17/12/2015 - 13:41
A busca por fontes de proteína mais saudáveis vem estimulando o consumo brasileiro de pescado, que mais que dobrou nos últimos dez anos. Em 2014 cada brasileiro devorou 14,5 quilos de pescado, um avanço de 100% em relação a 2005 e de 25% ante 2013. A pesca tradicional há tempos não é suficiente para suprir toda essa demanda. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2014 a produção de pescado cresceu 17,8% ante 2013 e superou meio milhão de toneladas. Ainda é pouco ante o consumo de 2,5 milhões de toneladas por ano, mas sua participação vem crescendo.
O avanço da produção, entretanto, vem abrindo espaço para fornecedores de tecnologia. A meta é pescar ineficiências, para elevar a produtividade do setor. “Estudamos os gargalos e tornamos os resultados mais previsíveis”, diz o zootecnista Adriano Romano, diretor da empresa de tecnologia AgroInova. A companhia começou em 2012 como uma start-up incubada no campus da Universidade de São Paulo (USP) em Pirassununga, no interior do Estado. Romano e seu sócio, o colega Dalton Sales, perceberam um nicho na produção de peixes, crustáceos e rãs. “As técnicas de produção ainda são pouco sofisticadas”, diz Sales. “Muitas decisões são tomadas com base em um caderno de anotações, o que causa desperdícios.”
Um exemplo mostra como pequenas alterações podem fazer a produtividade aumentar significativamente. O peixe mais produzido no Brasil é a tilápia. Em 2014, a oferta foi de quase 200 mil toneladas, 36% do total. “Em geral, o manejo é realizado de maneira uniforme”, diz Sales. “O tratador coloca sempre a mesma quantidade de ração em cada tanque.” Isso pode provocar desperdícios. “Se a temperatura da água subir, os peixes ficam menos ativos e tendem a comer menos, por isso faz sentido calcular a quantidade de ração em função das condições climáticas.”
Tanques de criação de tilápias: trocando o caderno pelo tablet
Imbatível na teoria, esse conceito esbarra em uma dificuldade prática. Para gerenciar a massa de dados necessária para calcular as melhores quantidade de ração – que responde por 60% do custo do pescado –, é preciso lidar com ferramentas estatísticas e planilhas de cálculo, pouco amigáveis para o tratador em seu barco. A solução proposta pela AgroInova foi aproveitar os recursos da tecnologia sem fio e da computação em nuvem para gerenciar essas informações de maneira visual, usando tablets. “Com isso, fica mais fácil administrar cada tanque”, diz Romano. “Uma redução dos desperdícios que diminua o consumo de ração em um ou dois pontos percentuais terá um impacto direto nas margens de lucro.” Segundo o empresário, as mesmas ferramentas podem servir para gerenciar outras criações, como gado de corte e aves.
Quem testou foi fisgado. “Quando passamos a usar o sistema, conseguimos reduzir em 30% as despesas com ração”, diz Carol Grosso, responsável pelo gerenciamento da BFP Piscicultura, de Ilha Solteira, no interior paulista, que produz 400 toneladas de tilápias por ano em seus 129 tanques. Familiarizada com números, pois é graduada em matemática, Carol estava acostumada a colocar tudo nas planilhas, mas diz que o sistema facilita o controle. “Agora podemos prever com segurança quanto tempo o estoque de ração vai durar e não somos mais surpreendidos pela falta do insumo”, diz ela, que usa o sistema desde agosto de 2014.
A ideia atraiu investidores. Em setembro, a AgroInova recebeu um aporte de valor não divulgado da TechTrends, empresa de investimentos em tecnologia que fez seu primeiro aporte no agronegócio de olho no potencial de ganho de produtividade. “A AgroInova conseguiu 150 clientes em poucos meses e nós queremos acelerar esse ritmo”, diz José Eugênio Braga, sócio diretor da TechTrends. “Há um enorme mercado não apenas na aquicultura, mas também na pecuária”, diz ele.
Essa importância deverá ser turbinada pelo crescimento das exportações. Um estudo do banco holandês Rabobank, especializado no agronegócio, avalia que o Brasil possui condições ideais para atender o crescimento da demanda mundial por pescado prevista para os próximos anos. No estudo “Aquicultura Brasileira, uma grande indústria em gestação”, Guilherme Melo e Gorjan Nokolik, analistas do banco, avaliam que a participação brasileira no mercado mundial de pescados pode até mesmo deslocar a produção chinesa, que foi de 43,5 milhões de toneladas em 2013 e hoje fornece a quase totalidade do pescado congelado e um terço dos peixes frescos consumidos nos Estados Unidos. “O Brasil possui todos os ingredientes para se tornar a próxima superpotência em pescados, rivalizando com produtores como Tailândia, Noruega e China”, diz Melo.