para as cooperativas o que o mercado quer e as cooperativas dão o suporte para que os produtores consigam a excelência desejada”, diz Sérgio Trentinaglia, gerente-geral da Fach II, uma das mais modernas unidades da Aurora, em Chapecó. Ele é o comandante da produção e garante que os investimentos são constantes. “Nossas máquinas têm vida útil média de sete anos, mas nesse período fazemos modificações e melhorias”, diz.

A cartilha ditada pela Aurora é seguida à risca e o método é colocado em prática. A Aurora recomenda as linhagens genéticas a serem utilizadas na suinocultura e fornece os pintos para criação na avicultura de corte. Cabe às cooperativas, como a Cooperalfa, auxiliar os produtores a desenvolver o trabalho da melhor forma possível e entregar os animais nas mais perfeitas condições sanitárias, peso e acabamento.Santa Catarina, no entanto, não vive apenas da suinocultura ou de aves. Há produtores de soja, milho e trigo. E, como as propriedades têm média de 12 hectares, economia de escala é algo muito raro por lá. Para melhorar a renda dos produtores, a saída é manufaturar e agregar valor. “Da soja fazemos farelo que muitas vezes é usado pelos próprios cooperados para suas criações”, diz Lanznaster. A linha de produtos vai além: óleo de soja bruto, não refinado, é vendido para outras empresas terminarem o produto. Do trigo são feitas três linhas de farinha, de alta, média e baixa qualidade, além de um grupo destinado para produção industrial. Todos esses produtos são vendidos na própria cooperativa em mercados que mantêm os itens básicos para subsistência de uma casa.“Tudo isso é revertido em ganho para o produtor, que vai receber mais do que a simples venda de uma commodity agrícola”, salienta o presidente.

Infelizmente, não são apenas boas as notícias no agronegócio de Santa Catarina. A suinocultura, graças ao embargo russo à carne brasileira, passa por problemas. A proibição dura dois anos e não se sabe quando acabará. “Temos que esperar esse problema acabar, mas, enquanto isso, nossa preocupação é cuidar do grau de endividamento desses produtores”, diz Lanznaster. Segundo ele, tanto o mercado interno quanto o externo passam por um momento confortável quanto ao consumo de carne de porco. Com um dos principais destinos parados, muitos produtores não conseguiram os resultados esperados e tiveram problemas para pagar as contas. “A Credialfa, uma entidade paralela à Cooperalfa, tem feito grande esforço para recuperar produtores inadimplentes”, revela. “Nessas horas, temos de pensar no resultado social e não no financeiro porque o produtor é a nossa prioridade”, afirma. Mesmo assim, o presidente revela que vem da suinocultura 23% do faturamento da cooperativa.

A entidade paga, quando possível, acima do mercado para elevar os preços. Quem entra para a cooperativa paga uma taxa de adesão, de aproximadamente R$ 200. Para cada venda realizada para a cooperativa, 1% é retido num fundo, chamado de “cota capital”. Ao completar 60 anos, o cooperado retira 40% do depósito e aos 68 anos os 60% restantes. “Este ano realizamos alguns pagamentos que superaram R$ 150 mil”, diz o presidente.

Num momento em que gestão eficiente é a palavra de ordem no mercado agropecuário, para Lanznaster a experiência entre Aurora e Cooperalfa mostra que é possível ser competitivo, fazer uma empresa faturar e, ainda por cima, gerar justiça social. Em analogia às companhias de capital aberto, para ele, os cooperados são os acionistas e, da mesma forma, querem lucro. “Essa é a idéia”, diz.

Dívida afeta suinocultores de Santa Catarina