Ainda sem conseguir instalar a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas, a oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva deflagrou uma estratégia para antecipar as investigações. Dispostos a mirar na atuação do Poder Executivo no dia 8 de janeiro, integrantes dos partidos de oposição vão usar as comissões temáticas da Câmara para cobrar explicações da gestão petista.

O movimento oposicionista se concentra, principalmente, nas comissões de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) e de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, ambas dominadas por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Até mesmo a Frente Parlamentar Evangélica se tornou um braço das operações de apoio aos presos na Papuda e na Colmeia, no Distrito Federal.

Nesta terça-feira, 28, o ministro da Justiça, Flávio Dino, vai falar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados sobre que medidas foram tomadas pelo governo após as invasões de 8 de janeiro, mudanças na política de controle de armas e a visita que fez ao Complexo da Maré. Os deputados bolsonaristas Carlos Jordy (PL-RJ) e Caroline de Toni (PL-SC) queriam que o ministro fosse convocado, sob risco de cometer crime de responsabilidade caso não comparecesse, mas o requerimento foi transformado em convite.

A Comissão de Segurança Pública, controlada pela bancada da bala, também aprovou requerimentos para convidar Dino e os ministros do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Marco Edson Gonçalves Dias, dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, o diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alessandro Moretti, para falar sobre a ação dos extremistas que vandalizaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio da Planalto.

Os integrantes da oposição querem explorar a possibilidade de conhecimento prévio dos atos. As reuniões com os ministros estão marcadas para abril. A audiência com o ministro Dino será em reunião conjunta com a CFFC.

Além dos convites aos ministros, o colegiado também aprovou uma visita aos presídios da Papuda e Colmeia, para apurar a situação dos presos, ato também planejado pela bancada da Bíblia. Desde março, o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, deputado Eli Borges (PL-TO), organiza uma visita aos detidos. Há duas semanas, Eli solicitou ao ministro do STF Alexandre de Moraes uma visita da comitiva da bancada ao complexo da Papuda.

‘CPMI 8 de janeiro Já’

A CPMI é uma das principais pautas movida pelos congressistas bolsonaristas e é usada para mover a base de apoiadores nas redes, desmotivada após as prisões e ações coordenadas pelo ministro Alexandre de Moraes em deter os financiadores e grupos que coordenaram os atos. Alguns parlamentares adesivaram “CPMI 8 de janeiro Já” na porta de seus gabinetes, como é o caso do senador Magno Malta (PL-ES). O número total de acusados pelos atos é de 1.187 pessoas até este momento.

Na semana passada, Nikolas Ferreira (PL-MG) e Filipe Barros (PL-PR) conversaram com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e acertaram que a leitura da instalação da CPMI será feita na sessão conjunta, prevista para entre os dias 11 e 14 de abril.

Pacheco afirmou que mantido o número mínimo de 181 assinaturas de deputados e de 27 senadores, haverá a instalação da comissão em abril. Na última atualização desta quarta-feira, 22, 193 deputados e 37 senadores preenchem o requerimento de André Fernandes (PL-CE).

As comissões sob controle de bolsonaristas pretendiam convocar os ministros, tornando a aparição deles obrigatória, mas após um acordo entre os líderes do governo e da oposição, ficou acertado que os chefes das pastas seriam convidados. Ainda assim, a pressão sobre eles não se arrefece. Dino recebeu uma comissão de 27 deputados federais nesta semana para conversar sobre a situação do cadastro de armas dos colecionadores, atiradores e caçadores (CACs), o que foi bem visto aos membros da comissão, que ainda aguardará os próximos passos.

“Ele (Dino) sinalizou bem, ele foi receptivo. A gente fica no aguardo do dia 28. Mas se nada for feito, a gente volta a fazer a convocação”, disse Alberto Fraga (PL-DF), novo presidente da bancada da bala.

O ministro é o principal alvo da Comissão de Segurança Pública, que protocolou 16 diferentes pedidos de requerimentos de convocação desde a instalação dos colegiados na semana passada. O movimento é uma reação da oposição à postura do governo em relação à restrição às armas no Brasil e ao requerimento feito pelo ministro ao STF para incluir sete congressistas, deputados e senados, no inquérito das fake news – a maioria deles membros da Comissão de Segurança Pública.

Dino diz que viu “multiplicação organizada e sistemática de um grupo visando propagar, pelo menos, duas fake news”: a de que Dino se reuniu com traficantes ou chefes de organizações criminosas; e a de que ele estava sem escolta policial, o que seria “absolutamente mentiroso”, segundo ele. A ida do ministro ao complexo da Maré, no Rio de Janeiro, é um dos argumentos da base bolsonarista para chamar o ministro.

A comissão ainda convidou a ministro do Turismo, Daniela do Waguinho (União-RJ), para falar sobre seu suposto envolvimento com milícias no Rio de Janeiro. Em questão de ordem apresentada na quarta-feira, 22, o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), argumenta que não compete à comissão de segurança o requerimento, seja de convocação e convite, pois “o campo temático dessa Comissão em nada tem a ver com as atribuições da ministra”, e pediu que o presidente do colegiado, deputado Sanderson (PL-RS), não acolhesse o pedido.