01/01/2010 - 0:00
Convenção do clima da ONU acaba sem acordo, mas a
repercussão no Brasil mostra que o assunto pode
impactar violentamente no agronegócio brasileiro
Queimadas: estudo do Inpe mostrou que emissões são ainda maiores
A COP-15, Convenção do Clima da Organização das Nações Unidas, que aconteceu no mês passado, em Copenhague, na Dinamarca, acabou sem resultados práticos. De concreto mesmo, só o evidente empenho dos países ricos em transferir para o mundo em desenvolvimento a responsabilidade de cortar as emissões de gases causadores do aquecimento global. A cada plenária, negociantes trocavam acusações num círculo vicioso que, desde cedo, mostrava o possível fracasso. O presidente dos EUA, Barack Obama, atacou a China, que, por sua vez, atacou a Inglaterra, que revidou a ofensiva. Contudo, o símbolo dessa rodada foi o ministro do Meio Ambiente indiano, Jairam Ramesh, que declarou sua satisfação com o desfecho negativo. “Nosso interesse nacional não só foi protegido, mas fortalecido”, disse. A Índia é o terceiro maior poluidor do mundo, atrás dos EUA e China. Logo atrás, no quinto posto como chaminé do mundo, está o Brasil. Sua representante na cúpula do clima, a ministrachefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, cometeu um ato falho:
Vilões: a pecuária é apontada como agente do desmatamento
“O meio ambiente é uma ameaça ao desenvolvimento sustentável”, disse, em meio a olhos espantados. O escorregão brasileiro foi redimido com a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, além de se comprometer em contribuir para o fundo global de mitigação das mudanças climáticas, anunciou a meta de governo de redução voluntária de 36,1% a 38,9% das emissões brasileiras de CO2 até 2020. E é justamente esse o grande risco para o campo brasileiro.
Fracasso: COP-15 acabou sem resultados concretos
O curioso foi que, durante o evento, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou um estudo no Brasil que, ao contrário dos anteriores apontando o desmate e as queimadas como as principais causas da poluição, coloca a pecuária como a grande vilã, respondendo por 50% das emissões brasileiras de gases-estufa. Segundo Cesário Ramalho, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), que esteve em Copenhague, tal estudo não repercutiu na Cop-15. “As discussões na Dinamarca se concentraram nas metas de cada país. Esta polêmica sobre o gado foi no Brasil, mas já falamos com uma universidade e vamos mostrar cientificamente que tal estudo não é verdadeiro”, diz. O argumento dos pesquisadores do Inpe é que, além do metano e do óxido nitroso emitido pelos bovinos, a pecuária totaliza 50% do total das emissões pelo fato de ser a causa do desmate de 75% da mata amazônica e de 56% do cerrado. Tais dados colocam a pecuária nacional numa situação complexa. “Já estamos sem o mercado da União Europeia e agora temos este outro problema a resolver”, diz Ramalho.
Divergência: Lula e Obama ficaram em posições contrárias na Convenção do Clima
A convenção também atingiu o mercado de crédito de carbono, que comercializa unidades referentes à redução da emissão de gasesestufa. Com o fracasso da Cop-15, o preço destes contratos na União Europeia caiu 8,7%. Mas nem tudo são más notícias. Para muitos especialistas, as discussões podem ajudar o Senado americano a aprovar a lei do Cap and Trade. Tal lei impõe um limite máximo para emissões e comercialização dos direitos de emissões. Se aprovada, a legislação pode trazer dividendos para o Brasil, conforme explica Rodrigo Lima, gerentegeral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). “Caso a lei efetivamente considere a possibilidade de créditos agrícolas e florestais em outros países, será uma grande oportunidade para o Brasil”, diz.
Outro aspecto positivo da COP-15 foi o acordo costurado entre Brasil, França e EUA e apoiado por África do Sul, Índia e China. O texto pede a limitação do aumento da temperatura em 2ºC e prevê US$ 30 bilhões para o fundo global até 2012 e depois US$ 100 bilhões por ano, mas não deixa claro de onde virá o dinheiro. O desfecho do evento foi reflexo da falta de consenso. Um dos motivos é que as grandes potências mundiais queriam criar um adendo ao Protocolo de Kyoto, impondo aos países emergentes o estabelecimento de metas obrigatórias de emissão de gases do efeito estufa, o que não consta no texto original. Obama também teve uma participação polêmica. O presidente propôs um fundo verde bilionário para ajudar as nações pobres, mas vinculou o recurso a uma “transparência” dos países envolvidos, o que não agradou ao presidente Lula.
“A experiência que temos com o Fundo Monetário Internacional e com o Banco Mundial sobre os nossos países não é recomendável que continue a acontecer no século 21”, disse. Sem o acordo, os chefes de Estado adiaram a decisão para a COP-16, que deve acontecer este ano no México.