O acordo da Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre subsídios à pesca, o primeiro a abordar o meio ambiente, entrou em vigor nesta segunda-feira, 15, após anos de negociações complexas e em meio a tensões comerciais internacionais intensas.

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“Este é um grande dia”, disse a diretora-geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, à AFP antes de uma cerimônia na sede da organização em Genebra, Suíça.

O pacto, aceito por mais de 100 membros da OMC, incluindo Estados Unidos, União Europeia (UE) e China, estabelece regras vinculativas que exigem que os governos considerem a legalidade e a sustentabilidade das atividades pesqueiras que subsidiam.

“Este passo histórico é como um sonho, esperamos muito tempo por este dia”, disse Okonjo-Iweala aos diplomatas.

Estes são os principais pontos do acordo, que proíbe os tipos mais prejudiciais de subsídios públicos para o setor pesqueiro:

Proibições

O pacto, finalizado em 2022 após mais de 20 anos de debate, foi finalmente implementado após ser aceito por dois terços dos membros da OMC.

“Todos os anos, os governos gastam cerca de 22 bilhões de dólares (R$ 118 bilhões, na cotação atual) em subsídios prejudiciais que contribuem para a sobrepesca e o esgotamento dos recursos marinhos”, denunciou Okonjo-Iweala.

O texto proíbe subsídios para a pesca “ilícita, não declarada e não regulamentada (INDNR)”, assim como aqueles destinados à captura de bancos de peixes superexplorados.

No entanto, um país pode continuar fornecendo esses subsídios se seu objetivo for “reconstituir a população a um nível biologicamente sustentável”.

O acordo também proíbe subsídios à pesca não regulamentada em alto-mar, como a pesca em áreas fora da jurisdição de países costeiros, oferecendo assim proteção em casos em que não haja medidas de gestão das populações.

Sua entrada em vigor “representa um avanço significativo para os oceanos e as comunidades costeiras que dependem deles”, comentou Megan Jungwiwattanaporn, da ONG The Pew Charitable Trusts.

Segundo um estudo frequentemente citado, os subsídios globais à pesca totalizaram 35,4 bilhões de dólares em 2018 (cerca de R$ 137 bilhões na cotação da época), dos quais 22 bilhões de dólares (R$ 85,2 bilhões na mesma cotação) contribuíram para aumentar a capacidade das frotas pesqueiras.

Obrigações e solução de controvérsias

O pacto insta os países a exercerem “especial cuidado e moderação” ao conceder subsídios a embarcações que não exibem sua bandeira ou ao lidar com populações de peixes cujo status é desconhecido.

Os países são obrigados a reportar informações sobre a implementação do acordo à OMC. Em particular, devem fornecer dados sobre a situação das reservas pesqueiras e sobre embarcações que se beneficiam de subsídios, além de compartilhar listas de navios e operadores envolvidos na pesca INDNR.

Em caso de desacordo, os Estados podem recorrer ao mecanismo de solução de controvérsias da OMC, embora seu órgão de apelação permaneça paralisado devido à recusa dos Estados Unidos em nomear juízes.

Países em desenvolvimento

O acordo leva em consideração as necessidades dos países em desenvolvimento e dos países menos desenvolvidos (PMDs), concedendo-lhes uma “cláusula de graça”: os subsídios que fornecem dentro de suas zonas econômicas exclusivas ficam isentos do cumprimento das proibições por dois anos.

E aqueles cuja participação anual no volume global de capturas de pescado não exceda 0,8% podem enviar suas notificações à OMC a cada quatro anos, em vez de a cada dois.

Eles também se beneficiam do apoio técnico da OMC. Um fundo voluntário foi criado para apoiá-los e recebeu 18 milhões de dólares (R$ 96,6 milhões na cotação atual) até o momento.

Acordo pode naufragar

Este acordo “não será suficiente para deter os bilhões em subsídios que alimentam a sobrepesca e o excesso de capacidade”, alertou Rashid Sumaila, especialista da ONG Oceana, nesta segunda-feira.

Se a segunda parte das normas, relativa à sobrecapacidade e à sobrepesca, não for finalizada dentro de quatro anos após a entrada em vigor do primeiro acordo, este último será “imediatamente revogado”, a menos que os membros da OMC decidam o contrário.