15/11/2020 - 7:03
Em 1982, o PT ainda se sustentava no tripé sindicatos/ex-resistentes da ditadura/Igreja Católica sobre o qual havia sido fundado dois anos antes. O partido que prometia lutar pelo povo não tinha base eleitoral na periferia das grandes cidades. Foi nessa época que o padre José Pegoraro, italiano representante do clero progressista da Teologia da Libertação, disse em uma reunião da comunidade eclesial de base (CEB) na Paróquia São Paulo Apóstolo e Nossa Senhora Aparecida, no Jardim das Imbuías, bairro afastado da zona sul de São Paulo, que o sindicalista chamado Lula estava construindo no ABC um partido de trabalhadores para disputar eleições.
Um dos jovens presentes no salão paroquial era o ex-seminarista Leonide Tatto, filho mais velho de uma família de dez irmãos vinda de Corbélia, norte do Paraná. Incentivados por Leonide, os irmãos Tatto eram frequentadores assíduos do salão paroquial, onde funcionava a CEB, entre eles o segundo mais novo, Jilmar. Com aval do padre Pegoraro, os irmãos Tatto começaram a arregimentar pessoas da vizinhança para fundar o primeiro (e até hoje o maior) diretório do PT na periferia de São Paulo.
Assim nasceu o que hoje é chamada de “Tattolândia”, uma vasta região da zona sul onde a família Tatto exerce forte influência política ao ponto de ter quatro parlamentares – dois vereadores, um deputado estadual e um deputado federal -, e fonte do poder que levou Jilmar a ser escolhido candidato do PT à Prefeitura.
Durante mais de duas décadas a influência dos Tatto na região era motivo de comemoração entre os cardeais petistas, por ter ajudado a abrir caminho para o que depois viria a ser chamado de “cinturão vermelho”, conjunto de bairros nas periferias da cidade que despejavam, eleição após eleição, caminhões de votos nos candidatos do partido. Mesmo assim, os Tatto permaneciam à margem da cúpula nacional do PT. A situação começou a mudar em 2005, quando o partido instituiu o Processo de Eleições Diretas (PED) para escolher seus dirigentes.
A força da “Tattolândia” ficou clara e Jilmar, já então o mais destacado dos irmãos, passou a ameaçar o poder interno petista. Os métodos de filiação em massa e denúncias de irregularidades no transporte de eleitores fizeram com que integrantes do próprio PT passassem a chamar a região de “curral eleitoral”. O deputado estadual Enio Tatto refuta. “Sempre defendemos um partido de massas e foi isso que fizemos.”
A primeira disputa eleitoral de Jilmar foi em 1994, quando se tornou suplente de deputado estadual, cargo para o qual foi eleito duas vezes depois, duas vezes federal e líder da bancada do PT na Câmara, mas suas maiores realizações foram como secretário nas gestões Marta Suplicy e Fernando Haddad, quando ajudou implantar o Bilhete Único, almoço e jantar nas escolas municipais e os corredores de ônibus.
Pelo fato de ter conseguido viabilizar seu nome graças à influência na máquina partidária – obtida, em grande parte, graças aos votos da “Tattolândia” -, sua candidatura foi contestada internamente antes mesmo de existir. Em junho do ano passado, a direção nacional do partido cogitou não lançar candidato caso Fernando Haddad mantivesse a decisão de não disputar a eleição. O partido pressionou Haddad, mas não conseguiu demover o ex-prefeito. Só então Tatto se colocou. Pouco antes do início da campanha, petistas como o ex-ministro Celso Amorim e intelectuais ligados ao PT declararam apoio a Guilherme Boulos (PSOL).
Na segunda-feira, a presidente do partido, Gleisi Hoffman, veio a São Paulo e voltou a sugerir apoio a Boulos. Tatto resistiu. Agora, sua missão é impedir que o PT, partido que governou São Paulo três vezes e liderou a esquerda nas últimas quatro décadas, se torne um nanico na maior cidade do País – na pesquisa Ibope/Estadão/TV Globo de ontem ele aparecia com 6%. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.