O s desafios para o avanço do consumo da carne de cordeiro não são uma discussão nova no País, embora permaneça atual. O motivo? Há um mercado consumidor latente, que está fora das regiões tradicionais de consumo, como ocorre no Sul do Brasil, ou nas grandes cidades. A demanda por essa carne cresce 20% ao ano, mas, para que o País tenha uma cadeia forte, definitivamente, deve-se visar resultados de ganha-ganha que incentivem os envolvidos a investirem seu tempo e recursos para o avanço desse segmento. Nesse contexto, sete desafios são grandes oportunidades.

O primeiro deles é acabar com a desinformação. Ela é nítida nesse mercado. Não há estudos recentes e os que existem divergem em números e dados. É possível ler em um artigo que a maior parte do consumo no Brasil provém de importações e, em um segundo artigo, outro autor sustentar que a importação não chega a 7%. O segundo desafio se refere ao rebanho de cerca de 18 milhões de ovinos, de acordo com o IBGE. É preciso organizar essa cadeia no campo, otimizando a produção, reduzindo custos e ganhando qualidade de produto. A atividade vai evoluir com uma maior união e comunicação entre todos os níveis da cadeia.

Já o terceiro desafio se refere ao alinhamento entre a oferta e a demanda de ovinos, que hoje não existe. O mercado não é abastecido com regularidade porque falta organização dos produtores. É preciso fazer com que ele coloque foco na entressafra, entre os meses de abril e outubro. Isso gera uma alta variação de preço que prejudica toda a cadeia, porque o frigorífico não consegue absorver a oferta na safra e o distribuidor não consegue repassar o valor, gerando uma ruptura para o cliente final. A irregularidade leva o cordeiro a ser visto como um produto sazonal. E sem padrão de qualidade, que é o resultado do sistema de manejo dos animais, do sexo, da raça, da idade, da terminação de carcaça e do peso. O produtor precisa investir nesses pontos e reavaliar a sua relação com os importados. Parte dessa carne é de animais velhos, com coloração escura e sabor mais intenso e amargo. Isso leva ao estigma de que a carne de cordeiro é forte e dura.

Em frente: a ovinocultura pode se tornar uma forte cadeia do agronegócio, mas precisa de organização (Crédito:Matheus Meireles)

Esse mito se reflete na ausência de uma cultura de consumo no Brasil, que é o quarto desafio da cadeia. Atualmente, os consumidores ou apreciadores eventuais de cordeiro conhecem alguns cortes. Em geral, sequer sabem da existência de outras partes, além do carré, da paleta e do pernil. Ou nem sabem diferenciar o cordeiro do cabrito, uma outra espécie animal. Um dos argumentos do baixo consumo, de 700 gramas por habitante ao ano, é o de que ela é mais cara que as demais carnes. Porém, com o crescimento da carne premium, hoje é possível encontrar cortes mais acessíveis do que a carne bovina.

Mas é no quinto desafio que há um nó górdio, uma dificuldade que parece sem solução: a indústria frigorífica. Há falta de unidades especializadas e os frigoríficos já instalados optam por bovinos, suínos e aves, setores onde há volume. Um frigorífico de cordeiro precisa abater uma grande quantidade por dia, para arcar com os custos fixos. Isso porque o rendimento líquido do animal é baixo. Digamos que um ovino vivo tenha 40 quilos: com rendimentos de 40% de carcaça e 78% de líquido, o resultado é de cerca de 12,5 quilos de carne. Se essa empresa precisa de 24 toneladas de carne para diluir custos, são necessários 1.920 animais por mês. Hoje, não se compra esse volume de cordeiros no País, com qualidade.

E aí aparece o sexto desafio: como lidar com o abate clandestino, um dos maiores vilões no mercado da carne. Ele ocorre por vários motivos, como a falta de fiscalização, a cultura de abate na propriedade e o alto custo dos frigoríficos certificados. Assim, fica difícil produzir de maneira legal, para competir com um produto que virá com um custo muito menor. E por último, mas não menos importante, o sétimo desafio está nas políticas públicas, ainda muito tímidas para a ovinocultura. Apoios existem, porém são insuficientes para dar amplitude nacional à causa. Ficam nas discussões rasas a necessidade de assistência técnica, de crédito para financiamento e incentivo à atividade. O fato é que a ovinocultura pode gerar renda aos pequenos produtores, aos frigoríficos, e também aos distribuidores e comerciantes. É preciso enxergar que o Brasil não pode mais repetir o mesmo discurso que mantém há 20 anos e uma mudança de mentalidade precisa ser feita. É a união da cadeia que vai gerar um novo destino a um dos mercados mais incríveis do mundo, o da ovinocultura moderna.